“A”, de abelha… “E”, de elefante… “J”, de jacaré…

Elegemos datas comemorativas para lembrarmos de uma causa ou para o reconhecimento de algo que nós, sociedade, suspeitamos estarmos em débito. Embora alguns pets façam parte de inúmeros lares, ainda assim nos desinteressamos pela condição dos animais não-domésticos.

Já temos feito avanços em nossa cidade, como a Lei municipal 13.581, que proíbe animais presos em correntes ou similares. Outras cidades já têm feito algo semelhante, mas estamos longe de decisões em nível federal.

Quiçá mundial.

Porém, a consciência ética se desenvolve através do esforço em tornar-se íntimo da sensibilidade de toda a ordem de viventes. Ações como essa podem desenrolar-se numa significativa revolução moral no trato entre os próprios humanos.

Cada vez mais estudiosos investigam a relação humano-animal. Aqui em Londrina, a filósofa Camila Dutra Pereira trata do assunto no livro "A libertação animal em Peter Singer à luz das críticas da Teoria de Direitos de Tom Regan" (2024), no qual pondera quais ações morais respeitam os interesses das espécies afetadas.

Desde os anos 70, o filósofo Peter Singer nos chama a atenção para esse fato em suas obras. Em "Ética prática" (1979), Singer conceitua o especismo da seguinte forma: quando há conflito entre os nossos interesses e os interesses dos de outras espécies, atribuímos maior peso aos nossos.

Devemos adotar duas medidas: primeiro, repensar nossas reais necessidades nutricionais; fazer o exercício mental de identificar a procedência disso que nos chega à mesa; segundo, olhar o contexto climático-ambiental em que vivemos.

Qual foi a última vez que você viu um animal para além de cachorro, gato, papagaio?

A presente geração tem sido alfabetizada através de figuras de animais que talvez nunca vejam de verdade. Uma abelha, mata! Pior, nosso contato com outras formas de vida é tão negligente que crianças, e mesmo adolescentes, não se dão conta que a proteína animal comprada no mercado provém da carne de um ser vivo.

Custa a nós, “adultos”, superar esse nível de inconsequência.

Precisamos recuperar a sensibilidade e ver uma abelha, por exemplo, e pensar “uau, uma abelha!”, e não: “não mate a abelha! Precisamos dela para ter mel!” É necessário fazer a coisa certa pelo motivo certo, mesmo quando “ninguém está olhando” — para usar as palavras de Mário Sérgio Cortella.

Alguém muito importante sempre está olhando.

Você.

Está claro que as mudanças climáticas se devem à combinação de fatores. Um deles considera a apropriação inadvertida que fazemos dos recursos naturais para manter animais de abate. Convém nos determos sobre essa pauta voluntariamente, antes que sejamos obrigados, devido à urgência, a não falar de outra coisa.

A tecnologia de produção já nos possibilita saúde alimentar sem proteína animal a custo acessível; essa economia energética no meio-ambiente pode evitar sofrimento incalculável e fazer do mundo um lugar melhor. Assim, podemos fazer uso adequado de nossa poderosa engenharia de produção — sem sofrimento animal.

Do contrário, instrumentalizamos a vida animal por conveniência.

Sem querer querendo.

Se reduzirmos o dano de nossas ações ao meio, a reação do meio será menos agressiva. Se funciona com um vizinho difícil, funciona com a natureza. Não devemos ser mais conscientes sobre a produção e o consumo apenas porque interfere negativamente no meio-ambiente, mas, sobretudo, por respeito às várias formas de vida.

Respeitar o direito de vida é expressão genuína de amor. Quem sabe se a adoção desse nível de gentileza com os viventes não altere também nosso clima social — para melhor.

Douglas Giovani Ezequiel, mestrando em filosofia pela Universidade Estadual de Londrina.