ESPAÇO ABERTO - A pauta é a democracia
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 26 de novembro de 2021
Padre Manuel Joaquim R. dos Santos
Uma das principais pautas na eleição do próximo ano será irrefutavelmente a estabilidade democrática. É claro que a questão econômica ou o combate à corrupção também darão o tom aos debates; porém, o primeiro será com certeza o de maior interesse. Quando, por motivos de contextualização histórica, o assunto é a consolidação do atual regime conquistado a duras penas, não poderão existir concessões e o eleitor não deverá titubear. Posto isto e conhecendo já o segundo candidato nas pesquisas, nada afeito às regras democráticas, vimos há alguns dias, o outro, que se encontra hoje em primeiro lugar, sendo também condescendente com ditaduras de esquerda que em meu entender, de esquerda nada tem, como é o caso da Nicarágua!
Ora, este período pré-eleitoral, em que falta quase um ano para as eleições, é de fundamental importância que os eleitores, conheçam a fundo os candidatos, mesmo que eles não sejam novos no pleito. O senhor Ortega, que já foi um guerrilheiro de esquerda, eleito inclusive com a simpatia da igreja em épocas que ela sobressaía na defesa intransigente dos direitos humanos e se insurgia contra ditaduras latino-americanas, hoje não passa de um ditador com todas as prerrogativas inerentes! Controla o Judiciário e o Legislativo e prende opositores! Assim como a China. Assim como a Coreia do Norte! Assim como a Venezuela! Refiro-me às ditas de “esquerda”! No outro extremo, temos vários regimes totalitários e candidatos a tal! Bastaria mencionar a Turquia, a Polônia, a Hungria e por incrível, até os EUA da era Trump! Inclusive, nos próximos meses, a experiência vivida pelo Peru e o Chile, seria bom estar no radar dos brasileiros!
Somos uma das maiores democracias do mundo e sofremos com ela as mesmas contradições de qualquer tempo e lugar. Democracias não são perfeitas e exigem, além de uma atenção constante, um fortalecimento permanente das instituições de Estado. Contudo, num sistema presidencialista como o nosso, parece que o regime democrático se torna mais vulnerável. Ao longo destes últimos três anos, vimos uma decadência clara dos pilares que sustentam a nossa democracia, como se de uma desconstrução se tratasse. Não podemos, portanto, tolerar que nenhum dos candidatos, seja quem for, não tenha um compromisso firme e inequívoco com ela! O início do século XXI, no que convencionou chamar-se de pós-modernidade, mostra-nos o quanto este regime está sendo fragilizado pelas mudanças ocorridas com a quebra da hegemonia da razão. Negacionismos, nacionalismos e populismos, saindo das sombras, ameaçam-nos com as suas garras. A imunidade deve vir da consciência de um povo que não tolera repetições ditatoriais do passado, mas devemos cobrá-la de modo especial, no DNA de todos os candidatos que se apresentam num pleito eleitoral democrático!
Como já tem sido repetido à exaustão, as democracias morrem implodidas por gente que entrou pela porta da frente de processos legítimos. No entanto, quando observamos com acuidade, a vida, o histórico e as manifestações dos vários candidatos, não teremos dificuldade em separar o trigo do joio, entre os que prezam as regras do jogo democrático e os que sonham com a instauração de governos totalitários! Elogiar governantes suspeitos de outros países, ou calar-se sobre as suas “acrobacias totalitárias”, é um péssimo indício.
O mundo de 2021, em que uma pandemia teima em não ir embora e a crise econômica aguda gerou um fosso maior de desigualdade social, exige estadistas democráticos e rejeição total de quimeras aventureiras, geralmente chamadas de populismo! De esquerda ou de direita! O canto das sereias é contínuo, em debates eleitorais ou em propostas programáticas de governo. Em não poucas ocasiões, escondem mais do que revelam! Ocultam intenções perversas de poder pelo poder, sem nenhuma sensibilidade social ou compromisso com a verdade. Cavalos de troia são mais frequentes do que algum dia poderíamos imaginar!
O Brasil tem uma dívida com o STF. Quer gostemos ou não da sua composição e do seu modus operandi! O ano que finda, mostrou-nos que uma Suprema Corte faz muita diferença perante os delírios antidemocráticos do governante de plantão! Porém, o ideal seria que não precisasse ter tanto “ativismo judicial” e que a sociedade vivesse num constante alerta. A democracia é um tesouro difícil de guardar, e não negociável!
Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese de Londrina
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