O fato de o Brasil ser um dos campeões mundiais em reciclagem de latas de alumínio não significa consciência ecológica, mas necessidade. Antes de caracterizar um índice de civilidade é uma amostragem de pobreza. Seria louvável poder festejar tão elevada cota de reaproveitamento se não constatássemos que quem recolhe essas latas são apenas os pobres, porque os verdadeiros consumidores do conteúdo desses recipientes de cerveja, refrigerante e suco, apenas contribuem com lançá-los no lixo. E, assim mesmo, pouquíssimos são os que, ao ensacar o lixo doméstico, separam os resíduos sólidos dos orgânicos.
É auspiciosa a informação isolada de que o Brasil recicla quase 80% das latas de alumínio, ombreando-se com o Japão e superando os Estados Unidos, pioneiros na reciclagem desses recipientes e cujo índice é de 63%. A diferença é que os recicladores das latas de alumínio desses países e de outros igualmente adiantados é que eles são, também, os consumidores do contéudo. O que - sabemos todos - não ocorre com os catadores de latas em nosso País. Mas esse detalhe não é mostrado por aqueles que se ufanam dessa ‘‘consciência ecológica’’.
Mesmo que os brasileiros reciclassem tudo, ainda assim não estaria caracterizada a consciência de preservação ambiental, pois resíduos que não têm valor comercial não são recolhidos com tanta avidez. O que ocorre, então, é uma camada pobre, sem emprego formal, juntando resíduos que rendem dinheiro. Um natural meio de vida e não consciência ecológica.
É algo falso soando como verdadeiro a Associação Brasileira do Alumínio afirmar que essa alta taxa brasileira de reciclagem de latas seja consciência ambiental e fruto do ‘‘trabalho constante que vem sendo feito’’, nesse sentido, e ainda que está havendo o ‘‘engajamento de diferentes camadas das sociedade’’ nesse processo. Tal engajamento não existe, pois aquele que bebe o conteúdo está tão longe da consciência ambiental, pois - repita-se - nem separa os resíduos sólidos dos orgânicos na hora de manipular o lixo doméstico. Nem o faz e nem ensina seus serviçais a fazerem.
Seria um grande motivo para festejarmos se os índices altos de reciclagem ocorressem com todos os resíduos, inclusive os orgânicos, mas, sobretudo estes, são depositados a céu aberto e o poder público resiste à idéia de beneficiá-los. Houvesse consciência ambiental, não assistiríamos aos plásticos boiando nos rios, lagos e mares, a papéis jogados no chão, a tantos entulhos depositados nos quintais e fundos de casa, só contribuindo para a proliferação de insetos e da imundície.
Seria gratificante para os brios nacionais podermos levantar a bandeira de campeões na preservação deste patrimônio da humanidade que, por bênção e graça, está no Brasil, que é a floresta amazônica; se pudéssemos, assim como as latas de alumínio, valorizar nossas terras férteis e não povoá-las de represas para hidrelétricas; se houvéssemos poupado Sete Quedas; se não desprezássemos tanto as terras do nordeste brasileiro a ponto de deixar que se esturriquem, por não extrairmos a água que está no subsolo; se pudéssemos resistir às queimadas feitas pela mão do homem; se fôssemos suficientemente ecológicos em nossa consciência para não envenenarmos as terras com tanto agrotóxico, e por aí afora.
É muito bom que, no Brasil, se faça em tão larga escala a reciclagem das latas de alumínio, porém o ideal seria que tal ocorresse não como tábua de salvação dos miseráveis catadores desses recipientes, transformados em ‘‘agentes ecológicos’’ apenas porque não têm perspectivas de outros ganhos. Esse troféu, pelas razões como é conquistado, não é algo que nos ufana.