Notícia recente trata da paralização de trens de carga no trecho Ourinhos a Londrina. A previsão de interrupção é até o final de 2024. Como justificativa, a falta de demanda.

Em 1942, a revista Ferrovia publicou artigo sobre visita à Companhia Ferroviária São Paulo Paraná - CFSPP. Afirmava: “A terra inigualável daquela região é valorizada pela passagem crepitante do “cavalo de ferro”. A fumaceira que os locomotivas vão deixando pela região por onde passam, é simbolicamente a demonstração de que a estradas de ferro é e será sempre a razão do adiantamento mundial”.

Havia empenho e expectativa sobre o potencial da ferrovia na ocupação de terras e formação de cidades.

Uma planta denominada “Esquema de Trilhos da CFSPP” (1942) apresenta uma linha simples com a localização de estações e locais de manobra. O trecho é de duzentos e cinquenta e um quilômetros, de Ourinhos a Arapongas. Os chamados desvios (linhas paralelas de parada e espera) e triângulos (locais de manobra de retorno) formavam o conjunto dos pátios de estação.

A leitura atenta do esquema de trilhos permite apontar sua importância enquanto estratégia do empreendimento. Localizar e hierarquizar pontos de parada e circulação.

Por exemplo, a estação Ourinhos tinha no pátio dezesseis desvios e um triângulo múltiplo. Formavam um conjunto complexo. Além Tibagy, já nas terras da Companhia de Terras Norte do Paraná CTNP, existiam as seguintes estações entre os km 250 e 271: Londrina, Nova Dantzig, Rolandia, Bethlem e Arapongas.

Londrina tinha seis desvios e um triângulo; Nova Dantzig e Rolandia, três desvios e um triângulo; Bethlem, um desvio e, finalmente, Arapongas, três desvios e um triângulo.

O número de desvios e triângulos refletia o grau de importância da estação. Serviam para atender ao transporte do crescente número de compradores de terras e escoamento de produtos agrícolas. Resultavam na extensão da área de cada pátio ferroviário.

Influenciaram na localização de estações e patrimônios as cláusulas de decretos de concessão de terras devolutas, decretos de colonização e de concessão de ferrovia. “Patrimônios de 15 em 15 quilômetros” era mais resultante de clausulas de decretos do que intenção desta ou daquela Companhia de Colonização.

“Altos” com possibilidade de abastecimento de água ao longo da ferrovia eram potencial de localização da estação. “Alto”, reta e plano para a estação eram alguns elementos definidores da forma urbana.

A paralização da circulação de trens em 2024 é momento importante para rediscutir a questão do pátio ferroviário e estação nas cidades entre Ourinhos e Londrina. São a última reserva de espaços livres nas cidades ao longo da ferrovia. Temos assistido a várias soluções e (des) soluções no seu reuso. O abandono de estações e o loteamento de pátios ferroviários deveriam ser evitados.

Rediscutir o potencial do patrimônio ferroviário. Os parques High Line (Nova Iorque, 2009) e o recente Camden High Line (Londres, 2021), guardados a devida escala, mostram exemplos de sucesso de recuperação de espaços ferroviários. Recuperar o significado do pátio ferroviário enquanto importante espaço livre, vazio estratégico nas cidades.

Humberto Yamaki, coordenador do Laboratório de Paisagem da Universidade Estadual de Londrina