Editorial - Rodovias e cidadania
PUBLICAÇÃO
sábado, 22 de janeiro de 2000
Rodovias e cidadania
A positiva reação à proposta formulada pelo superintendente da Folha de Londrina/Folha do Paraná, ex-senador e ex-ministro José Eduardo Andrade Vieira, no sentido da criação de um Fórum dos Usuários das Rodovias, para defender os direitos dos que as utilizam, especialmente das estradas privatizadas, evidencia o desenvolvimento cada vez maior do senso de cidadania, que representa um dos mais valiosos fatores para a grande mudança que se observa no Brasil nos últimos anos. É um movimento cada vez mais compacto, um verdadeiro despertar da população, que durante boa parte da História viveu anestesiada, sem perceber sua força e, como consequência, sem assumir o próprio destino em suas mãos. Um processo estimulado pelos que, ao longo dos séculos, detinham o poder e, conforme se pode perceber pela própria forma como a História é narrada, faziam questão de deixar a população em um estado de tutela, transformando até mesmo as grandes conquistas em presentes dos que governavam, seja no período Colonial, durante o Império e, mesmo, na República.
O mais recente exemplo deste tipo de procedimento ocorreu durante o último governo do período totalitário, do general João Batista Figueiredo. No chamado processo de abertura gradual, o governo acabou por criar uma figura diferente, a chamada democracia permitida, com o que a própria redemocratização acabaria por ser considerada um presente do Poder e não uma conquista do povo. Foi, porém, naquela ocasião que os brasileiros começaram a mudar seu comportamento, o que se consubstanciou, então, na campanha pelas diretas para a presidência e que pode ser considerado o ponto de partida para o despertar da consciência cívica de um povo.
Com o programa de estabilização da economia (e é sabido que em clima de baderna econômica o processo político fica bastante comprometido) é que se consolidou, afinal, o grande despertar de consciência popular, que havia dado sinais de existência durante o Plano Cruzado, lançado pelo Governo Sarney. O fracasso daquele programa apenas adiou o germe de uma transformação que hoje é efetiva e marca a real evolução do povo brasileiro, cada vez mais consciente de seus direitos e deveres, e que vai abrangendo amplos setores da vida nacional.
O verdadeiro chamamento à cidadania contido na proposta do ex-senador José Eduardo Andrade Vieira representa, assim, um elemento a mais dentro de um quadro vital para a grande mudança que se processa no Brasil e que, como é natural, começa pela mentalidade popular. Trata-se ali de convocar o cidadão para tomar parte em um processo que lhe interessa (como, aliás, tudo o que envolve a vida pública é do interesse de todos), buscando-se encontrar soluções criativas e que atendam de fato aos interesses maiores da população. É um verdadeiro brado de alerta no sentido de fazer ver aos que governam que o mandato outorgado nas urnas não representa uma transferência de poder, uma procuração ilimitada, mas apenas confere ao eleito o privilégio de trabalhar pelo povo, para o povo e com o povo.
Em realidade, o sugerido Fórum dos Usuários de Rodovias deveria ter sido criado antes que se produzisse esta verdadeira confusão no que tange à privatização. Como, porém, melhor que reclamar sobre os erros do passado é buscar caminhos e modos para não reincidir naqueles equívocos, a sugestão do sr. José Eduardo Andrade Vieira representa a possibilidade de se iniciar a correção de rumos, no esforço por soluções compatíveis com o interesse de sua excelência, o cidadão brasileiro.