O filósofo Cláudio Ulpiano morreu aos 60 anos de idade, em Santa Teresa, no Rio de Janeiro. Ele era um professor de filosofia, apaixonado pela filosofia e pelo seu magistério. Viveu para isso, viveu para a filosofia. Foi um ser ardente, intenso, marcado por uma passionalidade militante.
Ulpiano amou o pensamento de Gilles Deleuze. E o expôs com dedicação e minúcia. Era, assim, um nietzschiano. Queria unir filosofia e vida. Filosofia e arte. Gostava de falar sobre as relações entre a filosofia e o cinema. Foi um homem voltado para o futuro, para a criação do futuro.
Ele não entendia o saber filosófico à maneira de uma disciplina fria, formal, acadêmica, sistemática. Queria o saber em contato com a vida, a realidade dinâmica, os debates do nosso tempo, as discussões de origem geral. Era um espírito insaciável, insatisfeito, inquieto. A filosofia, para ele, não era a resposta pronta, estável, acabada, o repouso. Era a procura.
Esse espírito de busca o acompanhou sempre e o caracterizou como mestre. Nietzsche o inspirava, como fonte de inquietação. Era o seu um pensamento dramático. Desafiador.
Ele participou dos trabalhos da Universidade do Professor, em Faxinal do Céu (PR), na equipe uníssona de Arthur Pereira e Oliveira Filho. Fazia as suas conferências filosóficas, nos seminários de Educação Avançada, com visível prazer, com entusiasmo. Tinha a expressão fluente e vivaz. E falou para mais de 30 mil professores na sua experiência serrana de Faxinal.
As luzes de sua casa na Rua Cecília Meirelles ficavam acesas ao longo da madrugada. Levou para lá cerca de 3 mil livros. Era ele um leitor voraz, ávido. Lia infindavelmente, com fervor de moço. E sua figura era a de um sábio, um mestre da antiguidade, um sábio atento ao mundo.
Ulpiano não escreveu livros. Não gostava de escrever. Gostava, sim, de falar, de expor. Era um ser oral. A oralidade lhe era essencial. Escreveu pouco. A tese sobre os estóicos. A tese a respeito de Deleuze. E quis que ela se chamasse ‘‘A Aventura do Espírito’’. Concebia o filosofar como uma aventura do espírito.
Escreveu, assim, por obrigação, para cumprir deveres estritos do seu magistério universitário. Queria a libertação da palavra oral, na aula, na conferência, na conversa, nos debates, que tanto amava. Era um ser dialógico. Não queria o monólogo. O pluralismo era o seu clima. A diferença, o respeito à diferença, a compreensão da diferença.
A Universidade do Professor foi o seu ambiente ideal. Sentiu-se em casa. Sentiu-se à vontade. Expandiu-se plenamente. Viveu em Faxinal do Céu momentos excelentes do seu destino pessoal. Era um filósofo aberto. Um filósofo voltado para o futuro. Um filósofo dinâmico.
Criativo, sim. Sensível aos apelos de renovação, de descoberta, de criatividade contínua, para além de todas as fronteiras, de todas as barreiras, de todos os limites. Filosofia e cinema, filosofia e vida, filosofia e futuro, filosofia e ciência, tudo o preocupava, tudo o inquietava, pateticamente.
Ele não tinha a placidez escolástica das verdades estáveis, nítidas. Era um bandeirante da filosofia, um pioneiro, um descobridor ousado, um abridor de caminhos, sempre alerta, crítico, insatisfeito.
Sofria, ao filosofar. E contemplava a noite.
Jackson de Figueiredo, que era um nietzschiano, uniu profundamente filosofia e sofrimento. Grandes nietzschianos foram Jackson de Figueiredo e Gilberto Amado.