Educação, tecnologia e mudança. Os conceitos são diferentes, entretanto, em um mundo cada vez mais conectado, somá-los para gerar uma nova forma de ensino são importantes para garantir uma atualização frente às novas ferramentas e gerações que hoje se apresentam. Este contexto está ligado ao termo Educação 4.0, que responde às necessidades da chamada "quarta revolução industrial", de internet e inteligência artificial dentro da indústria.

Mestre em tecnologias educacionais emergentes, o professor José Motta Filho defende a utilização da tecnologia dentro da educação, com os professores aplicando outras metodologias como forma de preparar o aluno para as novas maneiras de organização de trabalho e social. Graduado em engenharia civil e pós-graduado em administração de escolas, também destaca o emprego de metodologias ativas, com a escola e docente se adaptando aos diversos recursos.

Natural de Palmas, no sudoeste paranaense, é especialista em Principles of Technology, sendo atualmente Head of EdTech na Beenoculus, principal startup da América Latina em desenvolvimento de soluções em realidade virtual para a educação. Motta leva suas palestras sobre a temática de educação e tecnologia por todo o Brasil. Recentemente esteve no Colégio Londrinense, onde falou a professores da instituição sobre Educação 4.0 e metodologias ativas de ensino, na semana pedagógica. Em entrevista à FOLHA, o especialista fala sobre as tendências e desafios do campo educacional. "Tem que ter educação fora da caixa", aponta.

O que é o conceito de Educação 4.0?
O que acontece com o mundo é que ele está altamente conectado, com as tecnologias em todos os ramos, serviços, produtos e indústria. Percebe-se que a escola, tanto colégio, como universidade e pós-graduação, às vezes, não avançam na mesma velocidade. Atualmente temos a Indústria 4.0, com empresas com pouca interferência do ser humano. A escola continua, desde a educação básica, fazendo educação que vem da escola prussiana, em que tem um professor que detém o conhecimento e os alunos quietos em sala de aula, com pouca interação.
Agora na Educação 4.0 temos adição de elementos de tecnologia, com novo mindset para o professor lidar com estas gerações que aparecem em sala de aula, que nasceram num mundo com internet. Muitos professores, às vezes, resistem em usar tecnologia diferente em sala, por terem receio de que o aluno não vai interagir com o conteúdo. Entretanto existem muitas tecnologias educacionais emergentes, que são chamadas de edtech, existem metodologias ativas de ensino. Quando consegue ter metologia moderna, com a disponibilidade de tecnologia que temos, como inteligência artificial, realidade virtual e plataforma adaptativa, com método de ensino científico, para trazer aprendizagem maior do aluno, você transformou educação em 4.0.

Qual o papel do professor neste processo?
Muitos cursos que formam professores abordam isto de forma tímida. Os professores, em certas ocasiões, têm resistência em navegar nestes novos conteúdos porque, querendo ou não, se cai numa certa zona de conforto. Descobrimos um melhor jeito que achamos que é nossa aula e por isso não procuramos mudá-lo, já que "acertou a mão". Mas os alunos, a cada ano, vão chegando diferentes. É por isso que a Educação 4.0 tenta ser inovadora, sem deixar de lado princípios e teorias educacionais, porém colocando elementos do mundo moderno, onde tem uma mistura de autores do passado e questões atuais. Como o professor se prepara para isso? Primeiro tem que ser interesse em querer mudar sua prática, segundo buscar novos conhecimentos.

Como implementar a Educação 4.0?
Os professores devem efetivamente "colocar a mão na massa", fazendo oficinas e workshops para entender o que é metodologia de ensino e entender a ferramenta tecnologia. Algumas metologias ativas de ensino são a Flipped Classroom (sala de aula invertida); aprendizagem por parte; sala de aula em formato de quebra-cabeça; metodologia que pensa, une com seu colega, e depois compartilha com sala; gamification.

Como conseguir tudo isso em escolas públicas, que muitas vezes não dispõem de estrutura mínima ?
Metodologia é uma coisa e tecnologia educacional é outra. A metodologia sobrevive sem a tecnologia. Por exemplo, tenho que ter estratégia de ensino para coletar respostas dos alunos. Numa escola que tem muitos recursos consigo fazer coleta por meio de aplicativo no celular do aluno, usando internet. Na escola que não tem recurso posso fazer por meio de folhas impressas, em que tenha nelas as letras a, b, c, d, e, de forma que quando os alunos levantarem a folha consiga coletar. Ou seja, a metodologia não fica prejudicada por não ter tecnologia avançada. É possível fazer muitas atividades boas, mesmo com mínimo de recurso.

