Na política, não é difícil se fazer analogias. Usa-se o tabuleiro de xadrez e outras vezes as estratégias de uma guerra para avaliar cenários. Fato é que movimentos de tensões de poder marcam e delimitam a importância de personagens e regiões. Assim é a relação de uma cidade com a política estadual e pode-se analisar o poderio de Londrina no panorama político do Paraná. A segunda maior cidade do Estado, só perdendo em tamanho para a capital, costumava ter papel definitivo no processo decisório da disputa pelo Palácio Iguaçu, como por vagas no Senado. Ao longo dos anos, a relevância foi diminuindo e vários fatores podem ser considerados.

A partir do olhar de quem vê as diversas forças em constante tensão, mudanças no perfil econômico da cidade foram um fato fundamental para esse processo. É como explica o cientista político Emerson Cervi, da UFPR (Universidade Federal do Paraná), que detalha o processo como extra político. “O norte novo já teve uma centralidade econômica no Estado e isso mobilizava capital político. Nesse período, dois governadores saíram da região: José Richa e a Álvaro Dias. Com o passar dos anos, o poder econômico migrou para o oeste paranaense, com a indústria de transformação e o agronegócio. Isso fez a balança pesar mais para outro lado”, afirma.

Outra razão detalhada é listada como um elemento ideológico, o que pesa na balança do cenário político, não só no próprio Estado, como também nacionalmente. Cervi ressalta que a região tem passado por um processo de crescimento da radicalização ideológica, onde antes era solo fértil para o liberalismo econômico e político. “É impressionante como o que ocorreu foi a criação de ideário conservador abstrato, que não tem ligação com a realidade. Isso, por sua vez, reduz a participação dos agentes num discurso muito específico, mas que não consegue crescer. Um bom exemplo disso é que os campeões de voto de 2018 não se viabilizaram para o Executivo para 2020. Falta um projeto de forma geral”, analisa.

FATIA

O resultado eleitoral nas eleições municipais aponta um poderio de fogo para o governador Ratinho Junior, assim como para seu partido, o PSD e as outras legendas que formam a sua base. O partido elegeu 129 prefeitos, sendo que na Região Metropolitana de Londrina foram oito. A legenda conquistou 101 cidades a mais em relação ao pleito de 2016 (28 eleitos). O partido do governador ainda encabeçou ou compôs a chapa de 245 prefeitos eleitos no Paraná, 61,4% do total de 399, vencendo em 73 das 100 maiores cidades. Londrina escolheu pela continuidade do governo de Marcelo Belinati (PP), aprovando a sua administração – depois de um período de pelo menos duas décadas de um cenário local bastante tumultuado.

Elve Cenci, professor da UEL
Elve Cenci, professor da UEL | Foto: Marcos Zanutto/26/06/2014

Acompanhar o comportamento da política local já fez com quem se interesse pelo tema tivesse que se empenhar por compreender termos jurídicos e os imbróglios de processos de cassação no Legislativo. Hoje, a cena impõe compreender a relação entre antigos elementos analisados pela ciência política. “O partido do prefeito, assim como o do governador, não tem ideologicamente diferenças. Historicamente, são pragmáticos, fisiologistas. Estão ligados aos resultados e não têm oposição ideológica”, avalia o cientista político Elve Cenci, professor da UEL (Universidade Estadual de Londrina). “Na correlação de forças, Marcelo Belinati sempre se manteve próximo ao deputado Ricardo Barros e mais distante do governador, o que faz com que Londrina não tenha diferença na dinâmica estadual”.

Por outro lado, o histórico da disputa política em Londrina, em especial o chamado Belinatismo – termo cunhado a partir do grupo do ex-prefeito Antônio Belinati, ao qual o atual prefeito vem demonstrando fazer questão de se manter dissociado –, teve papel primordial na manutenção da influência da cidade em Curitiba. A prática de como eram travadas as relações àquela época é o que se chama de política paroquial, que não chega à diocese. “O Belinatismo não tinha envergadura estadual. Se caracterizou sempre como um fenômeno local e expõe a fragilidade das lideranças e de uma Londrina ensimesmada, que tem uma disputa com Curitiba, se volta para mais para São Paulo”, esmiúça Cenci.

Peça fundamental desse cenário por décadas, o experiente ex-deputado federal e economista Luiz Carlos Hauly (PSDB) resume a atual conjuntura pelo número de assentos conquistados na Assembleia Legislativa e na Câmara Federal. Ele mesmo não foi reeleito depois de chegar ao Congresso em 1991. “A representação atual está aquém do que já foi. Contamos com três deputados federais e outros três estaduais. Essa conta já foi de seis em Brasília e outros cinco em Curitiba. Londrina hoje vota em candidatos de fora, de outras regiões, e isso é um fenômeno”, diz. Entre as forças citadas estão os deputados federais Boca Aberta (PROS), Luisa Canziani (PTB) e Diego Garcia (PODE), e os estaduais Tercílio Turini (CDN), Tiago Amaral (PSB) e Boca Aberta Junior (PROS). “Se considerarmos tanto a microrregião como a macro que Londrina faz parte, representa uma porcentagem muito baixa”, alerta.

SOLUÇÕES

Como uma possível mudança para a atual realidade, Hauly segue o mantra de seu partido e critica o atual sistema de distribuição de vagas no Legislativo. Ele defende que o país adote o chamado sistema distrital misto, no qual metade dos deputados são eleitos pelos distritos, onde ganha o mais votado. Os eleitores também votam em listas dos partidos. O voto na legenda serve para calcular o espaço a que cada partido terá direito no parlamento. “Hoje o parlamentar anda em muitos municípios, fica dividido na conta de prestação, da representatividade. Mudando de sistema, haveria uma ligação muito próxima do político com sua região e seus representados”, defende.

Elve Cenci, professor da UEL
Elve Cenci, professor da UEL | Foto: Marcos Zanutto/26/06/2014

Por outro lado, na análise política, há uma ausência de protagonismo na região que precisa ser alterada para mudar de patamar. A proposta de Elve Cenci é que a cidade mude de postura, se afaste de uma postura subserviente, pouco ativa. “Falta uma agenda que tenha clareza e diga o que quer. As discussões internas são fracas e há de se discutir as necessidades locais”, critica. Temas para tratar são vários, como, por exemplo, a negociação pelos valores das praças de pedágio que impactam tão fortemente a economia local. “Politicamente, é preciso ter protagonismo com uma dissipação do poder. Os partidos não têm demonstrado a menor liderança. Eles são frágeis e os projetos políticos individuais”, conclui.