Ao cruzar com um pequeno grupo de brasileiros na avenida dos Aliados, no Porto, a duzentos metros de onde se encontra o coração de dom Pedro, percebi que discutiam a política nacional, às vésperas da eleição. Sem surpresa, confesso, pois este pleito já foi considerado um dos mais importantes da história republicana.

O entusiasmo manifestado na discussão se assemelhava ao início de uma final da Copa ou quiçá a uma conversa de boteco sobre os times de preferência! Os poucos minutos em que pude ouvir o sotaque tupiniquim, reconheci que todos eram adeptos de um candidato, porém, assim mesmo, manifestavam veemência e deixavam o espírito mergulhar na efusão de quem dava palpite sobre as estratégias eleitorais ou deslizes do político em questão!

A capacidade de resolução de todos os problemas nacionais numa simples conversa de turistas era o espelho dos milhares de treinadores num estádio de futebol! Percebi que longe do solo brasileiro tudo se tornava mais fácil para reencontrar o caminho perdido ou reafirmar o trilhado nos últimos anos. A distância dava a objetividade que nem sempre se encontra com a proximidade!

Quando se foram e entraram num café para saborearem uns pastéis de nata, afinal ninguém é de ferro, assumi meu papel de português-brasileiro mergulhando em reflexões desapaixonadas sobre o país que amo e escolhi para viver! Ou como dizia o político luso Almeida Santos, “a minha terra é a que escolhi par morrer”!

O Brasil está de fato numa encruzilhada. Embora a escolha por um dos dois candidatos na dianteira não seja um detalhe, o seu futuro vai muito além da vitória de qualquer um deles!

E já que estou deste lado, é de bom tom fazer referência ao processo que Portugal viveu na virada da ditadura para a democracia, em 1974. Foram, no mínimo, oito anos, até se conseguir um equilíbrio de pacificidade e reconciliação nacional, com o consequente progresso social e econômico! Sem paz não há desenvolvimento! Deste parto, a nação brasileira não poderá prescindir! Mas atenção: o faz de conta, o varrer para debaixo do tapete, ou anistias simplórias não ajudarão em nada! O Brasil dos apaixonados terá que evoluir para o país dos empenhados e cúmplices do processo regenerativo! Contar apenas com a mudança de sujeitos políticos será outro desastre!

É fato triste e até dilacerante constatar o desprezo com que o mundo trata o Brasil neste momento. Nacionalismo anacrônico ou demonstração de orgulho ferido não vai repor a relevância que já tivemos no tabuleiro político mundial! Se somos os produtores da comida para o mundo e é fato, busquemos provar que isso não nos coloca em rota de colisão com a visão moderna sobre desenvolvimento sustentável e que dispomos já de uma legislação de vanguarda sobre o assunto! É somente respeitá-la sem lamentações!

Se temos uma das mais modernas constituições de uma nação, firmemos o nosso compromisso com a democracia e o Estado de Direito e não abramos brechas a pensamentos obscuros que nos distanciem da civilização. O Brasil é gigante pela própria natureza, contudo, necessita se agigantar com uma sociedade forte e igualitária, que não impeça o sol de nascer sobre todos os seus filhos que não fogem à luta!

Os brasileiros que encontrei no Porto estão decerto se maravilhando com a gastronomia, a infraestrutura e os serviços lusitanos. Como eu apreciaria que voltassem à casa convictos de que também é possível um dia atingirmos esse patamar civilizatório e nunca desistissem de seu país! A política é o caminho! A eleição é um direito e um dever. A consciência cidadã e cívica é maturidade que fará a grande diferença neste processo de mudança que nos propomos! Somos treinadores, mas seria bom se também descêssemos ao gramado e jogássemos!

Padre Manuel Joaquim Rodrigues dos Santos, Arquidiocese de Londrina

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