O cenário atual é de ausência de regulamentação estatal capaz de orientar a gestão dos empregados que tiveram seus contratos de emprego suspensos ou carga horária e salário reduzidos com base no Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda em decorrência da COVID-19.

Desde 31 de dezembro de 2020, os empregadores lidam com três situações novas e conexas na gestão dos empregados afetados pelo Programa: I) a estabilidade originada pela suspensão do contrato de emprego ou redução da jornada e do salário; II) questões práticas relativas ao retorno ao emprego, em especial, dos integrantes do grupo de risco; e III) a ausência de legislação para a gestão dos empregados beneficiados pelo Programa do Governo Federal.

Como regra, o empregador pode dispensar o empregado que teve seu contrato suspenso ou carga horária e salário reduzidos, em razão do Programa do Governo, mediante indenização compensatória, a ser paga junto com as verbas rescisórias, (art. 10º, §1º, incisos I, II e III, da Lei 14.020/2020.

Cabe excepcionar a dispensa coletiva de trabalhadores (equiparada à individual após a Reforma Trabalhista de 2017), à luz do entendimento firmado pelo Tribunal Superior do Trabalho no célebre “caso EMBRAER”, que versou sobre a dispensa de 4,2 mil trabalhadores no ano de 2009, e que reconheceu a negociação coletiva como indispensável à dispensa massiva.

Outra exceção repousa na situação dos empregados que integram o grupo de risco, pois a legislação federal (Lei 9.029/1995) proíbe a ruptura contratual motivada por “sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade”, dentre outros motivos que podem ser considerados discriminatórios.

O dilema envolvendo a manutenção no emprego é bastante sensível na gestão dos empregados. Se, para o empregado do grupo de risco, o retorno ao trabalho pode representar mais exposição à infecção pela COVID-19, para o empregador, o regresso desse colaborador à rotina laboral representa a assunção de riscos trabalhistas ainda maiores do que já lhe exigia a complexa atividade empresarial média no Brasil.

O Ministério Público do Trabalho tem promovido ações administrativas e judiciais com vistas à proteção dos trabalhadores, inclusive por meio da criação de normas para regulamentar as condições de trabalho durante a pandemia.

Portanto, o empregador que solicita o retorno ao trabalho do empregado que integra o grupo de risco assume, de plano, os riscos trabalhistas decorrentes da necessidade de adequação às normas administrativas, para que não sofra sanções por parte dos órgãos da Administração Pública.

Os sindicatos profissionais têm atuado mais intensamente na proteção às categoriais profissionais.

O Poder Judiciário, por intermédio de sua Corte Suprema (STF), já sinalizou entendimento de que o acometimento pela COVID-19 pode vir a ser reconhecido como doença ocupacional.

Em tal contexto, a negociação coletiva se apresenta como recurso disponível, aos empregadores e empregados, para suprir a ausência estatal na elaboração de normas que versem sobre a situação dos empregados beneficiados pelo Programa do Governo Federal.

Pois bem. A negociação coletiva pode ser utilizada tanto para negociar a “estabilidade” gerada pela suspensão do contrato ou redução da carga horária e salário, no curso do contrato de emprego, quanto pode servir de instrumento para criar uma alternativa ao imediato retorno ao trabalho dos empregados integrantes do grupo de risco. Ela tem o poder de manter os postos de trabalho sem onerar excessivamente o empregador. É o caminho do meio entre o excesso e a falta de regulamentação estatal.

Thiago Lima, sócio do escritório De Paula Machado Advogados Associados