Espaço aberto| Vamos nos matar entre nós!
PUBLICAÇÃO
terça-feira, 16 de março de 2021
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“Nós mesmos somos o nosso pior inimigo. Nada pode destruir a humanidade, mais do que a própria humanidade”. Assim escreveu o Jesuíta Thaillard de Chardain em 1954. A figura deste grande teólogo, científico e literato ronda com maior frequência a minha memória depois do ano de 2020. Para muitos Chardain não passou de ser um herético ou sonhador. O que seus críticos não entenderam é que ele percebia as coisas bem à frente dos eventos e tinha a qualidade de reconhecer que a Alma humana foi feita para entrar em relação.
A pandemia do COVID 19 tem truncado e trincado muitos dos nossos relacionamentos humanos. O mais forte de todos: o respeito. Diariamente podemos observar as mais diversas agressões contra a vida humana; nós não estamos mais dispostos a nos contemplar, a nos admirar e digo mais uma vez: a nos respeitar. Criamos um novo neologismo: “polarização” na verdade muito mais do que uma polarização há uma impossibilidade de respeitar o outro, aquele que é diferente a mim. Vou citar um exemplo dos mais dolorosos e dramáticos da atualidade. Os eventos clandestinos. Na nossa humanidade sempre houve clandestinidade; sempre houve um declarado jogo do truco onde o experto queria sempre ser reconhecido. Hoje diante de tantas mortes e dores, uma seringa vazia sem a vacina, hospitais de campanha que desapareceram, desrespeito para com os processos enfim são sinônimo de clandestinidade a olho nu! A sonegação de impostos, as empresas laranjas e os IR declarados de forma fraudulenta ficaram submergidos diante de “festas” e eventos com mais de seiscentas pessoas em espaços fechados. Tornou-se algo comum saber que há festas clandestinas no meio da pandemia. Alguns dos infratores são levados presos , outros são multados; só que no fundo da consciência moral fica uma pergunta: até onde estes infratores da lei aprenderam a respeitar seus semelhantes?
Carreatas em plena pandemia com mais de seiscentas pessoas, muitas delas sem máscara! Ovacionam e aclamam seus líderes políticos; surge então uma pergunta moralmente uma manifestação a céu aberto no meio de uma pandemia é algo permitido ou clandestino? A consciência moral continua a se perguntar; pois a consciência nunca se cala.
Somos em definitivo nossos piores inimigos. Se tivéssemos respeito pelo outro o auto cuidado seria a maior solução e hoje estaríamos menos nervosos e agressivos diante da caótica situação que vivemos. Nossos irmãos os Gregos de Sócrates e Gorgias de Aristóteles e Platão nos deram uma lição de respeito pelo outro impressionante. O lockdown veio acompanhado do processo de vacinação e no meio da dor sepultaram os seus mortos e conduziram os doentes para espaços melhor higienizados. Se endividaram até mais não poder; mas se um país não se endivida pelas pessoas pelos seres humanos por quem mais vai se endividar? Quando estive em Atenas me senti em Bogotá ou em São Paulo; mas o respeito pelo outro os tornou prontos no auxílio e na valorização da situação. Assim os chilenos e os portugueses.
Vale a pena nos perguntamos o que acontece conosco é uma pergunta que a consciência moral também se faz. Quanto desrespeito da nossa parte, quanta falta de humanidade! Seria um caminho contra todos os vírus a humanização tornar o outro nosso “amigo” aquele que merece toda a nossa consideração e respeito. Pelo jeito vamos nos matar entre nós e com profunda dor veremos sucumbir uma espécie feita a imagem e semelhança do seu Criador que plantou nas suas entranhas o movimento mais belo de ir ao encontro dos outros e de chamá-los irmãos e irmãs.
Vale a pena lembrar de ti caro Theillard de Chardain ainda que sejas chamando de sonhador um dia talvez voltaremos a nos respeitar. E a nos chamar meu irmão e minha irmã.
Padre José Rafael Solano Durán é sacerdote da Arquidiocese de Londrina.
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