Londrina completa em dezembro de 2024 seus noventa anos de emancipação política, frise-se que não se trata da sua fundação que foi gestada pelo menos há cem anos, no salão de jogos da casa sede da Fazenda Água do Bugre, em Cambará. Naquele momento foi apresentada, pelos Barbosa Ferraz e pelo Engenheiro Gastão de Mesquita, a grande área de terras devolutas pertencentes ao Estado do Paraná ao prospector de investimentos britânicos Lord Lovat. Londrina foi a porta de entrada e Lovat o seu idealizador, ao organizar a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP).

Nascido em 25 de novembro de 1871, o Major General Simon Joseph Fraser, cognominado pelos escoceses de MacShimidh, possuía os títulos de 14º Lord Lovat e 3º Barão Lovat. Ele era um nobre das Terras Altas da Escócia. Ingressou no Exército Britânico e seguiu carreira no oficialato. Em 1899 criou o “Lovat Scouts”, formada com guardas-caça escoceses, uma unidade com atiradores de elite e que foram as primeiras Forças Especiais britânicas e que lutaram na Guerra dos Bôeres na África do Sul. Foi deputado do Parlamento Britânico, comandou tropas na Primeira Guerra Mundial, foi presidente da Comissão Florestal do Exército e Subsecretário de Estado para Assuntos do Domínio no Gabinete do Primeiro-Ministro. Também era banqueiro, financista, investidor e executivo de diversas companhias, em especial o “Hong Kong and Shangai Bank Corporation” e a “Sudan Cotton Syndicate”, sendo esta última dedicada a produção de algodão no Sudão e no Egito. Lovat veio ao Brasil logo nos primeiros dias de 1924 como membro da “Missão Montagu” que, com a aquiescência do Governo Federal, deveria analisar a situação e as potencialidades do sistema tributário do País, atividades produtivas ou a realidade econômica brasileira de então.

Lord Lovat deixou claro seu interesse, prospectar condições de investimento, de negócios, ligados ao plantio e a exportação de algodão para suprir a indústria têxtil britânica. Deseja conhecer terras que pudessem ser adquiridas por seu grupo de produtores e fomentar a produção dessa commoditie em substituição ao Sudão e Egito onde as condições políticas afetavam a produção algodoeira. Lovat se interessou por três regiões: o vale do Rio São Francisco em Minas Gerais, Jaraguá do Sul em Santa Catarina e o Norte do Paraná entre os Rios Tibagi e Ivai. Minas exigia obras vultuosas para que lá se implantasse um sistema de irrigação semelhante ao egípcio e se construíssem um longa ferrovia ligando a região a malha ferroviária existente; Santa Catarina não possuía um clima perene e constante adequado ao algodão e; o Norte do Paraná possuía terras férteis, clima temperado e recursos hídricos necessários, além de uma ferrovia já projetada até o Rio Paraná e com vistas a atingir Assunção no Paraguai.

Lovat foi recepcionado pelos plantadores de algodão como um verdadeiro salvador da lavoura brasileira, literalmente ele representava a possibilidade de exportação de um novo produto, potencialmente capaz de ficar ao par com o café, para o mercado e a indústria britânicos com bons preços e retorno financeiro. A indústria têxtil brasileira enxergava as pretensões do empresário britânico com a literalidade de uma nuvem de gafanhotos que, do horizonte, airava ameaçadoramente sobre o futuro do seu negócio ante os melhores preços que poderiam ser pagos aos plantadores brasileiros pelos britânicos. O aumento dos custos poderia inviabilizar a indústria nacional. Lovat disse em entrevista que a industrialização do Brasil era inviável e que o futuro do País estava na modernização da agricultura.

A presença britânica no Paraná se fez então através da CTNP e da Ferrovia São Paulo – Paraná, sendo esta uma necessidade logística e uma exigência legal do Brasil para que se aprovassem projetos de colonização daquela magnitude. Os ingleses, como chamados, representaram um modernização capitalista que já fora, de certo modo, sentida em Curitiba quando as introdução da mecanização, do sistema de fábrica, um processo de industrialização no beneficiamento e envaze do mate.

Após um século das suas viagens e tomada de decisões, Lord Lovat é lembrado como o idealizador do Norte do Paraná, novo, modernizado e diverso do Brasil de até então. Ele empresta hoje, com a utilização do seu nome, um certo ar de elegância histórica e glamour que remetem a Belle époque, do início do século XX. Fazem referência a ele logradouros, edifícios comerciais e residência, concessionárias de veículos e uma estação férrea que deu origem a cidade de Mandaguari.

Lord Lovat representou a colonização e exploração do Norte do Paraná segundo moldes capitalistas e administrativos modernos àquele tempo.

Roberto Bondarik, professor titular da Universidade Tecnológica Federal do Paraná - Cornélio Procópio