A Polícia Federal abriu inquérito para investigar ofensas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao presidente Jair Bolsonaro.

A apuração foi instaurada a pedido do ministro Sergio Moro (Justiça) e se baseia em artigos da Lei de Segurança Nacional e do Código Penal.

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. | Foto: Fernando Frazão - Agência Brasil

A investigação corre sob sigilo, mas foi confirmada nesta quarta-feira (19) pelo Ministério da Justiça em nota. Lula, que está em Brasília, prestou depoimento à PF pela manhã.

À tarde, o petista falou à Justiça Federal no Distrito Federal no âmbito da Operação Zelotes, que apura suposta venda MP (medida provisória) para beneficiar o setor automobilístico.

"O Ministério da Justiça e Segurança Pública requisitou a apuração contra Lula, assim que ele deixou a prisão, para investigar possível crime contra a honra do Presidente da República", afirmou pasta comandada pelo ex-juiz da Operação Lava Jato.

Moro foi o responsável pela condenação, no caso do tríplex em Guarujá (SP), que levou o ex-presidente à prisão.

O petista foi solto, em novembro do ano passado, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) determinar o cumprimento da pena após esgotados todos os recursos. Lula foi preso em abril de 2018.

"Lula disse, à época [da soltura], que Bolsonaro era chefe de milícia. Podem ter sido praticados os crimes do art. 138 do CP [Código Penal] ou do art. 26 da Lei de Segurança Nacional", afirmou o Ministério da Justiça.

O artigo do Código Penal trata do crime de calúnia -imputar a alguém fato definido como crime. O trecho citado da Lei de Segurança Nacional trata do crime de caluniar ou difamar o presidente da República.

Quando foi solto, o petista fez críticas ao governo Bolsonaro. Ele chamou o presidente de miliciano.

Em entrevista ao site O Antagonista, na ocasião, Bolsonaro chegou a afirmar que a Lei de Segurança Nacional "está aí para ser usada". "Alguns acham que os pronunciamentos, as falas desse elemento [Lula], que por ora está solto, infringem a lei", afirmou o presidente ao site.

A presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), comentou o depoimento de Lula à PF na tarde desta quarta.

De acordo com ela, foi o delegado federal que afirmou que o ministro pediu abertura de investigação contra Lula com base na legislação. A informação posteriormente foi confirmada pela pasta.

Segundo os petistas que o acompanharam na audiência, um vídeo feito por Lula após reunião com o Movimento dos Atingidos por Barragem foi usado para embasar o inquérito.

O petista fez a declaração em 9 de novembro de 2019. Lula foi preso em abril de 2018.

"Nós vamos ter que levantar a cabeça e lutar porque não é possível que um país do tamanho do Brasil tenha o desprazer de ter no governo um miliciano responsável direto pela violência contra o povo pobre, responsável pela morte da Marielle, responsável pelo impeachment da Dilma, responsável por mentirem a meu respeito", afirmou o ex-presidente no vídeo.

Moro argumentou que a fala do ex-presidente feriu a honra do presidente da República e solicitou o inquérito. Gleisi classificou o pedido de apuração como absurdo.

"Já tem um erro do ponto de vista jurídico. Na questão de honra, não é a Lei de Segurança Nacional que dá guarida para fazer um inquérito desse tipo", disse.

"E segundo que é uma excrescência usar a Lei de Segurança Nacional, uma lei do regime militar, para cercear a liberdade de expressão de um ex-presidente da República", afirmou.

A lei foi editada em 1983, dois anos antes do fim da ditadura militar.

De acordo com Gleisi, a audiência na PF durou cinco minutos.

"O presidente respondeu tranquilamente, aliás questionou porque esse questionamento não foi colocado por outras lideranças do governo e pelo próprio Moro mesmo quando juiz quando o filho do presidente Eduardo Bolsonaro disse poderia fechar o Supremo Tribunal Federal com um cabo e um soldado, aí sim poderia caber a excrescente lei", afirmou a deputada.

DEPOIMENTO NA ZELOTES

Depois de prestar depoimento à PF, o ex-presidente negou, em outra audiência, na 10ª Vara Federal, as acusações que pesam sobre ele em um dos braços de investigação da Operação Zelotes e acusou o ex-ministro Antonio Palocci de ter mentido ao MPF (Ministério Público Federal).

​​O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou nesta quarta (19) as acusações que pesam sobre ele em um dos braços de investigação da Operação Zelotes e acusou o ex-ministro Antonio Palocci de ter mentido ao Ministério Público.

O petista afirmou que a denúncia não passa de uma "grande mentira" e que Palocci deve ter recebido um "prêmio" para depor contra ele.

Lula foi ouvido em audiência na 10ª Vara Federal, em Brasília, pelo juiz Valisney Oliveira, responsável pela ação penal da Zelotes.

O ex-presidente é acusado de corrupção passiva por supostamente ter participado da "venda" da Medida Provisória 471, editada em 2009 e que beneficiou empresas do setor automobilístico.

A medida prorrogou por cinco anos os incentivos fiscais para montadoras instaladas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Logo no início da audiência, Lula foi questionado se cometeu o crime de corrupção na edição da medida provisória.

"Essa é uma das grandes mentiras contadas. Eu estou aqui para desvendar tudo e provar porque o MP [Ministério Público] mentiu na acusação e porque a Polícia Federal mentiu no inquérito", afirmou.

O ex-presidente foi denunciado em setembro de 2017, junto com o ex-ministro Gilberto Carvalho, seu ex-chefe de gabinete, e mais cinco pessoas.

Os procuradores alegam que lobistas das empresas automotivas prometeram o pagamento de propinas a intermediários do esquema e a agentes políticos, entre eles Lula e Carvalho.

O destino do dinheiro, segundo a acusação, seria o custeio de campanhas eleitorais do PT.

"Estou cansado de tanta mentira contra mim, de tanta leviandade, de tantas insinuações. Eu duvido que tenha um juiz, um procurador, um delegado ou um deputado que diga o seguinte: 'Eu vi um empresário que deu cinco centavos ao Lula'", disse o petista.

As acusações contra ele foram reforçadas em depoimento do ex-ministro Palocci, em 2018.

Palocci foi ouvido como testemunha no caso e disse que o filho de Lula, Luiz Cláudio, recebeu dinheiro de um dos lobistas que fizeram o acerto.

"A única explicação é que ele deveria estar ganhando um prêmio por fazer a delação e por isso ele se prestou a contribuir com o Ministério Público com as mentiras que ele contou", disse.

Lula foi questionado sobre quando recebeu e se conversou com Mauro Marcondes, apontado como um dos lobistas que intermediou as negociações.

O petista disse que já recebeu Marcondes no passado, mas que nunca esteve com ele sozinho e em nenhuma hipótese conversou sobre a edição da medida.

O ex-presidente também saiu em defesa de Carvalho, que já foi questionado sobre os encontros que teve com Marcondes.

"A relação que Gilberto Carvalho tinha com Mauro Marcondes era era eminentemente profissional. (...) Ele era meu chefe de gabinete. Estava lá para atender as pessoas. E atender bem. Ele deveria ter sido acusado se não tivesse atendido", disse Lula.

A audiência desta quarta foi uma das últimas etapas desta ação penal, que está na fase final, de depoimento dos réus. A próxima etapa são as alegações finais das partes.

Em outra ação ainda no âmbito da Zelotes, Lula responde por supostas negociações irregulares que levaram à compra de 36 caças do modelo Gripen, da Suécia, pelo governo brasileiro.