Depois de tentativas frustradas, o poder público municipal de Londrina reiniciou o processo de elaboração do Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGIRS). Vemos de modo bastante positivo a iniciativa de voltar a discutir a existência do PMGIRS, uma vez que entre as maiores cidades do Estado do Paraná, Londrina é a única que ainda não possui tal documento. Contudo, julgamos essencial a revisão do processo de elaboração do plano proposto e a contemplação de certos aspectos no diagnóstico.

As ações normativas, operacionais, financeiras e de planejamento previstas no plano têm relevantes implicações locais nos âmbitos econômico, social, ambiental e de saúde pública. Além disso, envolve tanto decisões técnicas, quanto políticas, que deverão ser compartilhadas por vários atores individuais e coletivos com diferentes interesses e responsabilidades. A elaboração do plano tem potencial e deve alterar a trajetória e configuração local da gestão de resíduos, a qual atualmente depara-se com diversos problemas e desafios. O plano exigirá que sejam enfrentados temas controversos como a escolha de alternativas tecnológicas e de gestão para atingir a minimização dos resíduos, e as formas de inclusão produtiva dos catadores no sistema local.

Referências legais como o Estatuto das Cidades, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e a Lei Municipal nº 10.637/2008 asseguram ampla e qualificada participação da sociedade no processo de formulação, implementação e monitoramento do PMGIRS. Nesse sentido, entendemos que o processo de construção do Plano proposto não atende de forma adequada a legislação e a complexidade do tema tratado.

Identificamos aspectos problemáticos nessa proposta: não há definição de critérios de representatividade e atribuições dos atores ao longo do processo participativo; falta de cronograma dos trabalhos; a metodologia não permite o diálogo livre entre os atores; não está claro como será o processo deliberativo para definição dos conteúdos finais do plano; há indícios de um modelo decisório excessivamente centralizado na administração municipal; e baixo grau de divulgação e mobilização da comunidade sobre a atividade. De modo geral, prevalece uma abordagem meramente consultiva de participação que, sob a nossa ótica, é insuficiente para os propósitos de engajar os atores sociais na implementação das ações e programas.

Com relação aos aspectos do diagnóstico, destacamos:

I- Inexistência de um diagnóstico institucional sobre as dificuldades gerenciais, de infraestrutura e de pessoal técnico-operacional para o gerenciamento das ações, fiscalização e execução de programas vinculados ao tema, além da governança da gestão;

II - O estudo gravimétrico apresentado não é representativo, uma vez que a geração de resíduos sólidos é sazonal, logo, o ensaio deveria ser replicado em outras épocas do ano. Acrescenta-se ainda o período pandêmico, que pode ter acarretado alterações significativas nas amostras analisadas;

III- O Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS) não está articulado ao PMGIRS de forma explícita. Também não contempla vários outros resíduos que geram significativos impactos ambientais e tampouco fazem parte da coleta seletiva, a exemplo dos resíduos têxteis;

IV - Temas cruciais e legalmente exigidos pela PNRS (art. 19) não constam ou são abordados superficialmente, a exemplo dos mecanismos para criação de fontes de negócio, emprego e renda mediante a valorização dos resíduos; das práticas desenvolvidas pela administração pública para o combate ao desperdício e a minimização de resíduos; dos passivos ambientais relacionados aos resíduos, incluindo as áreas contaminadas e os locais de ocorrência de pontos de deposição irregular; da educação ambiental; e da capacitação de atores diretamente afetados.

Portanto, a ausência dessas informações e de um maior detalhamento do diagnóstico dificulta a caracterização de fragilidades e dos pontos fortes do modelo atual de gestão do município. Entendemos que o momento de exceção da pandemia tem exigido mudanças nos processos de planejamento, contudo é fundamental e necessário que mantenhamos condições mínimas de legitimidade democrática e de suporte técnico para a formulação e implementação efetiva do PMGIRS de Londrina.

Lilian Aligleri, Benilson Borinelli , Suzana Barreto Martins, Camila Doubek, Caio Victor L. Rodrigues, Danielly Negrão Gassu, Edineia Vilanova Grizio-Orita, Luciano Panagio, Patrícia de Oliveira Rosa da Silva e Ana Claudia Duarte Pinheiro são professores do Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Resíduos da Universidade Estadual de Londrina.