Editorial - A imagem do Congresso
PUBLICAÇÃO
terça-feira, 18 de janeiro de 2000
A imagem do Congresso
Comentando o atraso na votação da proposta de emenda constitucional que prorroga a possibilidade de Desvinculação de Receitas da União (DRU) em razão da falta de quórum para a abertura da sessão da Câmara, na última sexta-feira, o presidente do Senado, Antonio Carlos Magalhães, disse que se trata de uma ocorrência que prejudica a imagem do Congresso perante a opinião pública. Entretanto, o senador baiano ponderou que o prejuízo decorre mais da forma como os meios de comunicação estão tratando a convocação extraordinária do Congresso do que do próprio atraso, provocado, segundo ele, pelo cochilo dos líderes governistas. Para Antonio Carlos Magalhães, as críticas da imprensa à convocação extraordinária do Congresso prejudicam a credibilidade do Poder.
Trata-se do tipo de comentário que mostra a visão distorcida que alguns políticos, mesmo os de mais elevado escalão, que é o caso do presidente do Senado, têm da relação com o povo e como pretendem culpar a imprensa por seus próprios pecados. Na opinião de Magalhães, a falha da liderança governista na Câmara Federal não é importante. O que o preocupa é o modo como os jornais e a televisão, principalmente, colocam em evidência as falhas do Legislativo, enquanto insistem em destacar o quanto custa para os contribuintes a convocação. Assim, não são as falhas, as omissões, a falta de responsabilidade dos parlamentares a questão mais relevante. O que preocupa o presidente do Senado é o destaque que a imprensa dá à situação.
A declaração do presidente do Senado reflete uma postura que, infelizmente, é comum entre os políticos brasileiros. Quando se mostra preocupado com a atuação da imprensa, desconsiderando o fato em si, deixa bem clara a falta de responsabilidade, principalmente de alguns políticos governistas. Para eles, o que importa é a reação da imprensa e não seu eventual descaso com assuntos que deveriam ter relevância. Esta tão discutida convocação extraordinária do Congresso tem como objetivo principal aprovar uma série de medidas consideradas de vital importância para o governo. Qualquer cochilo dos parlamentares governistas representa um descaso para com o povo, com o País.
Fica evidente a ótica distorcida de políticos que conquistam um mandato e dão a impressão de que se consideram diferentes do povo que os elegeu. Formam um tipo de casta, com privilégios que preferem esconder, com vantagens que a população não tem. A grande preocupação do veterano político baiano e de todos os outros membros do Congresso não deveria ser com a imprensa mas com a responsabilidade real de cada um deles diante dos eleitores e, por extensão, do País. Os cochilos, que prejudicam a imagem do Congresso, custam caro aos brasileiros.
Quanto à imprensa, apenas cumpre seu dever, o que muitos políticos não fazem. Na verdade, os meios de comunicação têm sido os grandes responsáveis pela revelação de abusos, fraudes, crimes inclusive, cometidos por aqueles que deveriam representar adequadamente o povo que os elegeu. A imprensa não denigre a imagem do Congresso, apenas revela à população aquilo que seus representantes fazem, ou deixam de fazer. É um espelho que, infelizmente, não agrada a quem quer se colocar acima do povo que, no fim, é quem paga todas as contas e abusos.