A vereadora Mara Boca Aberta (Podemos) escapou da cassação do seu mandato na CML (Câmara Municipal de Londrina) na última quarta-feira (29), quando foi absolvida da acusação de quebra de decoro parlamentar, mas ainda vai enfrentar resistência no seu partido caso queira concorrer novamente à Câmara.

Como já noticiou a FOLHA, Mara se filiou ao Podemos durante a janela partidária, mas a executiva estadual da sigla tenta sua desfiliação. O mal-estar começou quando o então presidente da comissão provisória, o vice-prefeito de Londrina, João Mendonça (Podemos), levou a vereadora e seu filho Guilherme Petriv para o partido. A estadual disse que deveria ter sido comunicada antes da filiação e, além de destituir a comissão, entrou com o pedido para expulsar os membros da família Boca Aberta.

O presidente estadual do Podemos, Gustavo Castro, que também está à frente da agremiação em Londrina, explicou em entrevista no começo de maio que o caso está sendo analisado pela Justiça Eleitoral.

À FOLHA, Mara diz acreditar que a vitória no julgamento da Câmara pouco muda sua situação no partido. “Eles não vão querer me dar a vaga [na chapa de vereadores, que será formada por 20 candidatos]”, diz. Ela afirma que ainda não foi chamada para conversar com o partido. “Mas, vou brigar na Justiça por essa vaga, pois fui filiada com a promessa da vaga.”

Ela revela que recebeu um convite para se filiar ao PV (Partido Verde), mas acabou optando pelo Podemos, com apoio de João Mendonça.

“Ele tinha autonomia [era o presidente em Londrina] e me garantiu a vaga. Firmamos um compromisso.” Mara ressalta que, “querendo ou não”, ela é a representante do Podemos na CML e está filiada. “Vou pedir uma reunião com a nova executiva para resolver a situação.”

PEDIDOS DE EXPULSÃO

Procurado nesta sexta-feira (31), Castro voltou a dizer que a situação partidária da parlamentar está nas mãos da Justiça Eleitoral.

“O partido encaminhou a desfiliação da vereadora e apresentou motivos que justificam a rejeição da filiação na legenda. A vereadora recorreu. Aguardamos a decisão da justiça eleitoral, e caso não seja aceita a desfiliação da vereadora, iniciaremos análise de quatro pedidos de expulsão da mesma protocolados por membros do partido em Londrina”, disse o presidente do Podemos.

Ele ressalta que, independente da decisão judicial, “que naturalmente respeitaremos e cumpriremos”, não vê “a menor possibilidade da permanência da vereadora no partido”.

“Partidos políticos devem ser formados por cidadãos que comungam, no mínimo, de visões e conceitos políticos similares, o que certamente não é o caso. O Podemos defende o exercício da política como fundamento para a defesa dos interesses coletivos da sociedade, e não como instrumento para busca de benefícios pessoais ou familiares”, acrescenta Castro, que diz que existem dois pedidos de expulsão do vice-prefeito João Mendonça.

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Cientista político vê dano à imagem de vereadora após CP

O julgamento da vereadora Mara Boca Aberta (Podemos), ocorrido praticamente quatro meses antes das eleições municipais, ainda deve reverberar em Londrina. A avaliação do advogado e cientista político Marcelos Fagundes Curti é de que, do ponto de vista político, não há dúvidas de que o processo causou dano à imagem da parlamentar.

A extensão dos danos causados, segundo Curti, vai depender da habilidade de Mara e de seu entorno em construir “uma narrativa segundo a qual a mesma teria sido injustamente prejudicada pelo ‘sistema’”.

“Se tiver êxito em emplacar essa narrativa, poderá sair fortalecida desse processo e manter o seu reduto eleitoral conquistado na eleição passada e, até mesmo, vir a angariar novos eleitores solidarizados com sua situação”, acrescenta o cientista político.

Por outro lado, Curti acredita que, se não houver habilidade para construção dessa narrativa, a vereadora pode sair prejudicada do processo, prevalecendo o outro lado da moeda: a repercussão negativa do histórico familiar de cassações - como a do seu marido Emerson Petriv, o Boca Aberta, em 2017, quando era vereador - e das representações já arquivadas contra Mara na CML. “Poderão vir à tona e influenciar diretamente o seu desempenho nas eleições deste ano.”

INFLUÊNCIA EM OUTUBRO

O professor e advogado especialista em Direito Eleitoral e Político, Nilso Paulo da Silva, aponta que o julgamento da Câmara é sempre muito rígido, porque não cabe recurso “quando observada a norma”.

“Portanto, para fazer o julgamento, principalmente de cassação, o Poder Legislativo precisa ter muita certeza do que está fazendo, embora ele tenha total autonomia, também, do convencimento”, cita. Para ele, um julgamento assim, a quatro meses do pleito, coloca em xeque não só a conduta analisada, mas também o comportamento dos parlamentares. Isso pode influenciar na hora do voto.

“O eleitor é o real dono do poder, ele tem autonomia, mas ele também é emotivo, é emocional. Então, muito próximo da eleição, vai ter, sim, reflexo nas próximas escolhas, por conta da divisão que foi o resultado”, diz Silva.

A primeira acusação, de divulgação da candidatura inexistente de Boca Aberta em 2022 ao Senado, foi rejeitada por dez votos a oito, com uma abstenção; a segunda, de má utilização de recursos do Fundo Eleitoral, terminou nove a nove, com uma abstenção; e a terceira, de favorecimento pessoal a um ex-assessor, foi rejeitada por todos os vereadores.