A sanção da Lei 14.151/2021, que determina o afastamento de trabalhadoras grávidas de atividades presenciais, publicada recentemente pela presidência da República, na realidade pode criar um problema. Embora tenha a intenção louvável de proteger esse grupo contra a contaminação pelo coronavírus, a decisão pode gerar impasses em empresas, porque dispõe sobre uma realidade generalizada, sem levar em conta especificidades particulares.

Pelo texto, a gestante afastada deverá exercer suas atividades laborais em home office, teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância. E é aí que mora o problema. E se a empresa não tiver uma função que seja possível ser exercida de casa? Muitas trabalhadoras não conseguirão exercer suas atividades dessa forma porque a atividade exige a presença. Exemplo: uma faxineira não conseguirá fazer a faxina de casa. Ou, então, uma profissional da construção civil que atue diretamente numa obra, também não conseguirá desenvolver à distância. Da mesma maneira uma dentista, uma enfermeira, entre tantas outras profissões.

Se, por um lado, as profissionais têm garantia jurídica de manter-se afastadas sem prejuízo da remuneração, ou seja, não poderão ter seu salário reduzido, por outro, muitas empresas precisarão substituir essas trabalhadoras. O que implica em mais custos com um novo profissional que, mais para frente, poderá substituir a anterior. É perfeitamente compreensível que uma decisão dessa leve em conta a saúde da grávida. Entretanto, é preciso analisar o contexto de uma forma completa, pois, não se pode desequilibrar uma relação trabalhista, deixando manco um dos lados.

A questão da saúde pública é muito séria. Percebe-se que essa sanção vem no esteio das análises da morte de uma gestante de 35 anos, que morreu em decorrência de um acidente vascular cerebral hemorrágico (AVC), situação que pode (ou não) ter ligação com a aplicação de uma dose da vacina AstraZeneca, contra a Covid-19. A partir de então, o Ministério da Saúde definiu que grávidas e puérperas só podem receber doses das vacinas CoronaVac e Pfizer. E, na sequência, a sanção, que veio um mês depois do projeto aprovado no Senado e quase dez meses depois da aprovação na Câmara dos Deputados.

Portanto, a sanção soa como um populismo governamental em meio a uma crise de saúde pública. É nesse sentido que devem ser analisadas todas as implicações de uma decisão como essa. De um lado, as grávidas, que devem ser protegidas pela lei, principalmente em momentos como o que estamos passando. De outro, também é preciso entender que não se pode prejudicar o lado empresarial e patronal da relação trabalhista porque, senão, pode ser que as próprias trabalhadoras sejam prejudicadas mais para frente em eventual substituição do cargo ocupado ou possível falência de empresas.

Dessa forma, quando o governo toma uma decisão como essa, precisa prever de que maneira deverá manter uma trabalhadora grávida em casa, sem poder exercer sua função de origem, por exemplo, e sem prejudicar seu contrato de trabalho e remuneração. É preciso oferecer possibilidades, não apenas multas e punições. Da mesma forma com relação a tantos outros grupos de trabalhadores e empresários, aqueles que têm comorbidades, os que integram algum tipo de grupo de risco, pela idade, por exemplo, além de inúmeras e diversas situações.

Não se questionam os direitos trabalhistas ou os benefícios adquiridos pelas mulheres grávidas. Ao contrário, deve-se defendê-los e ampliá-los sempre que for necessário. Todavia, é importante também entender e compreender as implicações financeiro-econômicas e os impactos no universo empresarial. Uma discussão mais aprofundada sobre o tema já ajudaria nesse processo de implantar medidas importantes de combate e prevenção à Covid-19. Por que não ouvir a população e os setores afetados? Isso também seria prudente!

Glauce Fonçatti, membro do Escritório Batistute Advogados, é advogada trabalhista, formada pela Universidade Paranaense (Unipar), campus Umuarama, e tem especialização pela Escola da Associação dos Magistrados Trabalhistas do Paraná (Emtra-PR).