O que são metodologias ativas?
A premissa da metodologia ativa é a educação centrada no aluno. Por muito tempo, e ainda em muitas escolas, a educação é centrada no professor, detentor do conhecimento, aquele que trouxe algo para me dizer. Quando muda este foco, colocando a educação centrada no aluno de maneira que é uma metologia ativa de aprendizagem, fazendo com que o aluno fique em mais movimento em sala de aula, parte para a premissa de que professor é facilitador. É a pessoa que vai mediar o conhecimento em função de algo que o aluno até já tenho feito antes da sala. Se pesquisarmos (metodologias ativas) achamos mais de 30 facilmente.

A Educação 4.0 e as metodologias ativas são o futuro da educação?
Vejo isso como o presente da educação. No futuro teremos educação totalmente híbrida, ou seja, misto de online, à distância, com pouco de presencial. Tem que usar a tecnologia a favor da educação, porém não podemos esquecer de um ingrediente importantíssimo, que é o relacionamento humano. As competências socioemocionais. O saber agir, pensar ou resolver problemas em colaboração. Não aposto numa educação 100% à distância, assim como não acho que educação totalmente presencial é o melhor caminho. Acredito que uma pessoa com mínimo de cognição consegue estudar algo sozinho e depois, em momento especial, com professores e colegas, lapidar tudo isso. O conhecimento hoje "mora na nuvem", qualquer um consegue acessar informações. A questão é o que fazer com elas. O professor pode ajudar.

Quais os riscos das instituições de ensino não se atualizarem?
Consequências deste risco, que já foi assumido, estamos tendo agora. O Brasil sempre está no último quadrante do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos). Há alguns meses o ex-ministro da Educação (Rossieli Soares) foi em rede nacional e disse que o ensino médio está no "fundo do poço", que na proficiência em língua portuguesa ou matemática, de zero a 100, nossos alunos ficaram com menos cinco. Temos muitos alunos tristes, desmotivados, alta evasão escolar. De cada cem alunos que terminam ensino médio, só 13 entram no ensino superior. Por isso é urgente uma mudança transgressora. Precisamos de pessoas mais criativas e críticas, que queiram mudar o mundo efetivamente.

O que estas mudanças podem impactar nos alunos?
Temos que entender e acreditar nos dez pilares da Base Nacional Comum Curricular. Esta base pede para que as escolas promovam em suas atividades itens que raramente são contemplados em aula tradicional, puramente expositiva: empatia, projeto de vida, argumentação, cultura digital, colaboração. Quando consigo utilizar um método de ensino em que ativo o aluno, ele consegue treinar estas habilidades. Se consigo isto, estou desenvolvendo no aluno aquilo que as principais empresas do futuro do trabalho solicitarão de um ser humano. O futuro das profissões é relacionamento em primeiro lugar e competência técnica em segundo.

Utilizar as metologias ativas é uma maneira de enfrentar a concorrência dos celulares na sala de aula?
Não diria que vai ir contra isso, mas vai abrir um canal aonde, além de existir a rede social, possa conversar olho no olho com o ser humano, e vai, de repente, até usar a rede social para engajar os alunos. Conheço professores, por exemplo, que utilizam o WhatsApp com estudantes de medicina, nutrição e enfermagem, lançando uma patologia que um paciente possui. A farmácia elenca quais são os medicamentos bons, o pessoal de nutrição aponta uma dieta, e a medicina diz os cuidados do pós-operatório. É como se o professor desafiasse os alunos na rede social para quando chegarem em sala de aula possa lapidar tudo com eles. O que não pode é um professor continuar em sala só no quadro negro e nos slides de PowerPoint. Daqui uns dias isso não vai caber mais na educação. Tem que ter educação fora da caixa.

Como o poder público pode colaborar?
Aproximadamente 6% do PIB (Produto Interno Bruto) é destinado para a educação no nosso País. Em percentual isto é maior que muitos países que contam com educação bastante desenvolvida. Então, o problema reside no fato que a gestão deste recurso púbico precisa ser revista. Aplicar os recursos de maneira mais consciente, de modo a contemplar quem realmente precisa.