Ambiente em retratos

Reginaldo José da Silva
  O desatino de mensurar o imensurável. É tanto capitalismo que até mesmo o maior de todos os milagres - o milagre da vida - é representado em meros números. Preferencialmente, seguidos do símbolo das cifras. Tanta vida, tanta biodiversidade, nada escapa dessa máxima. Mas basta um sentimento para nos mostrar a medida do tamanho desse erro.
  A preservação ambiental fundamentada apenas nos benefícios econômicos - medicamentos e patentes gerados pela biodiversidade - é um pensamento, no todo, ultrapassado. Mas persiste como uma verdade pétrea para muitos, de forma que os números se tornam muitas vezes mais importantes do que aquilo que eles representam. Assim, tanto danos quanto benefícios ambientais são meramente reduzidos a números. Custo final das mudanças climáticas: entre 5% e 20% do PIB mundial a cada ano. Tráfico de animais silvestres: 12 milhões de espécimes e R$ 3 bilhões a cada ano no Brasil, para este que é o terceiro maior comércio ilegal do planeta.
  É verdade que o número daqueles que compartilham da mesma visão da empresa aérea que - em plena maior tragédia da aviação brasileira - reafirmou como o primeiro de seus objetivos que ‘‘nada substitui o lucro’’, é maior do que pensamos. Soma-se a isso o consumismo nosso de cada dia. Um exemplo evidente disso está no maior sonho de consumo da maioria dos homens que, não raro, desejam muito mais ter um automóvel que a casa própria. Este símbolo de status e poder parece tão imbatível quanto suas conseqüências. O WWF (Fundo Mundial para Vida Selvagem) em relatório recente alerta: o consumismo é a maior ameaça à humanidade, ao ambiente e à biodiversidade. Mais uma vez a divulgação da ‘‘lista vermelha’’ das espécies ameaçadas de extinção apresentou aumento no número destas espécies ameaçadas. Mas estas 16.306 espécies estão em um universo de pouco mais de 41 mil monitoradas, dentre um milhão e setecentas mil catalogadas.
  Na primeira semana de agosto houve uma triste despedida. O golfinho branco, chamado de Baiji, foi oficialmente declarado extinto. Baiji era a princesa que por recusar o pretendente foi afogada pelo pai nas águas do mais longo rio chinês. Foi-se a princesa, ‘‘nasceu’’ naquelas águas um balé lindo e encantador: o golfinho branco. Considerando a estimativa de que haja entre cinco e trinta milhões de espécies no planeta, 75 delas dizem adeus diariamente. Desde Baiji, outras três mil espécies se foram.
  Infelizmente, a mídia despreza ‘‘esses valores’’. Como fez com o protesto do último dia 22, ‘‘Um dia mundial sem carro’’. Assim caminha a humanidade: Deus no céu, o Diabo no inferno e o dinheiro na Terra. Neste contexto, a saudade ocupa um lugar que o dinheiro não alcança. Desta forma, a cada despedida nos resta lembrar o artista: ‘‘Quando a saudade dói, eu ‘compro’ (?) um retrato dele e fico olhando pra ele, saudade é dor que me corrói’’.
REGINALDO JOSÉ DA SILVA é biólogo e Policial Militar em Londrina


A natureza já não se defende. Vinga-se!

Jacir Venturi
  Um dos maiores paradoxos atuais da humanidade é zelarmos tanto pela saúde e bem-estar de nossos filhos e pouco nos importarmos com a qualidade de vida daqui a 30 ou 50 anos. ‘‘A terra não nos pertence. Ela foi emprestada de nossos filhos’’, advertia um cacique indígena americano, há mais de um século. Ademais, torna-se insensato e irônico: nós, humanos, que nos proclamamos inteligentes, somos os únicos - os únicos - a promover o desequilíbrio natural.
  Existe uma relação direta entre as agressões ao ambiente e os cataclismos provocados pela natureza injuriada. Conforme estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU), o aquecimento global tem provocado, a cada ano, 150 mil mortes e prejuízos de 70 bilhões de dólares. Em relação a 2005, a ONU também catalogou 360 desastres ambientais, dos quais 259 foram creditados à elevação da temperatura na Terra. O agravamento foi de 20% sobre o ano anterior.
  A Mãe Natureza é, a um só tempo, primitiva e nobre ao agir. É agradecida com quem a trata bem, além de ser espontaneamente dadivosa, bela e vivificante. Porém, pedagógica, ou sabe ser vingativa aos 6,5 bilhões de terráqueos: ‘‘Se alterarem o equilíbrio natural, eu os arruíno’’ - diria ela. ‘‘A sobrevivência de toda humanidade está em perigo. É o momento de sermos lúcidos. De reconhecer que chegamos ao limite do irreversível, do irreparável’’, adverte o Comunicado de Paris, assinado por representantes de 40 países, reunidos em fevereiro deste ano.
  Não há mais o benefício da dúvida. O ser humano é o principal indutor do efeito estufa, de furacões, tufões, secas, inundações, incêndios. De fato, a Terra lança gritos agônicos por meio dos quais clama por uma atitude não apenas compassiva, mas também pró-ativa. Não basta que haja uma consciência ambiental. Não basta condoer-se com a morte dos ursos polares. A bem da verdade, o planeta será salvo não apenas pelos governos ou ONGs nem pela nossa compaixão, mas pelas ações concretas de cada ser humano.
  É preciso agir. Mesmo fazendo pouco, como o fabulativo beija-flor: ‘‘Era verão e o fogo crepitava feroz na floresta. Sobressaltados, os animais se dividiram. Alguns fugiram para o grande rio que permeava a floresta; outros se puseram a debelar o incêndio. Um beija-flor, nas suas idas e vindas, apanhava uma minúscula porção de água e a arremessava sobre as chamas. O obeso elefante, mergulhado no rio para proteger-se do fogo, perguntou ao beija-flor:
  - Meu pequeno pássaro, que fazes? Não vês que de nada serve a tua ajuda?
  - Sim, respondeu o beija-flor, mas o importante para mim é que estou fazendo minha parte!’’.
JACIR VENTURI é diretor de escola e diretor do Sindicato das Escolas Particulares do Paraná (Sinepe-PR) em Curitiba

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