Noticia a imprensa por aqui, a desventura de nove congressistas tupiniquins (um londrinense incluso) em solo estadunidense onde, no congresso pilgrin, acompanharam sessão da Comissão de Assuntos Exteriores da Câmara dos Deputados norte americana, cujo tema foi "Brasil: a crise da democracia, liberdade e do Estado de Direito".

A comissão ouviu testemunhos sobre o que supôs ser ataque à liberdade de expressão, censura e excessos do Judiciário Brasileiro. Este tema último foi, como seria de ser, dedicado a algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes que, há tempos, vem desagradando o bolsonarismo.

Noves fora e como diria meu saudoso avô Paulo, "não há nada tão ruim que não possa ser piorado". Assim é que, não bastasse a desalegria de convívio com tanta gente que não reflete qualquer imagem ligada à democracia, ainda somos expostos em uma comissão estadunidense – seria o preço a se pagar por viver em democracia?

Mas vamos com calma (piano, piano) – afinal o tema convocatório da sessão no congresso estadunidense levanta a ideia de uma ‘crise’ no seio da democracia, da liberdade e do estado de direito no Brasil. Será?

É edificante o congresso estadunidense se preocupar com liberdade de expressão alienígena, ao mesmo tempo em que convive com a perseguição de tio san à wikLeaks. Será que cabem, na mesma frase e em território pilgrin, Assange e liberdade de expressão?

Deveras, há instantes em que a vida oferta possibilidade de silêncio. Penso que essa é uma delas, especialmente para os norte-americanos e para quem, neles, busca socorro para a própria fraqueza. Fato é: quem persegue Assange por revelar ao mundo o bastidor putrefato da política externa norte americana não tem estatura moral e ética para fazer um debate sobre liberdade de expressão em qualquer país outro.

Registrado isso, passemos ao espectro democrático. Na seara democrática, outro tanto e para limitar o questionamento a um recorte histórico contemporâneo, questiono se, do Vietnã aos dias de hoje, congraçam os americanos do norte, qualidade qualquer que os faça autoridade em assuntos dessa natureza.

Aqui, como no parágrafo anterior, parece que a vida oferta uma nova oportunidade de silêncio, a fim de que não se espraie uma qualquer vergonha alheia, ao pálio totalitário de quem, sem atentar para o dever de casa, vive a vislumbrar o relvado do vizinho.

Por fim, estado de direito em polo de convívio com os filhos do tio san não me parece uma equação factível, mormente em plena efervescência de Guantánamo.

Noves fora o óbvio ululante, o que ficará registrado na história é que um punhado de parlamentar (nine) tupiniquim foi ao congresso estadunidense expor as entrelinhas destacadas e, assim fazendo, deram visibilidade a mentira cara à salvaguarda da narrativa da extrema direta, de que há uma crise em algumas de nossas instituições – democracia, liberdade e Judiciário.

Isso é muito pequeno. É raso até para eles que lá estiveram e lá deram o seu apoio ao ato em si, que em nada aperfeiçoa a democracia, ainda que contribua para infectá-la com o vírus da mentira que empareda a percepção da realidade, criando um multiverso ficcional de escopo e interesse fascista.

Espero que as pessoas sigam se questionando, especialmente, se há polo de convívio (mínimo) entre a realidade desligada que essa gente busca (é só ver o que estão fazendo com a tragédia dos gaúchos) e a necessidade progressista de estabelecermos parâmetros mais sensíveis que sirvam às minorias e possam mitigar a abissal diferença social de nossos dias.

Já não nos resta muito tempo, todavia, naquilo que a grita da natureza, escancarada na lágrima das águas em Rio Grande do Sul, não pode mais estar à mercê de interesses do grande capital. O estado tem que tomar as rédeas essa situação, contrapondo e quase que encerrando incursões do homem explorador do próprio homem e da natureza. Como? Atuando no bolso dos privilegiados.

Olha, não é possível que o subsídio ao agronegócio venha sem contrapartida que mitigue (ao nível de uma aceitação de segurança máxima) o uso de defensivos agrícolas, ao tempo em que se desenvolvam alternativas naturais – como, por exemplo, os inimigos naturais das pragas que assolam as lavouras mundo afora.

Antes que se levantem os barões neoliberais e sua grita de sempre (custo elevado + inviabilidade temporal + outras tragédias tuteladas no acúmulo de capital), lembro que a fala dos ecologistas (em um só sentido e há mais de três décadas) não está mais divorciada do modelo explorativo da realidade, naquilo que o abandono da ciência (pauta mais cara do fascismo) tem custado e custará ainda mais ao planeta, em especial ao coletivo das minorias.

Assim, para que o amanhã não espelhe uma Porto Alegre em Florianópolis, urge tirar da frente o interesse do grande capital, alocando em seu lugar uma pauta de proteção inegociável às minorias.

O primeiro passo para isso, penso, é dizer que os nove parlamentares que foram ao congresso estadunidense participar de uma sessão que discutia uma "crise" em nosso modelo democrático e em nosso sistema Judiciário e de cidadania (liberdade de expressão), além de mentirem, não estão preocupados com qualquer destes institutos, mas sim com os interesses do grande capital.

Tristes trópicos, onde a vida se esvai à custa de mais – valia e dor.

Saudade Pai!

João dos Santos Gomes Filho, advogado