“É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino do céu” (Mateus 19,24). Se o dinheiro não pode ser dividido, e eu tenho uma porção maior, então devo ter me apropriado de alguma quantia de alguém. Ou seja, os ricos deveriam se sacrificar pelas vantagens que tiveram e, de forma caridosa, teriam que prover aqueles que conseguiram menos.

Até parece que Jesus leu Karl Marx antes dele escrever seus manuscritos, ou pelo menos Mateus leu ou era algum tipo de Nostradamus, médico vidente francês, que nasceu três anos depois do Brasil ser descoberto e tinha fama de grande visionário. Mas não deve ser bem assim. O responsável por essa parábola, citada de várias maneiras em algumas religiões, deveria estar dizendo que a frase assustadora seria de exagero deliberado, com a intenção de causar um efeito de retórica. Ou seja, um indivíduo cheio de dinheiro dificilmente percebe seus erros, suas fraquezas, suas loucuras com a mesma facilidade que um pobre. Isso deixaria sua salvação, se ela existir, mais difícil do que aquele que sofre pela falta do essencial.

Veja, hoje, o problema existencial de Vladmir Putin. Ou melhor pegando um dos nossos, Luís Inácio, que era pobre na infância e preferiu, na idade adulta, escolher o caminho do inferno.

Se olharmos literalmente a revista americana Forbes, de negócios e economia, veremos que apresenta há 105 anos a lista dos mais ricos, ou seja, de quem vai poder ir para o inferno e, também, a inveja da maioria que está a caminho da salvação. Como seria comovente, a frase de alguns filósofos: “As pessoas são ricas e pobres de acordo com o que elas são e não de acordo com o que elas têm” Políticos, esses gozadores, falam muito isso.

Elberth Hubbard citou uma vez: É difícil saber o que gera a felicidade: pobreza e riqueza, falharam nisso. Mas, os gregos, mais trágicos, como Eurípides falavam: “Há uma espécie de pobreza espiritual na riqueza que a torna semelhante a mais negra miséria" (acho que nem sempre). Conjecturando, dentro dos muros do Brasil, país onde não se tem camelos, qual dos nossos líderes tem a preocupação de pensar nos pobres antes de pensar no próprio bolso? Até os religiosos, daqui, estão quase sempre mais preocupados com o dízimo do que com as almas. Fato fácil de ser provado assistindo na TV qualquer programa religioso que passa na nossa grade todos os dias, manhãs e tardes. A frase mais citada “É dando que se recebe” e por aí vai nosso aprendizado ou indignação.

Esses fatos não começaram neste século. Isso decorre desde o descobrimento do Brasil. Poucos fazem doações para pesquisas, para grandes doenças ou propriamente ajudando os carentes dentro da misericórdia.

Saberíamos dizer que há centenas de líderes preocupados com o próprio sucesso monetário, mas levaríamos tempo para acharmos algum preocupado com o nosso próximo. Vemos centenas de pessoas ávidas por falar em justiça, defender países em guerras distantes, mas suaríamos para descobrir alguém vestindo ou acolhendo pessoas ao seu lado passando frio ou fome.

Viajando nesta parábola do camelo e da agulha, ficamos questionando, em nossas cabeças, como ficam as riquezas do Vaticano, grandes pastores construindo templos majestosos e políticos juntando grandes somas? Por que, mesmo com ensinamentos nas escrituras e nos grandes livros, a maioria escolhe o caminho do egoísmo e de seguir em frente, independente dos estragos causados pelo caminho?

É bom que saibam que a agulha, no tempo dos apóstolos, também era um portão noturno em Jerusalém que abria quando o maior era fechado e os camelos passavam com dificuldade. Por isso, relaxem com sua riqueza e sua avareza.

No novo testamento, Jesus nunca sugeriu, nem remotamente, que dinheiro, em si, fosse um mal.

Nelio Reis, professor universitário

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