Há quarenta e seis anos, através do Estadão, o Brasil se estarrecia e ficava por dentro, pela primeira vez na ditadura, da falsa lisura e transparência do governo militar quanto aos gastos da presidência. Não é necessário lembrar que os militares ficaram furiosos com esse “atrevimento” da imprensa! Contudo, foi a porta que se abriu devagar, marcando o primeiro dos últimos dias do regime de exceção, que tantas vítimas causou e a tantos enganou, como qualquer ditadura que se preze.

Esta semana, a mesma imprensa (agora livre, graças a Deus) abordava de forma crítica, uma relação de gastos do governo federal com alguns números que assustaram os brasileiros, habituados a uma acrobacia contábil ao enfrentarem as prateleiras dos supermercados e frequentemente voltarem pra casa carregando o mínimo, para as necessidades básicas da família. O assunto em si, sem entrar no mérito da quantidade dos produtos, já merece da parte da mídia a importância devida, uma vez que é direito do cidadão acompanhar os gastos do seu governo. A comilança federal é tanto mais indigesta quanto mais conflitante com o momento econômico e pandêmico que vivemos no país.

Em tempos idos, mas não remotos, uma informação deste calibre teria potencial para desencadear um tsunami de revolta cidadã, capaz de fazer inveja a uma Paulista em dia de manifestação LGBT! Mas hoje, na época da “não corrupção, da nova política, do liberalismo econômico e social”, escutam-se até os passarinhos nos arbustos de tão silenciosa que anda a nossa indignação! Porém, o silêncio covarde perde ainda para outra atitude menos esperada e descabida, embora caraterizante dos tempos obscuros que vivemos. Hordas de fanáticos (nome mais acertado para quem não enxerga o óbvio), se posicionaram entrincheirados na defesa da lambança presidencial, alegando todas as desculpas esfarrapadas e estapafúrdias a que puderam botar mão: “isso dos gastos do governo é fake; foi comida para o exército; são 500 mil pessoas comendo sem tempo para almoçar direito”! E a pérola que não podia faltar na boca dos que tudo justificam: “no tempo do PT era pior e ninguém falava”! Ora, neste mesmo espaço, eu e tantos outros, denunciamos veementemente os desmandos da outra era! Cheguei a pedir o impeachment em 2006 e o pedi em 2016. Tudo registrado. Inclusive em livro!

A Folha de Londrina não é apenas um “papel amarelado” transpirando nas suas páginas, a história da cidade e da região. É um órgão vivo e atuante no atual momento, como o foi em tantos outros do passado. Lá estava ela com entusiasmo, no Movimento das Diretas Já e comprometida, junto comigo e tantos outros companheiros, no Movimento Pés Vermelhos Mãos Limpas, buscando a moralização da política londrinense em 1999 -2000.

Londrina se honra de ter um Jornal que não pactua com a imoralidade, o crime ou atitudes que atentem contra a dignidade do ser humano. Por isso, não deve somente ser respeitado, mas prestigiado. Assinado. Lido. Discutido. Uma sociedade é esclarecida e madura quando tem Meios de Comunicação do porte da Folha de Londrina. Atacá-la com raiva e ódio porque ela fala a verdade é apenas combustível para que os seus profissionais trabalhem com mais afinco na busca do que é certo e justo. Como escrevi anteriormente, é um momento de reconciliação nacional. Mas eu também sublinhei, que apenas será possível sobre um pacto sólido com a verdade. E jornais como a Folha de Londrina nos ajudarão nesta catarse, proporcionando a discussão sadia que advém da informação séria. A Folha jamais descerá ao nível dos debates provocados pelo Whatsapp! Essa infelicidade brasileira, abominando o conhecimento cientifico em prol das fake news, encontrará permanentemente em jornais sérios um contraponto e uma denúncia.

Que neste momento conturbado, a imprensa livre seja o farol de grande alcance que nos guiará através do denso nevoeiro.

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese Londrina