Acompanho em sítios da rede mundial as mensagens trocadas por aplicativo Telegram entre o procurador da república Dallagnol e o juiz que, então, presidia a operação (Sérgio Moro), após o Ministro Lewandowski levantar o sigilo antes decretado. Importante saber que a fonte é lícita (operação Spoofing) e que os tais diálogos já foram submetidos a perícia.

Noves fora questões técnicas, os diálogos revelam toda a podridão que, um dia, o reino da Dinamarca espraiou para o mundo pela pena do bardo de todos os bardos, ressignificando (quatro séculos depois) a circunstância da vida nada mais ser que uma sombra que anda.

E, assim, feito árvores andantes, seguimos pobres atores que pavoneiam e se agitam durante a sua hora no palco, para depois não sermos mais ouvidos – qual a estória contada por idiotas, cheia de som e fúria que nada significam. Nada!

A herança das bruxas escocesas ao profetizarem a coroação de Macbeth repousa na carta que o general escreve a sua esposa revelando a visão das feiticeiras. Ali nasceu a hipótese do regicídio, alimentado pela ambição de lady Macbeth.

Foi dela o plano para assassinar o rei Duncan acreditando na profecia. Foi, entretanto, a condição humana, convocada por lady Macbeth, quem convenceu seu marido a participar do regicídio.

Regicídio à parte, qual a expectativa de Moro ao corromper o due process por aqui? O que disputava ele politicamente? Queria ser rei?

Não sei. O que sei é que foi lady Macbeth quem recolheu o punhal ensanguentado das mãos assassinas de seu marido, não sem antes incriminar os próprios criados do rei pelo regicídio...

Lá, como cá, há atores e atores; facas e canetas (e ambas ferem). Tudo alimentado pelo grande circo da vida, que faz da ironia e das pequenas coincidências a própria cornucópia...

Moro era um faminto ministro da justiça quando a operação Spoofing foi implantada sob seu comando. Foi ele quem ordenou a apreensão do material que os hackers colheram. Pensava ser rei? Acreditava suceder a extrema direita enquanto tutor de um discurso menos mitológico?

Aqui a arte imitou a vida, na fúria conveniente do general Macbeth...

Sérgio Moro nunca foi notável – a PIG o fez suficientemente visível para que tal visibilidade cegasse algum ponto outro pelo qual a boiada neoliberal passasse – e isso lhe apartou da profecia das bruxas, mas não impediu de falar bastante com seu garoto prodígio sobre o plano de dominar o mundo, reeditando a equação de Pink e Cérebro...

Todavia e maledicências à parte, na tragédia das tragédias os filhos de Duncan (príncipes Malcolm e Donalbaian) fogem, abrindo o caminho do trono à Macbeth, que possuía parentesco com Duncan...

Por aqui foi Moro quem tramou o próprio desligamento quando pensou que poderia ser, enquanto político, a tragédia que foi como juiz, acreditando na fada azul que deu vida a Pinóquio...

Aqui a metáfora da libra de carne sai de Veneza, ganha o mundo pela veia aberta de américa latina e termina na barriga de uma grande baleia...

Assim seguimos todos (eu, o bardo dos bardos e Carlo Collodi), assaltados em nome do estado de direita, afundados em uma sofrença que vai do nojo ao espectro corruptor do compadrio institucional, ao som de uma tempestade perfeita no entorno da operação lava jato.

A PIG criou um falso herói (a direita sobrevive de mitos imbecilizados criados pela opinião publicada, desde sempre). O resto já é história. Com o que sobrou, tentaremos refazer um país.

Moro, todavia, qual Macbeth contemporâneo, tem seu nome atirado na lata de lixo da história, locado na prateleira que não ousou recepcionar o próprio Calabar, mas que guarda uma foto de lady Macbeth...

Tristes e corruptos trópicos, onde eleição já não se disputa em urnas, mas em processos penais promovidos e presididos por atores políticos que se deixaram corromper pelos mais variados anseios.

Obrigado, pai, pela vergonha que guardo e pela valia de teu olhar. Espero legar tua grandeza a teus netos, viabilizando-os atores da própria história...

João dos Santos Gomes Filho, advogado