O brasileiro não gosta de política externa. Não faz a ligação do que ocorre no exterior com o interesse interno. A vaca louca canadense ajudou a unir os dois pontos da equação. O governo de Ottawa decretou o boicote ao produto brasileiro, e os criadores de gado em Goiás, Minas e nos dois Mato Grosso pagaram a conta. O desemprego e o prejuízo ocorreram aqui. O problema externo é interno.
O mesmo raciocínio se aplica à questão colombiana. O governo da Colômbia está perdendo o controle sobre o próprio território. A guerrilha, cujo grupo mais importante são as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), tem sólido controle das ações. Desfruta do privilégio de exercer, de fato, o poder numa região chamada de zona desmilitarizada, com tamanho parecido com o do Estado do Rio de Janeiro.
A Colômbia é o maior produtor de cocaína no mundo. É também o maior exportador. É um negócio próspero que envolve a comercialização anual de setecentas toneladas do produto. Necessário que haja mercado e consumo. Os traficantes que se encastelam nos morros cariocas recebem o produto do país vizinho. E o vendem para quem pode pagar. Fernandinho Beira-Mar, considerado pela CPI do Narcotráfico como o mais importante traficante brasileiro, vive dentro da zona desmilitarizada. De lá, comanda seu negócio.
A namorada dele, Jaqueline de Morais, de 25 anos, foi presa, há uma semana, no interior da Colômbia. Além dela foram detidas 21 pessoas e apreendidos documentos reveladores. Os papéis indicam que em uma única transação as Farc entregaram drogas a Fernandinho Beira-Mar em troca de 560 fuzis, 2.252 armas de pequeno porte, além de explosivos e munições. A cocaína, naturalmente, veio para o mercado brasileiro. As armas ficaram lá.
O Exército colombiano, na mesma operação, apreendeu dos guerrilheiros 51 carros, 27 barcos, cinco telefones celulares por satélite e US$ 75 mil em dinheiro. Foram destruídos 11 laboratórios de refino e uma área de 10 mil hectares onde a cocaína era plantada. O problema interno colombiano fomenta a criminalidade no Brasil. A guerra entre traficantes nos morros cariocas tem sua longínqua explicação no país vizinho. O problema da Colômbia não é apenas colombiano. Suas ramificações ultrapassam fronteiras.
O tráfico está chegando ao poder no Brasil. Deputados já foram cassados por ligações com grupos de narcotraficantes. Governadores foram acusados. A recentíssima confusão política ocorrida no Amapá tinha o tráfico de drogas como explicação. E tudo começa na Colômbia. A guerra que se alastra naquele país tenta projetar uma imagem político-ideológica. Mas é a simples ascensão de grupos ligados ao narcotráfico, que não pretendem derrubar o governo. Isso teria custo internacional muito elevado. Querem apenas alcançar o Caribe com o objetivo de exportar para o Sul e o Norte. Em quantidades cada vez maiores.
- ANDRÉ GUSTAVO STUMPF é jornalista em Brasília
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