Editorial - Redução do recesso
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quarta-feira, 12 de janeiro de 2000
Redução do recesso
É possível que a atual convocação extraordinária do Congresso, que tanto custa aos contribuintes e, ao mesmo tempo, faz muito mal à já combalida imagem dos políticos, seja a última. Isto pode acontecer se vier a ser aceita a proposta que o líder do PT na Câmara, deputado José Genoino, deve apresentar logo no início dos trabalhos normais do Legislativo, em fevereiro. O parlamentar pretende coletar assinaturas de apoio à sua proposta a partir do dia 15 do próximo mês, sendo que a iniciativa estabelece que o recesso parlamentar ocorra apenas no período de 15 de dezembro a 15 de janeiro, período em que não poderia sequer ser convocado extraordinariamente. Atualmente, como se sabe, o Congresso tem três meses de férias oficiais: julho e outros dois no verão.
Tanto o presidente da Câmara Federal quanto o do Senado já anunciaram que apóiam a iniciativa. E diante da reação cada vez mais intensa em relação aos gastos com o Congresso, é muito provável que a mudança possa ocorrer, o que, sem dúvida, como destacam os mais lúcidos líderes do Congresso, representaria uma modificação natural diante das próprias necessidades da vida atual. Afinal, não se pode perder de vista o fato de que, atualmente, só estudantes, parlamentares e os membros do Judiciário têm tantas férias assim. O restante do Brasil que trabalha tem, na melhor das hipóteses, um mês de férias. Quando se coteja esta situação com a realidade de países mais desenvolvidos, vai se perceber que ainda há férias demais no Brasil. Entretanto, se pelo menos os que representam o povo também tivessem um período de trabalho similar ao da maioria dos brasileiros, isto já seria um avanço.
É oportuno lembrar que, de fato, o período de trabalho do Legislativo já foi menor. Na primeira Constituição brasileira, outorgada por D. Pedro I em 1824, logo após a Independência, definia-se o papel e as atribuições do Legislativo, estabelecendo-se que os membros daquele Poder trabalhariam seis meses por ano. Há algumas justificativas para isto. Na época, as comunicações eram muito difíceis e o transporte também. As viagens das Províncias (atuais Estados) para a Corte (capital do Império, no caso o Rio de Janeiro) eram demoradas, sem conforto, difíceis. Além disso, diante de um Governo como o que foi estabelecido pela referida Constituição, com o Imperador detendo uma gama enorme de poderes, o papel do Legislativo era menos importante.
Hoje, o quadro é muito diferente. O transporte aéreo é farto e fácil (e os parlamentares, aliás, tem muitas facilidades para suas viagens). Por outro lado, a própria evolução política, as mudanças notadamente as que foram introduzidas depois do fim do período totalitário e, em especial, na Carta de 88 implicam na necessidade de um trabalho mais dinâmico e ágil do Legislativo. A própria exigência legal relativa à convocação extraordinária, durante os recessos, sempre que haja a edição de alguma Medida Provisória, evidencia a imperiosa necessidade de profunda alteração no calendário de atividades do Poder.
Para o efetivo exercício de governo, o Brasil precisa que o Legislativo seja tão ágil quanto o Executivo. As imensas dificuldades para os ajustes reclamados pela política de estabilização deixam evidentes a importância e a necessidade da ação do Congresso, que precisa trabalhar tão intensamente quanto os brasileiros que representa. É certo que as convocações extraordinárias resolvem parte do problema. Mas o preço pago por isto é muito alto para o País e, igualmente, para a imagem do poder e dos políticos, que acabariam se beneficiando com a mudança que se projeta implementar.