Duas vezes os vereadores de Londrina, por 16-2 e 17-1 votos, rejeitaram desviar para outras secretarias verbas da Cultura, que faz tempo já é a filha rejeitada, com apenas 0,71% do orçamento municipal e nunca recebendo aumento, só cortes desde sua criação.

Assim, a Secretaria da Cultura só consegue continuar porque, com poucos funcionários, age principalmente através de muitos artistas e produtores do Promic. E o corte na Cultura seria exatamente no Promic, para suprir a Guarda Municipal, a Segurança, como da primeira vez a beneficiada teria sido a Saúde. Como são duas áreas que mexem com muita gente e portanto muitos votos, a intenção pode ter sido apenas criar um factóide eleitoral.

Fez lembrar Esparta, a cidade-Estado grega da Antiguidade, que vivia sob regime de ordem e hierarquia, e Atenas, que preferiu viver não só com o corpo mas também com o espírito.

Atenas era monarquia com seu rei, Esparta era diarquia, com dois reis ao mesmo tempo, serviço militar começando na meninice e poucos poderosos a mandar em tudo mas sempre obedecendo aos reis. Tudo vinha de cima para baixo sem discussão, e todo espartano devia estar pronto a obedecer ordens cegamente em nome da segurança.

Atenas, ao contrário, foi criando jeitos de sua gente falar como queria as coisas públicas, em conselhos de anciãos ou assembleias, com decisões votadas, cada qual com um voto, e isso acabou sendo tão bom que, cinco séculos antes de Cristo, o rei ateniense Clístenes regeu que todos os cidadãos são iguais (desde que homens e chefes de clãs, pois mulheres e os demais não podiam votar). O rei passou a co-governar, obedecendo ao que resolviam ou recomendavam as assembleias.

Atenas se expandiu para o continente e as ilhas, levando esse modelo de governo com o povo, ou democracia, e tanto se fortaleceu que enfrentou invasão da toda poderosa Pérsia, embora depois perdendo guerra para Esparta. Mas, dois milênios depois, pode-se ver que a cidade da cultura e a cidade da segurança tiveram destinos muito diferentes.

Mesmo tão defendida, Esparta foi dominada pelos romanos, saqueada e, mesmo renascida, duraria pouco, ruindo por dentro, vítima de seu próprio sistema. Restaurada há menos de dois séculos, hoje Esparta é cidade com 35 mil moradores a explorar o turismo arqueológico de suas ruínas.

Da Grécia lembramos filosofia, Platão, Sócrates, Aristóteles, além de Heródoto e Hipócrates, pais da História e da Medicina, como também de Atenas herdamos teatro, escultura, pintura, poesia e democracia, cultura enfim. E foi com cultura que os gregos resistiram aos invasores romanos, influenciando tanto Roma a ponto da monarquia romana se tornar república e forjar a chamada civilização greco-romana.

Assim com cultura Atenas chegou ao século 21 como capital da Grécia, um município pequeno mas com população igual a de Londrina e com mais 3 milhões na área metropolitana, um dos pontos turísticos mais visitados do mundo, graças a sua história de cinco milênios e sua densidade cultural. Tomara que Londrina continue preferindo Atenas.

Domingos Pellegrini, escritor