Quanto custa ser traído? Para quem foi, é uma situação incalculável. Para quem o fez, pode custar muito caro. Não apenas a perda de um relacionamento, mas, também, muito dinheiro. Recentemente, um casal de Belo Horizonte virou notícia nacional por conta disso. Embora tenham tido a identidade preservada, foi o que fizeram que rodou algumas manchetes por aí: os dois firmaram um pacto antenupcial e, entre outros detalhes, estabeleceram que, se, porventura, alguém trair o outro, deverá pagar uma multa de R$ 180 mil. A Justiça referendou e validou o acordo.

O pacto antenupcial é documento firmado pelos noivos e que estabelece regras durante a constância da união afetiva. E essa é uma realidade cada vez mais comum entre os noivos: pactuar sobre questões práticas e do cotidiano do casamento, principalmente, se forem situações econômicas. São diversos os exemplos, sendo o mais comum deles a definição sobre o regime de bens. Entretanto, podem ser objeto do pacto assuntos como doações de bens entre os cônjuges, propriedade de imóveis, questões sobre compra e venda de bens a partir do pacto, cessão de direitos, permutas, entre outros.

Assim, o pacto antenupcial é um instrumento jurídico que torna possível estabelecer diversas questões numa relação matrimonial. Isso nada mais é do que colocar no papel as previsões e possibilidades que podem acontecer e quais medidas devem ser tomadas em casos de divisão de bens, de divórcio, traição ou doença. E, afinal, por que não estabelecer uma multa em caso de traição? Dizem que muitas pessoas só sentem os efeitos e as consequências de algo quando mexem com seu bolso. De fato, não é algo corriqueiro, mas, também, não pode ser encarado como falta de confiança.

Muita gente ainda nutre o pensamento de que, ao estabelecer um pacto antenupcial, os noivos estão desconfiando uns dos outros. Ou seja, não estão confiantes de que o cônjuge irá respeitar ou não há amor o suficiente para conectar-se numa relação duradoura. Nada disso. O documento jurídico é apenas mais um instrumento de regência da vida cotidiana, como são tantos outros: contrato de aluguel, de prestação de serviços, de doação de bens, um acordo de sócios, e assim por diante.

Pouco conhecido e utilizado, o documento está previsto no artigo 1.640 do Código Civil. Obviamente, o pacto antenupcial pode ser feito para evitar certos golpes. É, também, um recurso necessário e fundamental para evitar desconfianças do tipo ‘golpe do baú’ e até brigas decorrentes de divergências matrimoniais. Nesse sentido, a Justiça tem validado com mais frequência pactos antenupciais com cláusulas criativas e isso tem se tornado mais comum e natural entre os casais. Não é que as pessoas se casam já pensando em se separar, mas, é uma maneira de se prevenir de situações indesejáveis que podem acontecer.

No caso do pacto antenupcial registrado em Belo Horizonte, ao deferir e validar o documento, a juíza ressaltou que quem decide o teor do documento são os noivos. Portanto, percebe-se que há uma busca da autonomia dos casais para decidir o que estipular e especificar. O que não pode é firmar cláusulas que violem a lei, os princípios constitucionais, que vão contra a dignidade humana e a igualdade e isonomia, que interfiram em questões como os direitos humanos. No mais, quaisquer outras situações podem e devem ser previstas num pacto antenupcial, a fim de deixar as coisas mais claras entre os casais que pretendem criar um vínculo afetivo mais profundo.

Dessa forma, vamos nos acostumar a ouvir e presenciar, cada vez mais, sobre o pacto antenupcial. E pode ser que muitas cláusulas aparentemente estranhas virem notícia novamente. Uma nova geração de casais, mais prática e objetiva, está surgindo. E não há problema algum nisso!

Renan De Quintal é sócio do escritório Batistute Advogados, formado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), pós-graduado pela Escola de Magistratura do Paraná (EMAP) e membro da comissão de direito da família e sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), pela subseção de Londrina.