Imagem ilustrativa da imagem Análise: os caminhos para conquistar o eleitor em meio à pandemia
| Foto: Gustavo Carneiro/1-4-2020

O cafezinho no balcão do bar, o abraço no eleitor e uma criança no colo. Imagens tão comuns nas campanhas eleitorais podem não ser vistas este ano. As regras de comportamento social, por causa da necessidade de evitar a disseminação da Covid-19, não só podem provocar o adiamento das eleições como, com toda a certeza, irão impor outro ritmo para os candidatos aos postos de prefeito e vereador em todo o País. Ainda é cedo para se medir os impactos, mas a força da influência das redes sociais no resultado das urnas pode ser ainda maior. É nisso, pelo menos, que apostam os especialistas que estão acostumados a acompanhar o processo bem de perto.

Para o cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, a pandemia pode acelerar um processo de crise política e de representatividade já observado no Brasil. “Vivemos um período da sociedade conectada em rede, mas, ao mesmo tempo, passamos por um momento em que há a ausência de lideranças. Hoje, a política é formada menos pelo embate de ideias e mais pelo confronto de inimigos. Esta é a lógica das redes sociais que nos separa por algoritmos”, avalia em conversa com a FOLHA.

O contato físico, como o abraço ou o aperto de mão, é um elemento constitutivo do povo brasileiro. O conceito do “homem cordial”, descrito pelo historiador Sérgio Buarque de Holanda em seu livro “Raízes do Brasil”, de 1936, aponta exatamente tal ponto da formação do caráter nacional. O termo diz menos sobre um comportamento pacato e mais sobre a pessoalidade. “O que foi proposto como cordialidade não passa pela generosidade, mas sim pelo coração. É muito mais pelo afeto que do que pela razão. Nós, brasileiros, somos afetivos, táteis”, detalha Prando.

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| Foto: Gustavo Carneiro/1-4-2020

LOCAL

Outra característica fundamental do pleito deste ano é a força das lideranças locais. Além dos temas que são debatidos nacionalmente, é preciso entender uma razão que é fundamental em como a política é feita em cada cidade. A enorme diversidade sociocultural brasileira impõe diferentes comportamentos, mas, de forma geral, a análise é generalista. “No País, há pequenas ilhas nas quais a política tradicional é forte. Em muitos municípios, grupos exercem o poder tradicional patriarcal, gerontocrático e patrimonial – ou seja, por homens idosos e ricos. Esse político que sempre fez parte da nossa história ainda persiste”, garante.

Nos últimos anos, uma série de mudanças impostas aos candidatos mudou o modelo de como seduzir e conquistar o eleitorado. Os enormes showmícios já não existem mais. As ruas transformadas com galhardetes pendurados nos postes também não enfeiam e sujam mais o espaço urbano. O período das campanhas foi reduzido. As medidas foram uma tentativa de combater o excesso de gastos dos candidatos – muitas vezes associados a esquemas de corrupção. “Jair Bolsonaro (sem partido) era o candidato ‘sem’ e ‘anti’ tudo. Ele se articulou na internet, enquanto os outros discutiam tempo na TV. Como pré-candidato, era chamado de mito, mas acabamos elegendo um meme”, pondera Prando.

ESTATÍSTICA

No entanto, se for necessária realmente a distância dos candidatos dos eleitores nas ruas, o próprio programa eleitoral gratuito pode voltar a desempenhar uma importância maior novamente. É o que acredita Edmilson Leite, diretor estatístico do Instituto de Pesquisas Multicultural, que acompanha as intenções de voto em Londrina e nos municípios da região. “As campanhas municipais sempre foram vencidas na sola de sapato, ganhando as ruas. Agora, no momento, isso estando proibido, as mídias sociais e a televisão vão ser a maneira de chegar ao eleitor. Ainda será preciso pensar novas técnicas e criar um planejamento estratégico bem elaborado”, afirma Leite.

A precisão sobre como pensa o eleitorado também está cada dia mais sensível, até pela forma e o volume de informações disponíveis para os eleitores. O fenômeno do bombardeio dos bytes nos celulares e perfis nas redes de computadores desta vez ganhará um elemento extra: o comportamento dos candidatos diante das ações de combate ao coronavírus. “Acompanho as eleições desde 1991, e a tendência de mudança de opinião era mais lenta. Agora, se impõe que o acompanhamento seja diário. As pesquisas realmente influenciam no voto, por isso, os institutos precisam fazer isso com seriedade. Não à toa temos leis para regular o trabalho”, afirma o diretor estatístico.

Trabalho tático será essencial

Se comumente as campanhas políticas dependiam de estrategistas para elaborar o caminho certeiro para o mandato, com o distanciamento físico será ainda preciso se aprofundar no conhecimento de cada uma das mídias. É o que aponta o jornalista e estrategista político Cláudio Osti. “No caso dos candidatos a vereador, sempre o que valeu foi o olho no olho. Mesmo que daqui a dois meses a situação esteja mais amena, vai ser difícil o candidato reunir pessoas em ambientes. Por isso, cada um deve estudar bastante rede social, entender para o que serve cada uma”, detalha.

O que não muda mesmo diante da pandemia é a capacidade dos candidatos que já têm algum acesso à máquina pública. Esses já estão expostos na mídia. Mesmo assim, devem estar atentos ao que e como debater os temas na internet. “Todos já devem estar fazendo uma pré-campanha. A realidade é que agora é possível estar em busca do voto o tempo todo, só é preciso se adequar às limitações”, aponta Osti, que garante que a proximidade com o eleitor tem um caminho bastante simples. “O que esse candidato precisará ao atravessar a pandemia é, desde já, se expor nas discussões da cidade de forma pública, mas agindo com responsabilidade”, conclui.