365 dias de escuridão, sofrimento e morte na Ucrânia. Um ano de angústia constante, para mães, esposas e filhos de soldados em campo de batalha. 12 meses de apreensão para um mundo que sente a guerra no supermercado e postos de gasolina e não sabe o que esperar e quando vai terminar! A chamada Guerra da Ucrânia, por infelicidade, não lhe pertence mais! É um conflito globalizado, na pior dimensão do termo!

O papa Francisco não passou uma semana sem implorar preces pela paz e conclamar os envolvidos a pararem o absurdo desta tragédia! Ouvidos moucos! A Rússia até hoje se recusa a receber Francisco e, como sabemos, o Patriarca de Moscou, também de forma pouco evangélica, apoia Putin neste mórbido empreendimento.

Esta guerra, como todas as outras sem exceção, não obedece a nenhuma lógica e a teia de interesses que a envolve, não é tão clarividente como parece. Daí, que as possíveis soluções estejam envolvidas em denso e perigoso nevoeiro. Acertaria Shakespeare em Hamlet, sobre a resolução deste imbróglio fatídico e fraticida, ao apontar que “há mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar a sua vã filosofia”.

É fato que a Rússia invadiu um país soberano. É pacífico que per si, este acontecimento mereça condenação global e da própria ONU, criada em primeira mão para intervir nestas situações. Mas não foi isso que vimos. O artigo 24 da Carta da ONU define que ao Conselho de Segurança é reservada a “a principal responsabilidade de manutenção da paz e da segurança internacional”. Contudo, os cinco membros permanentes, EUA, China, Reino Unido, França e Rússia, podem exercer seu direito de vetá-las, impedindo que essa resolução siga em frente. Ora, não tem, portanto, condenação peremptória que saia de uma reunião com estes membros! A China tem-se reservado um papel de observador estratégico, com uma grande possibilidade de também injetar armamento no conflito. No momento, já baba na fila da frente, pelo espólio do desfecho! A geopolítica mundial pós-2023 colocará o país do sol nascente como um dos grandes protagonistas em termos econômicos e militares! E a China estará “investindo” na reconstrução da Ucrânia! Um pé chinês num ponto estratégico da Europa! Aliás, bom lembrar, que até agora não chamou a ação russa de invasão, nem votou favoravelmente à resolução da ONU que pede a retirada imediata e incondicional da Rússia!

Por seu lado, Putin tem as suas razões, ou sabe usar os fatos a seu favor! A Otan chegou às portas de Moscou e quer avançar mais um pouco. Mesmo que a guerra fria seja vespeiro de décadas passadas, continua um fantasma no século XXI! Para o autocrata, nostálgico com as glórias da era soviética, ou quem sabe dos czares, isso é inconcebível! O Ocidente alimentou um Putin que se mostra agora fora de controle! Se recua na guerra, sua cabeça fica internamente a prêmio, se avança, a derrota não será só da Ucrânia. Uma sinuca. Uma encrenca, diríamos nós! Os EUA e a Europa não podem abandonar Zelensky, por motivos óbvios. Contudo, a sua ajuda inflama o belicismo dos dois lados. À Rússia não resta se não sair vitoriosa! Aos pacificadores, compete-lhes descobrir qual seria essa “vitória”, sem que a Ucrânia saísse humilhada, para que o barulho e a destruição dos misseis desse lugar à paz.

Não julguemos, porém, que existem guerras “mais fáceis”! Meu avô sempre diza que a desgraça de um conflito, estava na ausência completa de lógica, mesmo que aparentemente as razões fossem as mais justas! Para interrompê-la, não bastarão salões nobres e reuniões regadas a champanhe! Alguém perderá! Aliás, já todos perderam! Vidas que não voltarão, lágrimas que escorreram e 600 bilhões dólares para reconstrução.

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese de Londrina