Editorial - Mercado informal de trabalho
PUBLICAÇÃO
sábado, 29 de janeiro de 2000
Mercado informal de trabalho
Conforme dados apresentados pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Edward Amadeo, foram abertos, durante o ano passado, 418.351 novos postos de trabalho, a melhor taxa dos últimos 5 anos. O fato negativo da questão, conforme destacou o sr. Amadeo, é que 94,4% do total, o que significa 395.068 trabalhadores, é de empregos sem carteira assinada, o chamado mercado informal, conforme a Folha destacou em manchete de primeira página na edição de ontem. O secretário assinalou que, em seu entender, este fato diminui a importância da geração recorde de empregos e vai além, afirmando que as vagas preenchidas sem carteira de trabalho assinada deveriam ser consideradas ilegais e não, como se usa atualmente, informais.
Não há dúvida que, conforme os padrões da legislação, emprego sem carteira assinada é uma ilegalidade. Entretanto, antes de se insistir na questão legal ou até de se lançar uma eventual blitz contra os patrões que não registram empregados, o ideal seria que se abordasse a questão de modo bem amplo, começando com uma análise sobre as razões pelas quais patrões contratam empregados sem registro e por que o trabalhador aceita uma situação desta que, entre outras coisas, o deixa em posição marginal, sem acesso aos benefícios que a legislação garante aos que têm carteira regularmente inscrita.
Do lado do trabalhador, é fácil perceber o motivo da aceitação do emprego sem registro. Quando o cidadão está sem emprego, uma situação que está sendo vivenciada por um número muito elevado de pessoas no Brasil, apesar deste recorde observado em 99 mesmo porque a situação, nos anos precedentes, foi terrível , não existe um campo muito vasto para discussão. O desempregado quer e precisa do trabalho. Se lhe é oferecida uma colocação sem registro, ele não titubeia. Assim como alguns ministros, no tempo do arrocho salarial promovido pelo governo, diziam que era melhor um emprego com salário baixo do que a falta de trabalho, também para o desempregado a colocação, e o pagamento, mesmo sem garantias legais, é melhor do que a falta de emprego.
No que tange aos empregadores, a questão é mais complicada. A existência de empregados sem carteira assinada, conforme assinalou o sr. Amadeo, é ilegal. Isto significa que o empregador que é apanhado com empregados sem registro pela fiscalização pode sofrer sérias consequências. Adicionalmente, existe também o perigo de o empregado ir à Justiça reclamar os direitos pelo não-registro. Todavia, o aspecto mais importante, e que acaba justificando o risco de ter empregados sem registro, é o do custo. O custo do trabalhador continua a ser o grande peso para o empresário e, por extensão, para o trabalhador.
Este, na verdade, deveria ser o principal enfoque de qualquer discussão a respeito do chamado mercado informal de trabalho. Há décadas se comenta o assunto. Durante o período totalitário, o então ministro do Trabalho, Jarbas Passarinho, lançou a idéia de uma revisão na legislação trabalhista, visando reduzir o peso dos chamados encargos que oneram as folhas de pagamento e que, naturalmente, incidem sobre os empregos com carteira assinada. O assunto não evoluiu. Atualmente, houve propostas para discussão de modificações que tornassem menos onerosa a criação de empregos. Uma vez mais, o assunto foi deixado de lado. O resultado desta falta de vontade de discutir o básico do problema é este: aumenta o mercado informal. Houvesse coragem para se enfrentar a questão, o benefício poderia ser total. Os empregados teriam carteira assinada, o INSS aumentaria sua receita e o quadro formal se modificaria. Mas a possibilidade de se enfrentar o assunto parece muito distante, até porque quem deveria abordá-lo não era um funcionário do Ministério da Fazenda e sim alguém ligado ao Ministério do Trabalho.