Appio diz que investigava destino de R$ 3 bi da Lava Jato quando foi afastado
Ao CNJ, juiz afirma que recursos foram depositados por empresas e delatores em contas bancárias em nome da 13ª Vara de Curitiba
PUBLICAÇÃO
quarta-feira, 14 de junho de 2023
Ao CNJ, juiz afirma que recursos foram depositados por empresas e delatores em contas bancárias em nome da 13ª Vara de Curitiba
Mônica Bergamo - Folhapress
São Paulo - O juiz Eduardo Appio, que foi afastado da 13ª Vara Federal de Curitiba, afirmou em depoimento sigiloso ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que estava investigando o destino de R$ 3,1 bilhões arrecadados em acordos de colaboração da Lava Jato quando foi retirado do cargo. Os recursos foram depositados por empresas e por delatores em contas bancárias em nome da 13ª Vara, comandada antes dele por Sergio Moro e pela juíza Gabriela Hardt.
Os pagamentos faziam parte dos acordos firmados pelas companhias e seus executivos ao confessarem crimes e apontarem outros culpados à Justiça. A maior parte do dinheiro arrecadado, R$ 2,2 bilhões, foi posteriormente transferida, de forma pulverizada, para dezenas de estatais e órgãos públicos, inclusive do Judiciário.
A aplicação dos bilhões, no entanto, seguiria envolta em mistério, segundo o juiz disse ao prestar depoimento. Appio afirmou ao CNJ que, depois de assumir a 13ª Vara, em fevereiro, tentou rastrear o destino final do montante bilionário, montando planilhas e requisitando informações dos órgãos que receberam os recursos para saber onde eles tinham sido aplicados. Mas encontrou dificuldade para obter respostas oficiais.
Além disso, de acordo com ele, depois da pulverização dos R$ 2,2 bilhões, um saldo de R$ 842 milhões restava no caixa da 13ª Vara Federal em setembro do ano passado, segundo documentos então disponíveis.
Cotejando os registros com extratos bancários, ele descobriu que em fevereiro o saldo já seria substancialmente menor, de cerca de R$ 200 milhões, disse o magistrado ao conselho de Justiça. Ele teria pedido então a técnicos da Vara que levantassem documentos com a Caixa Econômica Federal para descobrir para que órgãos a diferença de cerca de R$ 642 milhões tinha sido transferida, mas ainda não tinha conseguido informações precisas.
CRITÉRIOS
O juiz desconfiava que a distribuição da maior parte dos R$ 3,1 bilhões tinha sido feita sem critérios e sem obedecer a regras do próprio CNJ, que determinam que penas pecuniárias não podem ser destinadas para beneficiários de forma "arbitrária e aleatória".
O CNJ também veda a destinação de recursos ao custeio do Poder Judiciário, para a promoção pessoal de magistrados e para fins político-partidários.
Appio revelou ao CNJ que, de acordo com levantamentos feitos por servidores da 13ª Vara, órgãos do próprio Judiciário receberam montantes do dinheiro da Lava Jato. A 12ª Vara Federal de Curitiba, por exemplo, teria sido beneficiada com R$ 2 milhões. A juíza Carolina Lebbos, que é da Vara, foi a responsável pela execução da pena do ex-presidente Lula quando ele estava detido na Superintendência da Polícia Federal no Paraná.
afastamento
Appio foi afastado do cargo pela suspeita de ter telefonado para João Eduardo Malucelli, filho do juiz federal de 2ª instância do Paraná Marcelo Malucelli. De acordo com a acusação, ele usou um nome falso e tentou obter informações de João Eduardo. O juiz diz que o filho foi ameaçado.
João Eduardo Malucelli é namorado da filha mais velha de Moro, e sócio do senador e da mulher dele, a deputada federal Rosângela Moro (União Brasil-SP), no escritório Wolf & Moro Sociedade de Advogados.
Juíza Gabriela Hardt fica sem remoção e permanece na Vara da Lava Jato em Curitiba
CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - A juíza federal substituta Gabriela Hardt não conseguiu a remoção para uma Vara em Florianópolis (SC). Ela atua na 13ª Vara de Curitiba, onde estão abrigados os processos remanescentes da Operação Lava Jato, e tinha se inscrito em maio para um concurso de remoção, que é organizado pelo Conselho de Administração do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Hardt tem substituído o juiz titular da 13ª Vara de Curitiba, Eduardo Appio, desde 22 de maio, a partir do afastamento temporário dele, sob suspeita de ter praticado infrações disciplinares.
A negativa a Gabriela Hardt ocorreu, de acordo com o TRF-4, porque outros juízes tiveram prioridade, em função do critério de antiguidade.
Na Vara Federal responsável pela Lava Jato, a juíza é substituta, termo que se refere não à condição de suplente ou "reserva", mas ao estágio na carreira de magistrado. Os casos da operação estavam sob responsabilidade de Appio, que é juiz titular.
Hardt atua nos processos da operação em situações de férias ou ausência. Ela chegou a conduzir os casos da Lava Jato temporariamente entre 2018 e 2019, após Sergio Moro abandonar a magistratura, e se mostrou alinhada com as teses do hoje senador.
A juíza, por exemplo, expediu a sentença que condenou Lula à prisão na ação penal do sítio de Atibaia (SP), em medida que dois anos mais tarde foi anulada pelo STF (Supremo Tribunal Federal). (Catarina Scortecci/Folhapress)

