Diante da realidade da pandemia quanto à demanda por atendimentos, temos uma situação clara e grave: o sistema de saúde chegou ao ponto de pletora, de superlotação, e começa a não ter mais espaço para leitos, para assistência intra-hospitalar, mais espaço para absorver o tamanho da procura.

Essa condição de superlotação não é exclusiva, ou específica, de pacientes com Covid-19. Ela atinge todos os demais serviços da saúde, principalmente casos de urgência e emergência que exigem leitos de enfermaria e de UTI. As consultas eletivas também estão suspensas e os ambulatoriais, comprometidos por falta de pessoal e estrutura, além do risco de contaminação.

Eu gosto de futebol e estava vendo jogos no fim de semana. O Governo do Estado de São Paulo incluiu a suspensão das partidas nas medidas restritivas que adotou. Isso, é claro, tem provocado uma grande polêmica entre os comentaristas esportivos. Um desses comentaristas, um ex-jogador de futebol, falou o seguinte: “olha, é uma situação difícil. Agora, o que nós temos que pensar é o seguinte: e se o jogador quebrar a perna durante a partida de futebol? Vai ter lugar para internar esse jogador para fazer a cirurgia e a correção dessa fratura?”. Uma boa pergunta que temos que ampliar para o nosso cotidiano.

Tudo bem, eu não tenho Covid-19 ou já estou vacinado, então não preciso me preocupar e vou para a rua, vou viajar, visitar alguém. Mas e se eu bater o carro no caminho? E se eu for atropelado? Vai ter leito para me internar, para fazer a cirurgia ou me colocar numa UTI se for preciso? E se eu tiver risco de morte, como fica? É essa a questão.

O sistema público, no meu entendimento, tem feito o possível. Ampliou bastante, e de forma concreta, a oferta de leitos e tem procurado descentralizar os serviços que não sejam ligados ao coronavírus para hospitais de porte médio, na medida do possível. Só que chegou ao limite. O limite físico, em termo de disponibilidade de leitos e equipamentos. O limite de insumos, como a medicação sedativa para permitir a intubação do paciente e mantê-lo em coma induzido. Isso já começa a faltar. Estamos no limite de oxigênio para atender a todos. E, o mais grave, chegou ao limite de profissionais tecnicamente capacitados para o atendimento do paciente com Covid-19.

O que fazer? Contar apenas com a perspectiva de que vamos ampliar indiscriminadamente a oferta de leitos como estratégia para resolver o problema? Isso, além de impossível, não é suficiente como solução para o problema que estamos enfrentando. A gente roda, roda, e cai sempre na mesma situação.

Hoje, temos que intensificar de verdade e para valer, e não de faz de conta, as nossas ações de prevenção e de precaução em relação ao vírus.

Os focos centrais dessa precaução, obrigatoriamente, passam por reduzir a circulação de pessoas e, o que seria o mais concreto, aumentar a cobertura vacinal da população numa velocidade muito, mas muito maior do que estamos fazendo. Ocorre que estamos tendo muita dificuldade nas duas questões.

De um lado, dificuldade por parte da compreensão das pessoas, que não querem mais aceitar nenhum tipo de restrição de circulação. De outro, a impossibilidade de aumentarmos a velocidade, intensidade e quantidade de vacinação, pois, por erro crasso de planejamento federal, perdemos o momento correto para compra das vacinas necessárias e agora temos que amargar na fila das potências mundiais que estão comprando a maioria das doses já disponíveis. E o ritmo atual de vacinação não só não permite o controle da doença como dá espaço de tempo para o vírus desenvolver novas variantes mais graves, como está acontecendo.

Passou da hora de agirmos com consciência, conhecimento e amparados na ciência, com competência.

Gilberto Berguio Martin é médico sanitarista e professor do curso de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) - Campus Londrina.

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