Acordamos hoje incrédulos com a notícia da morte de 4 crianças, atropeladasno distrito de São Luiz, ao sul de Londrina, na noite de quinta-feira, 14, uma tragédia que ficará marcada na história londrinense. Cinco crianças voltavam a pé da escola ao final da tarde quando foram atropeladas. Quatro delas morreram. Todos nós, tanto da Associação Mobilidade Ativa Londrina, como da comunidade que luta por políticas públicas voltadas aos pedestres e ciclistas, da qual nascemos e fazemos parte, lamentamos e sofremos com o ocorrido, e oferecemos nossos sinceros sentimentos às famílias e amigos.

A sociedade, obviamente, lamenta esse fato terrível, todos ficam estarrecidos com tamanha tragédia. São quatro jovens vidas ceifadas, famílias despedaçadas, amigos, familiares, e comunidade escolar que vivem um trauma inexplicável em palavras. Perguntas que fazemos à sociedade: até quando aceitaremos que isso ocorra sabendo que existe solução para mortes no trânsito? Sabendo que existe solução, por que somos omissos? Por que não encaramos esse problema com a devida seriedade?!

Toda morte no trânsito é evitável, basta querermos resolver o problema. Todos que sentiram algo ao ouvir a trágica notícia podem ter buscado culpados. A mídia, com razão, busca respostas ao noticiar o ocorrido: verifica-se que o motorista não estava embriagado; o policial do momento colhe depoimento do motorista que diz foi ofuscado pelo sol; aponta-se que as crianças caminhavam na rua pela ausência de calçadas em condições trafegáveis e presença de barro ao lado da via.

Atribui-se, portanto, um conjunto de infelizes eventos que resultaram nessa “fatalidade”, que ocorre todos os dias com mais ou menos intensidade em cidades do mundo todo. Por que, então, é incorreto atribuir esse evento à um infortúnio do destino? Porque o resultado desses eventos tem como razão a inação e falta de atitude do poder público em projetar e construir nossas ruas de maneira segura.

Por que permitimos que automóveis reinem sobre as ruas? Sim, permitimos que motoristas tenham a liberdade física de dirigirem irresponsavelmente ao não desenhar as ruas de maneira segura. Por que é dedicado tanto espaço de circulação ao automóvel, tanto conforto de condução, e em nome de quê? Velocidade? Liberdade?

Hoje quatro crianças perderam seu futuro pelo resultado de uma via desenhada para o conforto do motorista, fruto de uma cultura carrocêntrica que aceitamos como normal. Já passou da hora de pararmos de ser negligentes enquanto sociedade e cobrar das autoridades e daqueles que nos representam politicamente que tomem atitude e encarem esse problema em sua raiz, o autocentrismo, a cidade projetada para o deslocamento de automóveis e não de pessoas!

A Holanda percebeu isso na década de 70, quando em 1971, 3.300 pessoas morreram em consequências de sinistros automobilísticos. Cerca de quinhentas crianças foram atropeladas naquele ano e inicia-se o famoso movimento “Stop de Kindermoord!” (Parem com o assassinato de crianças!).

Portanto, parem de querer justificar mortes no trânsito apontando infortúnios e eventualidades, bem como simplificar apontando a culpa somente aos motoristas. Parem com a hipocrisia de almejar zero mortes no trânsito mas implementar ações pouco ou nada eficientes de prevenção de “acidentes” no trânsito, ao invés de combater a raiz do problema.

A academia já sabe e as cidades que implantaram sistemas seguros já comprovaram: a maneira de eliminarmos as mortes no trânsito é projetar vias como sistemas seguros, priorizar infraestruturas de qualidade para pedestres e ciclistas, reduzir a dependência dos automóveis, oferecer alternativas sustentáveis de deslocamento, fiscalizar, educar e punir rigorosamente aqueles que decidirem colocar em risco a vida de outrem ao conduzir seu automóvel.

Queremos novamente manifestar nossos sinceros sentimentos às famílias e amigos de Kelly Gonçalves Maximo da Silva, Kemelly Gonçalves da Silva, Adrian Moraes Bueno e Vinicius Moraes Bueno. Queremos também reafirmar nosso compromisso em exigir do poder público políticas, projetos e ações eficientes e eficazes a favor da segurança viária e de uma mobilidade segura para todos.

São os votos dos representantes da Associação Mobilidade Ativa Londrina. Camila Tabosa Vasconcelos, coordenadora geral; Aluísio Silva Júnior, coordenador de projetos; Rodrigo Lourenço Aristides; coordenação jurídica; Luiz Afonso Ribas Haikal Giglio, coordenador administrativo; e os conselheiros de mobilidade, Conrado Braga Zagabria, Camila Silva de Oliveira, Raiane Vecchia de Camargo e Danaê Fernandes.

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