Imagem ilustrativa da imagem ESPAÇO ABERTO - Um tempo marcante
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Que sonhos...Que esperanças...Que utopias podemos alimentar para 2022 !

Para fazer essas projeções necessitamos pensar e rever se ainda existem sonhos, ainda existem esperanças, utopias, se os 2020 e 21 da forma com se apresentaram não apagou, não riscou para sempre essas dimensões. Talvez nosso olhar sobre estes anos esteja condicionado por uma marca angustiante, desafiante, desencantadora. Um olhar, com a impressão de que as luzes se apagaram e a escuridão se instalou.

Nessa dimensão desencantadora o tempo passou e nada mudou, nada mudou! Mas se mudou o que mudou! Naquilo que quero acreditar ou no que mudou de fato em nossas externalidades. Como então estabelecemos as relações com nossas interioridades, com nossas subjetividades, com as objetividades que vivo, e respiro.

Nesse ambiente de encontros e desencontros, nos encontramos, diante de um tempo final de pandemia que assolou o mundo todo. Os números negativos são impressionantes, não param de crescer, são preocupantes. Nossa apreensão de mundo se encontra delimitada até a chegada da notícia de quem fazia parte deste mundo, e já não está conosco. Como uma peça de um quebra cabeças que não existe mais e que não irá compor a mesmas imagens, as mesmas emoções, as mesmas amizades. Mas o inverno tenebroso parece findar. Agora os desafios estão postos, de refazer a vida, com novos ensaios, novas imagens com as peças que temos em mãos e com as condições que restaram em nosso espírito.

Mãos trêmulas, olhares míopes, dúvidas nos cercam, pois a primavera ainda não chegou. É o que temos no momento, o corpo calejado, juntando os pedaços, equilibrando a mente em seu componente cerebral, imaginativo e criativo para estimular dimensões adormecidas. Se nada ficou em nossa experiência humana nesse único e incalculável experimento que passamos, talvez porque tenhamos adormecido numa caverna junto à hibernação dos ursos. Se escondermos a dor que vivemos, nada vivemos, talvez a incerteza vivenciada nos fortaleça para o amanhã, ou nos acovarda diante do futuro.

Acredito no fortalecimento, mesmo diante da escuridão e das incertezas, pois quer queiramos, quer não, temos que continuar, prosseguir, experimentar o nosso melhor, daquilo que sabemos pensar, sabemos fazer, sabemos viver. Talvez esse pensar, esse fazer, esse viver seja traçado com maior profundidade, equilíbrio, aberto as novas concepções que estão emergindo.

Talvez, num primeiro momento, não conseguiremos identificar essas novas concepções, pois delas nada conhecemos nada sabemos. Se soubermos, elas não são novas, são apenas feições reais encobertas pela película do novo. E estas têm força de apresentar-se com realidade ilusória que nos envolve, nos atrai, nos contamina, nos engana. Talvez tarde seja, porém ainda a tempo de superar esta falha compreensiva, pela aparência do engodo repetitivo de uma derme enfeitiçada pela tonalidade do banho de sol que não tomamos.

Nesse ambiente há possibilidades de dimensões esperançosas?

Penso que sim. Porém será laboriosa essa reconstrução, pois velhos materiais empoeirados estão aí postos como os únicos para a edificação. Necessitamos definir, no caminhar, estes novos materiais, formatos e dispensar materiais e formatos antigos para utilizar materiais novos e criar e inovar outros tantos. Assim podemos, assim caminhamos, sem um destino definido, porém, com experiências da condição humana que nos conduziu até aqui definidas pela razão, agora acompanhada pela sensibilidade de um coração que sangra, mas com uma alma esperançosa e confiante que é marca de nossa espécie.

Paulo Bassani é sociólogo e professor universitário