Confesso não ser autor do título (copiei Juca Kifouri no UOL) mas, por considerá-lo fabuloso, tomo-o de empréstimo ao tempo em que reconheço a genialidade do desenho que a expressão convola, naquilo que celebro (com todas as forças) a grande virada que a eleição presidencial em França descortinou.

No ponto, lembro que a extrema direita emergiu vitoriosa em um primeiro turno do pleito eleitoral francês outro dia para, no segundo turno (07/07/2024), tornar ao esgoto da história (de onde não deveria jamais ter saído), naquilo que foi vencida pela união das esquerdas francesas, capitaneadas por Jean-Luc Mélenchon.

Mélenchon é um franco-marroquino que faz história na vida política francesa e, no segundo turno sagrou-se vitorioso em sua coalizão contra a ignomínia fascista de Marianne le Pen e demais comorbidades sociopáticas que infectam a vida política nos dias de hoje.

Emblemático que a guinada no pleito eletivo francês tenha se convolado nas condições em que se deu e sob as luzes de Paris, naquilo que a história registra feitos pretéritos grandiosos dos franceses, na salvaguarda da liberdade.

Até por isso não pretendo chover no molhado tratando o tema. Aqui e agora quero e vou falar da extraordinária participação do astro futebolista Kylian Mbappé em defesa da liberdade dos franceses.

Mbappé é dos maiores (senão o maior) jogador de futebol em atividade nos dias de hoje. Acabou de firmar contrato com o Real Madrid e vem, há tempos, protagonizando a seleção francesa que, nos dois últimos mundiais, sagrou-se campeã (2018) e vice (2022). Nas duas finalíssimas Mbappé marcou cinco gols – quem, na história do futebol, contabiliza cinco gols em duas finais de Copa?

Mais que isso, Mbappé protagoniza uma geração de grandioso talento que se notabiliza, tanto quanto pelo engajamento e apego às causas sociais, contribuindo notavelmente para a disseminação de um modo de vida mais inclusivo (ou menos exclusivo) onde a tônica do convívio é o respeito e a aceitação das diferenças, em lugar de sua exploração.

Ao se levantar e dialogar com a juventude (principalmente) francesa, o jovem atacante fez o maior gol de sua época, naquilo que conclamou um país a enfrentar o fascismo nas urnas. Fê-lo sem qualquer intenção outra que não a defesa da própria história, alinhando-se às grandes personagens do passado em seu combate ao mal.

Não haveria de ser diferente, naquilo que a extrema direita em França conjurou um programa de governo em benefício da elite branca – com outdoors espelhando essa maledicência.

Deveras, um programa de governo que segregacione pessoas, estabelecendo uma escala de valores (brancos em lugar de negros, nascidos em França em lugar de imigrantes) não é uma opção política e sim uma diarreia fascista, das que o mundo já enfrentou e, acreditava eu, vencera.

Sim, no passado já enfrentamos e vencemos o fascismo. Foi assim em Espanha (expurgando o generalíssimo Franco), em Itália (com a derrocada de Mussolini), em Portugal (vade retro Salazar), Alemanha (Hitler...) e, por aqui, ao sul da América, com a derrocada dos generais tiranos que estabeleceram sangrentas ditaduras.

A toda evidência, o passado bate à porta da humanidade e volta incomodar, realinhando um sentimento ilhado que acreditava morto e amordaçado, ao investir contra as minorias, estabelecendo parâmetros e prumos que alimentam um conceito supremacista – em favor dos brancos.

Quem baliza esse malefício odioso é, mais uma vez, a crise neoliberal, naquilo que o fascismo não é senão um espaço de manobra do grande capital, que se apresenta quando há uma cizânia no seio do capitalismo – em dias de recursos escassos o capital escala o medo que aprisiona.

Não por acaso os pilgrins, com o pato Donald, venderam a ideia de erguer um muro que separasse tion san e seus herdeiros ideológicos do México, ressuscitando a doutrina monroe (a américa para os americanos) no que seria a mais severa das antinomias do próprio sonho americano, identificado no estado de bem-estar social (welfare state), negado no sentimento supremacista que os do norte vem desenvolvendo há tempos.

Deveras, a humanidade paga um preço muito alto pelo desconhecimento histórico, naquilo que não seria de se conceber qualquer arranjo temático que alinhe políticas de exclusão, com ênfase em estereótipos e em circunstâncias regionais de fomento cultural.

Manja aquela canção dos Beatles, onde John Lennon poetizou ‘imagine there’s no heaven’? Então, é sobre isso.

Não há qualquer ganho civilizatório no implemento de ideologias que contraponham pessoas por sua classe social (ricos e pobres), por sua cor (brancos e pretos, vermelhos e amarelos), sua orientação sexual (héteros e homo), seu gênero (masculino e feminino), sua religião...

O mundo e a vida não são senão a somatória de inúmeras diferenças que compõe um vasto multiverso, e essa é nossa maior riqueza.

Valeu Mbappé. A democracia o saúda.

Saudade Pai...

João dos Santos Gomes Filho, advogado