Editorial - Vontade política
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 20 de novembro de 1998
Mais quatro Medidas Provisórias foram aprovadas pelo Congresso na quarta-feira. As duas mais polêmicas foram a que institui regras para o funcionamento dos regimes previdenciários dos servidores públicos e a que aumenta a alíquota da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). As outras duas já estão em vigor há muito tempo e a importância de sua aprovação resume-se à eliminação de obstáculos à promulgação da reforma da Previdência, uma vez que elas regulamentam artigos da constituição modificados pela emenda que está em fase final de tramitação na Câmara. Agora, ficam faltando apenas quatro medidas provisórias para limpar a pauta, o que deverá acontecer na próxima quarta-feira. A principal delas é a que aumenta de 11% para 20% a contribuição dos servidores federais que ganham mais de R$ 1,2 mil ao regime público de Previdência. É uma medida polêmica que será objeto de muitas negociações nos próximos dias. Só depois da aprovação dessa MP o governo deverá definir como fixará a contribuição dos inativos. Além das medidas provisórias, os líderes governistas devem se concentrar em duas outras tramitações: a da proposta de emenda constitucional (PEC) que prorroga a CPMF, iniciada quarta-feira no Senado, e a da proposta de Orçamento Geral da União para o ano que vem.
O que é importante notar é que, apesar dos candentes assuntos que explodiram nos últimos dias, envolvendo as mais destacadas autoridades da República, inclusive o presidente, o Congresso parece disposto a realizar sua parte no processo em que o país se empenha para superar esta nova crise que vem ameaçando a estabilidade e a própria vida nacional. Havia, até diante de precedentes, o temor de que após as eleições o Congresso faria pouco ou nada, deixando decisões e assuntos importantes para o próximo ano. A ressaca eleitoral, naturalmente, dificultaria as coisas e não seria de estranhar que, uma vez mais, o Legislativo ficasse devendo ao povo.
Os fatos, porém, se encarregaram de afastar os temores. Desde a retomada da atividade política, após o pleito de outubro, o Congresso dá a impressão de ter assumido com convicção seu papel, o que, vale insistir, é fundamental neste momento. E não há dúvida que ponderável parcela do sucesso nas negociações que produziram o acordo com o FMI se deveu à disposição evidenciada pelo Legislativo Federal ao aprovar importantes matérias, inclusive concluindo a reforma da Previdência e, basicamente, ao dar mostras de sensibilidade ante o momento sério que o País vive.
Usa-se, talvez em excesso, a expressão vontade política para definir a intenção real do governo em enfrentar os desafios que surgem a cada momento. Entretanto, é inegável o acerto da expressão e isto se evidencia neste surto de trabalho do Congresso que se mostra empenhado em resolver os problemas e facilitar as condições para que pelo menos uma parte das reformas estruturais, tão reclamadas, possa ser realizada. É certo que há dificuldades maiores que não dependem apenas de vontade pessoal ou coletiva. Entretanto, no que tange à ação pública, a priorização no enfrentamento de problemas é vital. E é possível dizer que a solução das dificuldades passa mesmo pela vontade expressa de quem tem o poder de decidir.
Neste momento, e no final de uma legislatura, o Congresso está demonstrando esta vontade política. Hoje, diante desta atividade legislativa, são mais fundadas as esperanças de que será possível reduzir muito os problemas que desafiam a administração e o povo brasileiros. Persistindo esta disposição dos políticos, o Brasil poderá encarar com mais esperança o desafio do ano que vai começar.