Bolsonaro enfim conseguiu: as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas por seus apoiadores na tresloucada tentativa de mobilizar as Forças Armadas para depor o presidente Lula em seu oitavo dia de governo. E repor Bolsonaro no poder.

O ex-presidente é o autor intelectual dos crimes praticados pela turba ensandecida, movida a fake news e teorias da conspiração disseminadas por ele a partir de 2018, quando venceu a disputa pelo Planalto e, mesmo assim, acusou a Justiça Eleitoral de ter fraudado a eleição. Sua artilharia desde então contra o sistema eleitoral tem sido contínua, variando de intensidade ao sabor das circunstâncias.

Seu capital político se esvaiu depois da derrota para o petista – que ele e seus seguidores não reconhecem -, sua fuga melancólica para os Estados Unidos na véspera de encerrar o mandato o deteriorou ainda mais e o que restou desse patrimônio foi severamente corroído depois do “Capitólio tupiniquim”.

Dois indicadores atestam o quanto ele se desgastou: sua popularidade nas redes sociais despencou para 10% do que tinha no início do governo e a tentativa de golpe de Estado, segundo o Datafolha, foi desaprovada por 93% dos entrevistados. Mais da metade dos consultados (53%) responsabilizou Bolsonaro pelo episódio.

Se na frente política Bolsonaro se transformou num espantalho (o que leva a esperar que o Partido Liberal desista de pagar-lhe um polpudo salário para “liderar” a oposição a Lula), sua situação jurídica tornou-se dramática. E foi agravada 1) com a descoberta, na casa de seu ex-ministro da Justiça Anderson Torres, do rascunho da intervenção no Tribunal Superior Eleitoral após a vitória de Lula e 2) com a reiteração, por meio de uma postagem em rede social, quatro dias depois da tentativa de golpe de Estado, da acusação de que a Justiça Eleitoral manipulou o resultado das urnas em favor de seu adversário.

Se o TSE e o Supremo Tribunal Federal já dispunham de elementos de sobra para declarar sua inelegibilidade e condená-lo, entre outros crimes, por atentar contra o Estado Democrático de Direito, têm em mãos agora de provas contundentes. E a gravidade da tentativa de golpe de Estado clama pela urgência de suas decisões.

Bolsonaro plagiou seu mentor Donald Trump na incitação contra o sistema eleitoral e manipulação da turba ignara de seus respectivos seguidores (os trumpistas, no entanto, sequer cogitaram invadir a Suprema Corte e a Casa Branca). E também o imitou na tentativa de acobertar sua responsabilidade, dissimulando, por meio de mensagens e gestos dúbios, os comandos para a ruptura institucional.

Trump foi denunciado há um mês pelo Congresso ao Departamento de Justiça por incitar à insurreição, obstruir procedimento oficial, conspirar para fraudar o governo e mentir. Bolsonaro, que cometeu estes e outros crimes (que o diga a CPI da Pandemia, por exemplo), está apenas iniciando o caminho das pedras que o conduzirá ao cemitério político.

Uma das frases pichadas pelos invasores do STF foi “perdel, mané”. Era uma ironia à famosa resposta do ministro Luiz Barroso a um exaltado bolsonarista em Nova York (“perdeu, mané!”), registrada com a deficiência ortográfica que caracteriza as mensagens bolsonaristas nas redes sociais.

A frase se encaixa perfeitamente ao ex-presidente, que recorreu à violência por meio de seus seguidores para voltar ao poder e dele se afastou provavelmente para todo o sempre. “Perdel", Bolsonaro!

José Antonio Pedriali, jornalista e escritor

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