EDUCAÇÃO - Consolidação do Enem pode fortalecer ensino básico
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sexta-feira, 04 de dezembro de 2009
Paula Costa Bonini<br> Reportagem Local
Passar por avaliações constantes é uma certeza na vida de cada cidadão. Em diversos momentos, somos obrigados a nos submeter a testes. As provas são necessárias para ser aprovado na escola, obter licença para dirigir, ingressar em um curso superior.
Esta é, aliás, uma das avaliações mais importantes e discutidas no Brasil. O vestibular ainda é a principal porta de entrada dos estudantes para a universidade. Uma novidade recente é a adoção do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), criado em 1998, como critério de seleção associado ao vestibular. Hoje, mais de 600 instituições de ensino superior aderiram ao sistema.
O vazamento da prova, que provocou o adiamento do Enem para este fim de semana, atraiu os holofotes para o processo seletivo. Para o pós-doutor em educação e coordenador do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) José Francisco Soares, qualquer teste único em um país com as dimensões do Brasil é de difícil realização.
O resultado do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deve ser considerado para ingresso no ensino superior?
O novo Enem é importante como uma referência para o ensino médio. Sinaliza que o aluno, considerado como cidadão, precisa ter habilidades e conhecimentos em quatro grandes áreas para participar de forma crítica da sociedade. A admissão ao ensino superior tem outras dimensões. Certamente as habilidades e conhecimentos considerados no novo Enem podem não ser tudo que uma instituição necessite de seus alunos. É razoável pensar que o Enem será, aos poucos, a primeira etapa de muitos processos seletivos. Se isso acontecer será bom para a organização do ensino básico brasileiro.
Como o senhor avalia a fraude no Enem? De que forma é possível evitar este tipo de problema?
Qualquer processo único em um país com as dimensões do Brasil é de difícil realização. Realizar o Enem em dois dias para milhões de alunos é uma tarefa arriscada. O Enem deve evoluir para ser oferecido mais vezes ao ano e, idealmente, através do computador. Parte dos recursos que hoje são utilizados para uma única aplicação poderiam ser usados para a criação de centros de informática nas escolas, onde os alunos responderiam às questões do exame. Já existe tecnologia para isto.
Qual é a melhor forma de acompanhar o rendimento dos estudantes?
Todo aluno de qualquer instituição de ensino e de qualquer nível tem o direito de ser avaliado pelos seus professores. Só assim suas dificuldades de aprendizado serão conhecidas e poderão ser sanadas. No entanto, além dessa avaliação interna das instituições, a sociedade precisa ter evidências sólidas que as instituições de ensino estão cumprindo sua missão. Isto é feito por meio de avaliações externas que medem o aprendizado dos alunos em algumas áreas julgadas essenciais.
O vestibular é uma forma justa de avaliação, uma vez que um candidato bem preparado pode não ter um bom desempenho no dia da prova?
Toda avaliação capta o desempenho do aluno em um dado momento, não o conhecimento cristalizado do aluno. Neste sentido a nota em apenas uma prova pode não ser uma medida fidedigna do grau de seu conhecimento. No caso dos vestibulares assume-se, implicitamente, que a capacidade de responder as questões do teste, mesmo em uma situação excepcional, também está sendo considerada de forma igual para todos os alunos. Não há evidência de que, no geral, este aspecto influencia de forma inadequada o grupo selecionado. Alguns alunos que por motivos pessoais não se saíram bem são substituídos por outros também merecedores da vagas.
Em outros países a seleção para o ensino superior inclui entrevista e análise de currículo. Isto é possível no Brasil?
A instituição, a princípio, deveria escolher os alunos que a permitem cumprir sua função. Por exemplo, uma escola de engenharia tem de admitir alunos que tenham bons conhecimentos matemáticos. Não pode, portanto, usar sorteio. No Brasil, entretanto, a nossa tradição social e jurídica obriga as escolas públicas admitir os alunos pela ordem de classificação em uma prova. Mas isto está mudando com a introdução de considerações sociais, como é o caso dos bônus ou cotas atribuídos pela escola de origem ou cor ou raça dos alunos. Usar outros critérios de seleção é mais um debate social do que pedagógico.