Reviver Nietzsche em tempos de eleições no Brasil em 2022 é tarefa dentre as mais prazerosas. É ter a sensação de que ‘‘Ecce Homo’’ continua vivo e muito atual. ‘‘O Anticristo’’ teve uma existência complicada. Espírito extremamente crítico, alternava momentos de euforia e depressão, numa dessas recaídas, Nietzsche evidenciou a odisseia humana: ‘‘A vida é o eterno retorno das coisas, se houvesse algum sentido, alguma finalidade já teríamos atingido.’’ Nesse momento, paira no texto um intruso – o título da obra "hemingwayiano" “Por quem os sinos dobram” que se completa com um recorte da música “Arte Final” de Belchior: “Não perguntes por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti! Ora, senhoras! Ora, senhores!”.

Nietzsche tinha razão, o eterno retorno das coisas é facilmente aceito na explicação de muitas neuroses e manias humanas. Embora o seu trabalho na época não tenha tido o merecido reconhecimento, nunca deixou que o alienassem. Espremia os miolos numa busca solitária que a todos passava despercebida, produzindo uma obra original que ultrapassou os tempos. Teve uma vida recolhida, poucos amigos, quase nenhum amor. Mas produziu e escreveu muito. Influenciou e inspirou muitos, a lista é vasta : filósofos, pensadores, políticos, cientistas, escritores.

Detalhe: o grande criador da psicanálise, o médico neurologista austríaco Sigmund Freud, por exemplo, teria confessado mais tarde o cuidado que teve com os escritos do sábio alemão ao investigar a psique humana. Ou seja, tudo o que jorrou de Nietzsche, “Além do bem e do mal”, não pode ser considerado absoluto, até porque tudo é relativo e a perfeição não tem morada nesse mundo.

Destarte, sempre persistirá no “Humano, Demasiado Humano” a ideia de que existe algo a fazer, algo que deve ser melhorado, algo que deve ser retornado. Mas deve ser feito agora, no próximo segundo, senão o tempo passa, a vida flui, novas sensações, velhas marionetes, os mesmos nomes, vetustas ideologias e daqui a pouco… ‘‘Pluft’’! Cadê você? Assim ele vociferou no “Crepúsculo dos Ídolos”, com a mesma intensidade, ele bradou em “Assim falou Zaratustra”.

Imagem ilustrativa da imagem OPINIÃO DO LEITOR - Nietzsche e as eleições 2022
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Assim, a voz do povo – “Longe de a voz do povo ser a voz de Deus, mais vezes do que não, o oposto tem sido a verdade. Siga a voz do povo e mui provavelmente errará”. Independentemente dos vencedores nas próximas eleições de 2022, na contenda entre direita X esquerda, o regozijo retumbante diante da dupla personalidade do cidadão, este continuará exteriorizando sentimentos de amor e ódio, fúria e paixão, provocando nos mais incautos e ingênuos – no homem médio – uma gigantesca confusão na sua identidade, mas que – suavemente – se revela diante dos ensinamentos de Nietzsche: a vida é o eterno retorno das coisas.

Antônio Sergio Neves de Azevedo (estudante) Curitiba

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