Diferente da secura dos tempos atuais, certa vez o lendário padre José de Anchieta observou que “todo o Brasil é um jardim em frescura e bosque e não se vê em todo o ano árvores nem erva sêca”. Esse trecho é de um dos relatos sobre as belezas das nossas florestas tropicais. O primeiro desses escritos, a Carta de São Vicente, datado de 27 de maio de 1560, deu o dia para comemorar o nosso bioma: a Mata Atlântica.

A história de devastação da Mata Atlântica acompanha os ciclos de expansão da fronteira agropecuária e o crescimento desordenado das cidades. O bioma concentra a maior parcela da economia do país. Lar da maioria dos brasileiros, a Mata Atlântica é provedora da água e por consequência dos alimentos que consumimos.

Dados de 2019 do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e da SOS Mata Atlântica indicam que Londrina conta com apenas 11,38% da sua Mata Atlântica original. Não bastasse tal número assustador, esses remanescentes florestais estão em uma paisagem fragmentada e os pedaços de mata tem pouca conectividade entre si, o que resulta na maioria das vezes em florestas quase vazias em animais e empobrecidas em plantas.

A Mata Atlântica ainda sofre com a caça ilegal, desmatamento e a extração ilegal de palmito. Dezenas de espécies estão ameaçadas de extinção na região e muito pouco estamos fazendo. Se continuar como está, nossas futuras gerações só poderão conhecer as riquezas naturais em museus.

No norte do Paraná a sociedade tem seus méritos no debate sobre uma cidade sustentável. Foi Londrina o primeiro município brasileiro a criar uma lei para proteger os Fundos de Vale, em 1951. No entorno de 84 rios urbanos preservamos um pouquinho de Mata Atlântica. Na sua história recente, avançou sobre a Zona de Amortecimento do Parque Estadual Mata do Godoy, o pedaço mais precioso que restou da Mata Atlântica original na região. O desafio para se manter em pé e conservado é também comum no Parque Municipal Arthur Thomas, Daisaku Ikeda, além do Jardim Botânico de Londrina.

Avanços em Londrina como o Código Ambiental, o Plano Municipal de Arborização, o projeto de Parques Lineares do IPPUL e a proposta de revisão do plano diretor devem contribuir com a nossa Mata Atlântica, que por sua vez nos favorece com inúmeros serviços ambientais para a resiliência da nossa cidade. Mas a atual conjuntura exige um esforço à altura dos desafios que iremos enfrentar.

A ONU definiu os próximos dez anos como a Década da Restauração de Ecossistemas no período de 2021-2030. Nesse caminho, o Brasil estabeleceu o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa com a meta de nesta década recuperar 12 milhões de hectares em florestas. Em Londrina, dados obtidos do Cadastro Ambiental Rural indicam que temos um déficit de mais de 7.000 hectares. Esse montante é o equivalente a mais de 80 Parques Arthur Thomas que temos para plantar em florestas.

Plantar Mata Atlântica regenera o clima e a água e gera emprego e renda, uma das estratégias para a transição para uma economia de baixo carbono - tão urgente para nossa sobrevivência no planeta. Precisamos cuidar dos remanescentes, recuperar e plantar mais - muito mais!

Leia mais: Mata Atlântica perde 13 mil hectares de floresta nativa entre 2019 e 2020

Neste “textão” usamos o termo Mata Atlântica mais de 10 vezes, mais do que nos últimos 15 anos o Jornal Oficial da Prefeitura de Londrina citou o bioma no qual está inserido, isso aconteceu em apenas quatro ocasiões. No ano passado foi aprovada a Lei 13.060 dando o título para Londrina de “Capital do Ambiente”. A Mata Atlântica é o caminho natural para a resiliência dessa capital. Em crise, é hora de imaginar uma transformação das formas que cuidamos da Mata Atlântica. Por isso, vamos escrever, falar, discutir, repetir, o quanto for preciso, Mata Atlântica.

Laila Menechino, advogada e jornalista, MBA em Meio Ambiente e Sustentabilidade, coordenadora de projetos na Master Ambiental e membra da Ong MAE., e Gustavo Góes, gestor ambiental, mestre em ciências biológicas e membro da Ong MAE

Receba nossas notícias direto no seu celular! Envie também suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link wa.me/message/6WMTNSJARGMLL1.

A opinião do colunista não reflete, necessariamente, a opinião da FOLHA.