EDITORIAL: A vida prolongada no outro
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sexta-feira, 24 de março de 2023
Folha de Londrina
Em meio a corações devastados pelas perdas precoces de seus entes, a demonstração do mais puro conceito de amor ao próximo. O altruísmo em estado bruto. A doação de órgãos é sobretudo uma manifestação clara de que a raça humana tem jeito. Nesta última semana, tivemos exemplos disso em episódios separados, mas marcados pela dor comum derivada de trágicos acidentes viários. Aqui no Paraná, em Jandaia do Sul, no Vale do Ivaí, familiares do menino João Lucas dos Santos Silva, de apenas oito anos, autorizaram a doação de seus órgãos após a confirmação de sua morte cerebral. O garoto foi a quinta vítima fatal do acidente entre um ônibus escolar da Apae e um trem, ocorrido no último dia 9 (outros dois alunos e duas funcionárias da entidade também perderam a vida). Mais cinco ocupantes do ônibus permanecem internados em hospitais da região.
O outro gesto de solidariedade extrema que brotou do luto partiu dos familiares do adolescente Guilherme Lima Corrêa, de 14 anos, no Rio de Janeiro. O garoto e mais seis parentes morreram em um violento acidente entre o carro que ocupavam e uma carreta desgovernada em uma rodovia estadual no interior do estado fluminense, no último sábado (18). Os avós paternos do menino lideraram a decisão de doar os órgãos - fígado, rim, pele e ossos - assim que foi constatada a morte cerebral. Causou comoção a cena da avó se despedindo do neto dizendo que ele partia salvando vidas. “É um ato de amor ao próximo. Foi o mais certo a se fazer neste momento. Não importa para onde vai. Eu sei que, em algum lugar do mundo, ele vai estar vivendo”, disse Valéria Corrêa. Os órgãos do neto serão transplantados em pacientes que aguardam na fila de espera no Rio de Janeiro e em Minas Gerais.
Desnecessário dizer que essas filas são grandes em todo o país, e, para quem está na espera, parecem intermináveis.
Segundo dados de fevereiro deste ano do Sistema de Transplante do Paraná, disponibilizados pelo governo do Estado, o número total de pacientes ou receptores na espera por órgãos e tecidos no cadastro técnico é de 3.262 pessoas, sendo 1.771 homens e 1.491 mulheres. Em relação aos receptores em situação ativa, a quantidade é um pouco menor, 2.806 pacientes (1.540 homens e 1.266 mulheres). Nas duas listagens (cadastro técnico e situação ativa), a maior demanda é para transplante de rim (1.822 e 1.548 receptores, respectivamente), seguida por córnea (1.173 e 1.053) e fígado (192 e 143). Também há pacientes à espera de transplante de coração, rim/pâncreas e pulmão.
Ainda conforme o Sistema de Transplante do Paraná, com dados deste ano, a maior causa de não doação de órgãos e tecidos continua sendo a recusa familiar (27%), o que só enobrece os gestos de quem tem a compreensão da importância do ato.
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