A cassação do mandato de Boca Aberta como deputado federal, definida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não representa a morte definitiva da antipolítica, mas é no mínimo um tombo importante. Embora tenha saído de dentro da própria política institucional – durante anos foi assessor de Antônio Belinati – ele ganhou notoriedade e votos desqualificando o meio no qual sempre viveu, ainda que como assessor parlamentar ou ocupando outros cargos de escalões inferiores.

Quando abandonou o berço político para fazer o que chama de “carreira solo”, Boca Aberta tentou, por volta de 2008, 2009, liderar a comunidade LGBTQIA+, por meio de um blog chamado “Amigo Boca Aberta”. Não teve sucesso na empreitada, mas ainda estava no campo da política.

A guinada para o Boca Aberta da antipolítica se dá a partir da eleição de 2012, que ele disputou já abandonando o discurso de apoio à comunidade LGBTQUIA+ e defendendo propostas como “quem vai em pé no busão paga meia”, ou seja, quem viajasse em pé no transporte coletivo pagaria meia passagem. Com a eleição majoritária vencida por Alexandre Kireeff, com um discurso de pós-política – Kireeff, que antes de prefeito tinha sido candidato a deputado federal, mas depois não voltou a se candidatar, se colocava como um “técnico”, um “gestor” em vez de político – a estratégia antipolítica de Boca Aberta se intensificou.

Sem ocupar cargos na administração pública, Émerson Petriv, que é o nome do político na certidão de nascimento, estacionava uma motocicleta com caixa de som embaixo do gabinete do então prefeito e desfiava impropérios. A moto acabou apreendida e foi substituída por uma bicicleta. A estratégia de ataques diretos e pessoais rendeu ao político dezenas de processos e inclusive a proibição de se aproximar de diversas pessoas, como Kireeff, alguns secretários municipais e vereadores.

Os resultados foram colhidos nas urnas, em 2016: Boca Aberta foi o vereador mais votado, com 11.484 votos. Ele também colheu inimizades: em outubro de 2017 a Câmara cassou o mandato de vereador dez meses depois da posse. Durante o processo de cassação, o político já contradizia o passado de “defensor” da causa LGBTQIA+, com ataques homofóbicos ao relator da Comissão Processante que resultou na cassação.

Sem mandato, Boca Aberta dobrou a aposta na antipolítica e na retórica de que nenhum político presta. E novamente colheu frutos. Conseguiu concorrer para deputado federal, apesar do decreto de cassação expedido pela Câmara de Londrina. Obteve 90.158 votos e conquistou a cadeira que foi cassada – um dos motivos foi exatamente a inelegibilidade, consequência da cassação de 2017. De quebra, elegeu o filho, que passou a usar o nome de Boca Aberta Júnior, para a Assembleia Legislativa com 39.495 votos.

Com a vitória de 2018, que representava uma volta por cima depois da cassação pela Câmara, Boca Aberta se cacifou como candidato a prefeito. Mas em 2020 a antipolítica parece ter perdido parte da força. O resultado foi um copo meio cheio. Na parte vazia do copo, o Boca Aberta candidato a prefeito conseguiu 18.588 votos, 7 mil a mais do que quatro anos antes, quando foi eleito vereador. Uma votação fraca, tendo em vista que como vereador a concorrência era muito maior e o tempo de exposição era pequeno. Com quatro anos de mandatos e polêmicas, a estrutura proporcionada pelo mandato na Câmara dos Deputados e mais espaço para fazer campanha, um Boca Aberta mais conhecido teve um crescimento tímido da votação.

Na parte cheia do copo, Boca Aberta conseguiu eleger a esposa, Mara Boca Aberta, como a vereadora mais votada, com 6.192 votos, o que mostra uma grande capacidade de transferência de votos. Na campanha, ele aparecia junto com Mara no vídeo. Só o deputado falava.

Ainda não é possível dizer se a decisão do TSE feriu de morte a estratégia antipolítica de Boca Aberta ou se foram apenas escoriações. Mas também não dá para negar que foi uma derrota importante. O veredito será dado pelas urnas, no ano que vem.

Fábio Silveira é jornalista em Londrina