Atos do dia 7 testam grau de politização das forças de segurança
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sábado, 04 de setembro de 2021
José Marcos Lopes/Especial para a Folha
Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vão às ruas na próxima terça-feira, no feriado de 7 de Setembro, com uma pauta difusa. Depois de ameaçarem o STF (Supremo Tribunal Federal) e da reação do ministro Ricardo Lewandowski, que lembrou em um artigo publicado no último dia 29 que uma tentativa de intervenção armada é um crime inafiançável e imprescritível, os bolsonaristas passaram a dizer que a manifestação da próxima terça-feira será por liberdade de expressão.
Segundo os apoiadores do presidente, a orientação nacional era para que os atos fossem realizados somente em Brasília e São Paulo, mas muitas dessas manifestações não têm uma organização formal e são agendadas por aplicativos de mensagens. No Paraná, há atos confirmados em Londrina, Curitiba, Maringá, Santo Antônio da Platina (Norte Pioneiro), Pato Branco (Sudoeste) e Araucária (Região Metropolitana de Curitiba). Pelo segundo ano consecutivo o desfile militar do feriado de Independência não será realizado por causa da pandemia de Covid-19.
Desde 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, seus apoiadores têm aproveitado os feriados cívicos, como 7 de Setembro e 15 de Novembro, para demonstrar apoio ao presidente e replicar suas falas e pautas. Neste ano, com a crescente tensão entre o Executivo e o Judiciário, o presidente passou a focar o STF. Nesta sexta-feira (3), disse que a manifestação será um "ultimato" à Corte.
Depois da prisão do ex-deputado Roberto Jefferson por ameaças ao STF e da repercussão negativa da fala do cantor Sérgio Reis (ele disse que o tribunal seria invadido e os ministros retirados à força), os bolsonaristas mudaram o discurso, mas sem deixar de mirar no Judiciário. Para eles, o STF "está querendo governar" ao decretar a prisão de aliados de Bolsonaro, como Jefferson e o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), que também é investigado por ameaças a ministros.
"O principal tema das manifestações é a luta pela liberdade. A gente entende que o STF tem tomado o papel da Presidência", disse a vereadora Jessicão (PP), uma das organizadoras do ato em Londrina. "Vamos pedir que o Judiciário se atente somente a suas pautas e deixe o Brasil em liberdade". A vereadora disse que "a destituição dos 11 ministros do STF" está na pauta, mas não informou qual dispositivo legal seria usado para afastar os magistrados — que atualmente são dez, pois a vaga de Marco Aurélio Mello, aposentado, ainda não foi preenchida.
Em Londrina, segundo Jessicão, haverá atos na Avenida Juscelino Kubitschek com a Higienópolis, a partir das 15h, e em frente ao Parque Ney Braga, com a participação de caminhoneiros, a partir das 8h. "A expectativa é muito alta para a Avenida Paulista. Muitas pessoas não conseguiram viajar e na última hora o pessoal decidiu fortalecer o movimento na própria cidade".
POLICIAIS E MILITARES
Nas últimas semanas foi informado que policiais militares e militares da ativa participariam da manifestação, o que é proibido por lei. No dia 23 de agosto, 24 governadores se reuniram e firmaram um compromisso de que as PMs não agirão contra a Constituição. Em seguida, os Ministérios Públicos de São Paulo e do Distrito Federal reafirmaram que policiais militares não podem participar de atos políticos. Segundo estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgado na quinta-feira (2), a presença de policiais e militares em grupos e fóruns bolsonaristas nas redes sociais aumentou 27% entre 2020 e 2021.
"À paisana é natural que participem, tanto eles quanto os mais variados segmentos da sociedade", disse o vereador de Curitiba Eder Borges (PSL), um dos organizadores na capital paranaense. "O ato será de apoio ao presidente, mas tem essa questão dessa insegurança jurídica que vivemos no Brasil, devido a certas decisões autoritárias de outras esferas do Poder", afirmou. Curitiba terá um ato no Centro Cívico a partir das 14h.
Borges disse que organizou a ida de três ônibus e uma van para São Paulo e de um ônibus para Brasília. Ele negou qualquer financiamento público. "Desde 2014 as manifestações da direita são autofinanciadas, é comum passar 'vaquinhas' por grupos de whatsapp. Às vezes aparece um empresário que não quer aparecer e dá porque acredita, mas via de regra é autofinanciado".
A reportagem da FOLHA entrou em contato com a assessoria de imprensa da Polícia Militar do Paraná e com a seção de Comunicação Social da 5ª Região Militar, mas não houve retorno até o fechamento desta matéria. Procuradas, a Apra (Associação de Praças do Estado do Paraná) e a Assofepar (Associação dos Oficiais Policiais e Bombeiros Militares do Estado do Paraná) também não deram retorno.
RADICALIZAÇÃO
Para a cientista política Karolina Mattos Roeder, doutora em Ciência Política pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), o ingrediente mais preocupante é a crescente politização das forças de segurança. "A polícia deve estar a serviço do Estado, não de uma pessoa", afirmou. "Bolsonaro vai testando, levando até o limite das instituições democráticas. Temos outras pautas que poderiam estar sendo governadas, como a questão energética e a Covid, no entanto parece que não temos presidente. Não faz sentido algum o que eles estão colocando, ‘sou a favor da liberdade e vou destituir o STF'".
Karolina Roeder avalia que o presidente atua dentro de uma lógica de radicalização, que mantém sua base, formada por um índice de 10% a 15% do eleitorado. "Ele está vindo nessa crescente de radicalização, ele funciona dentro dessa lógica. Não tem muito apreço pela democracia e tem tido cada vez menos", disse a cientista política. "Só que não é tão simples destituir uma democracia. Ela é complexa, tem várias instituições e muitos atores. E ele (Bolsonaro) claramente não tem apoio da população".
OUTRO LADO
A esquerda também estará nas ruas no dia 7. Organizada por centrais sindicais, sindicatos e movimentos sociais, a 27ª edição do Grito dos Excluídos terá o tema "Fora Bolsonaro" e deverá ser realizada em 170 cidades brasileiras. Segundo a CUT (Central Única dos Trabalhadores), no Paraná haverá atos em Londrina, Maringá, Umuarama (Noroeste), Curitiba, Campo Magro (região Metropolitana de Curitiba), Paranaguá (Litoral) e Matinhos (Litoral).