Luiz Geraldo Mazza
PUBLICAÇÃO
sábado, 25 de agosto de 2001
O símbolo da meia-entrada
A quebra do monopólio da emissão de carteira de estudante tira das mãos da UNE e da UBES um instrumento-chave para suas mobilizações, mas de outro lado lança um desafio à rapaziada para encontrar formas de superar esse arrocho sobre sua contabilidade. No Brasil, a tutela pública é marca dos sindicatos tanto patronais como de trabalhadores, e disso não escapam as organizações dos estudantes. Veja-se a sede da UPE, destruída pelos próprios estudantes, que a transformaram num pardieiro sinistro e agora, restaurada, retorna ao seu controle através de comodato. Como de resto, há muito o sindicato dos jornalistas usufrui de situação parecida.
O estudante tem uma tradição da meia-entrada. Tanto que além do cinema e dos espetáculos públicos, briga aqui pelo passe escolar nos ônibus, concessão que o lernerismo até hoje tem recusado sob o fundamento de que com menos gente pagando, os que pagassem seriam sufocados pelas tarifas intoleráveis. Não esqueço de uma dessas batalhas de colegiais, nos anos 50, com o Rafael Iatauro fazendo ''piquete'' na porta do Cine Palácio a boicotar as sessões em defesa da meia-entrada.
Num congresso da UPE, que precedia a eleição e no qual as chapas se digladiavam em torno de proposições as mais absurdas, o líder da direita, Paulo Ildefonso D'Assunção (encerrou sua carreira no Ministério Público em Londrina) apresentou moção para que estudantes tivessem acesso à meia passagem em ônibus, trens e aviões. O estudante de engenharia Silva Té, da extrema esquerda, propôs emenda aditiva para que houvesse também pagamento de apenas 50% nos serviços funerários. Paulo, irado com o deboche do interlocutor, fez- lhe um apelo à seriedade. Silva Té argumentou socraticamente: ''O colega, que é defensor do primado do espírito, deveria ser mais compreensivo com alguém materialista como eu, que afinal faço uma proposição transcendente: enquanto ele se limita ao transporte das pessoas durante a vida, eu cuido daquele que vem depois da morte!''
Que saudades desses esgrimistas de congressos estudantis. Como deve ter faltado na formação dos políticos atuais, notadamente os do Paraná, esse tipo de vivência. Basta lhes ouvir os discursos, desvendar-lhes os conceitos, para saber que não passaram certamente por um teste tão educativo, quer para a inteligência ou a sensibilidade.
DIREITA, ESQUERDA José Richa foi eleito presidente da UPE numa chapa de direita. A de esquerda unia comunistas e o pessoal da Juventude Universitária Católica (JUC). Richa foi repórter do ''Diário do Paraná'' e fez uma série de textos com o título ''Assim agem os comunistas''. Os textos se voltavam para os descendentes do Leste Europeu, alguns deles da nobreza, que viviam no Paraná, narrando horrores que pessoalmente ou através de familiares haviam sofrido.
No comando da instituição estudantil, Richa já mostrava aquilo que tanto o aproximava no estilo de Ney Braga: a concórdia e a busca do consenso. E foi com essas credenciais que decolou na carreira de político, já que a de odontólogo, na qual se formou, nunca exerceu.
Essa habilidade para o convívio e justamente com a JUC, que a ele se opusera na eleição estudantil, o levaria à condição de líder internacional, vejam só, da Juventude Democrata Cristã, o que respaldava Ney Braga, nacionalmente, e o transformaria num comandante nacional do PDC. Nenhum outro paranaense obteve tal feito em toda história. Mas assim mesmo não emplacamos nem a vice, que já havíamos tentado com Munhoz da Rocha, e muito menos a presidência, que só Affonso Camargo pelo PTB com apoio do Tião Macalé, já que Alvaro Dias e Roberto Requião foram gongados nas tentativas no PMDB.
MISSES Entre as múltiplas atividades que desempenhei como jornalista há uma interessantíssima: a de organizador de concursos de Miss Paraná. O pudor exagerado daqueles tempos, passagem do fim dos anos 50 para 60, era um contraponto à aguda liberalidade de hoje. Basta lembrar que fizemos, com extrema dificuldade, os concursos em maiô quando os da Catalina eram os promotores do Miss Universo.
A secura era de tal ordem que mostrei a ficha biométrica para uma das mães das candidatas e quando ela viu lá a expressão ''coxas'' recuou como se medi-las fosse uma heresia.
Para compensar exageros tivemos façanhas como a de Ângela Vasconcellos, que quase ganhou o Miss Universo e que era intelectualizada ao ponto de também se deslumbrar ao mesmo tempo com ''O Pequeno Príncipe'' de Exupery e Franz Kafka, justamente o de ''A metaformose'', em que Gregório Samsa desperta e assiste a sua transformação em barata.
Outro feito e esse em parte do João Féder, que comandava um concurso nacional na ''Tribuna do Paraná'', denominado Miss Cinelândia foi a vitória da paranaense Vilma Sozzi batendo Adalgisa Colombo, que foi Miss Brasil e quase chegaria a Miss Universo. Vilma foi ''Miss Paraná'', mas não entrou entre as finalistas.
ESPANTO Choroso, o homem chegou na roda do café e pediu dinheiro para o caixão do filho que acabara de morrer. Afeitos ao melodrama, mas desconfiados, ponderávamos se havíamos ou não caído num golpe sentimental. Até que quando nos preparávamos para deixar o local, lá veio o homem, com o mesmo ar arrasado, levando às costas o esquife azul do seu anjinho. Esse tipo de lance era a matéria-prima das crônicas que escrevia que uns achavam irreal e outros de um neolirismo rebuscado e que resvalava para a pieguice. A vida, às vezes, é exatamente assim piegas, mesmo num filme de Carlitos.
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