“A companhia inglesa de Estrada de Ferro instalou um patrimônio denominado Três Boccas a vinte e sete quilômetros da Villa de Jatahy”. Relatou um Comissário de Terras. Descrevia o desenvolvimento do Norte do Paraná por volta de 1930.

O Patrimônio Três Boccas foi projetado. Era “sede de núcleo colonial”. Uma futura povoação, segundo o Decreto de Colonização (PR, 1907). Exigência do Governo para a organização de terras de concessão.

Mapas falam. Novas evidências, resgatadas através da reinterpretação de plantas e mapas, confirmam a versão da existência de um projeto. Contestam as narrativas anteriores sobre o improviso e precariedade do Patrimônio Três Boccas. Sempre visto como simples “acampamento inicial”.

Nos estudos do empreendimento da CTNP é preciso confrontar e considerar: os “Novos Limites” de terras de concessão, o Decreto de Concessão da Companhia Ferroviária São Paulo Paraná - CFSPP (1928); os Decretos de Colonização (1907) e Plantas Iniciais da CTNP. Não só os depoimentos de pioneiros, dirigentes da Companhia de Colonização e publicações oficiais (Yamaki, 2017).

A primeira questão a ser analisada é o “Novo Limite” das Terras CTNP. Essa linha demarcava a faixa de terras da concessão Alexandre Beltrão. Havia sido anexada à CTNP em 1927. Por isso a denominação Novo. Uma linha Norte Sul que, partindo do espigão Aboboras e Jacutinga segue até o ribeirão da Limoeira.

A experiente firma inglesa Macdonald & Gibbs Co. engineers desenvolveu o projeto da ferrovia. Fez o levantamento topográfico com curvas de dez em dez metros numa faixa mínima de oitenta metros de cada lado, entre Cambará e a Serra de Apucarana. Projetou obedecendo a declividade máxima de 2% e curvas de raio mínimo de cento e cinqüenta metros. Identificou “altos” para implantação de patrimônios, além de nascentes, ribeirões e terras devolutas. Projetou a localização de paradas e estações. Obedecia a cláusulas do Decreto de Concessão da Ferrovia CFSPP (1928) e Decreto de Colonização (1907).

Já dentro do empreendimento da CTNP, planeja duas estações. Distantes hum quilômetro uma da outra. Localizadas em retas planas. Uma em frente ao Patrimônio Três Boccas e outra na frente do “alto”de cota 600 m. Aqui seria implantada Londrina. A ferrovia definiu a localização do Patrimônio Três Boccas e a posterior Londrina.

Voltando à Planta Geral da CFSPP (1928-32). A estrada de autos (antiga picada) e a ferrovia entrecruzam nos quilômetros 22 e 207,3, respectivamente. A análise do relevo deste trecho mostra que havia possibilidade de ajustes. Assim, podemos deduzir que, o encontro da antiga picada e a ferrovia foi um “cruzamento projetado”. Ali ficava o inicio da reta plana da estação e o caminho de acesso ao Patrimônio Três Boccas.

O Patrimônio tinha planta retangular. A face leste é o “Novo Limite” das terras da CTNP. O caminho de acesso a partir da ferrovia e estrada de autos chegava num estratégico platô. Ali está indicado o Hotel e outra construção, ainda sem identificação. Seria o futuro Escritório da Companhia. Um córrego nasce ao lado. As águas brotam até hoje. Dali do platô era possível contemplar o vale do ribeirão das Pedras. O longo declive vence cinqüenta metros de desnível. Explica o fato das imagens pioneiras do Patrimônio apresentarem sempre um terreno íngreme.

Nas plantas subseqüentes da CTNP, as curvas de nível não são representadas. Todavia, reproduzem os limites e acessos do Patrimônio Três Boccas do projeto ferroviário.

Finalizando. Reafirmamos que o Patrimônio Três Boccas tinha um projeto. Apontamos para a importância e necessidade de preservar os limites e vistas desse lugar pioneiro. Contemplar horizontes.

Humberto Yamaki, coordenador do LabPaisagem UEL

Os artigos, cartas e comentários publicados não refletem, necessariamente, a opinião da Folha de Londrina, que os reproduz em exercício da sua atividade jornalística e diante da liberdade de expressão e comunicação que lhes são inerentes.

COMO PARTICIPAR| Os artigos devem conter dados do autor e ter no máximo 3.800 caracteres e no mínimo 1.500 caracteres. As cartas devem ter no máximo 700 caracteres e vir acompanhadas de nome completo, RG, endereço, cidade, telefone e profissão ou ocupação.| As opiniões poderão ser resumidas pelo jornal. | ENVIE PARA [email protected]