A dúvida como ponto de partida para se encontrar qualquer resposta, caso ela exista, foi um dos legados do filósofo René Descartes (1596 – 1650). Esta é a fonte da pedagogia cartesiana, que orienta percorrermos os caminhos da razão, colocando toda e qualquer existência em dúvida, porquanto se alguém duvida há pensamento desta imprecisão; logo “Se penso, logo existo” - Descartes na sua mais conhecida frase “Cogito, ergo sum”.

É verdade, e bastante apropriado, afirmar que no mundo atual, sobretudo o criado dentro do espaço virtual - internet -, o poder que o ser humano tem da dúvida deixou de existir para dar espaço a um local crítico, cheio de razões fixas e argumentos sólidos. Zygmunt Bauman (1925 – 2017), filósofo polonês que passou a vida investigando os laços do ser humano e a globalização, teve a sagaz conclusão de que “somos atores do grande teatro do mundo, mas quando os refletores estão todos em nós a agnosia ideativa nos atinge como um soco”.

Esta falta de discernimento citada por Bauman é facilmente comprovada, por exemplo, na guerra ideológica entre conservadores, ditos à Direita, os socialistas, tidos à Esquerda e os liberais, lidos acima. Novos filiados nestas teses cometem o erro de defender seus lados, sem pelo menos conhecer o outro. Isto porque ao estudar as ciências separadas e sem nódoas amargas, o estudante descobre que uma nasce e sobrevive da outra, e todas precisam existir.

Dentre o rol grande de símiles, há duas mais fortes, a primeira por dedução, a segunda, intuição. Uma, sem o iluminismo não haveria revolução industrial e sem a substituição da manufatura pela maquinofatura, Karl Marx invés de nascer em chão de fábrica seria um camponês ou soldado do Rei da Prússia. Outra, sem expoentes do socialismo e anarquismo, Marx e Proudhon, talvez, hoje estaríamos trabalhando em troca da alimentação no final do dia.

Com viés de alertar os estudantes desses anacronismos, as melhores escolas de filosofia antes de iniciar o estudo sobre determinado tema fazem panorama completo sobre o momento histórico, após ambientalizar passa-se ao estudo do personagem. É somente assim que encaixamos os conceitos com as circunstâncias.

Em meados de 1.848 pessoas - homens, mulheres e crianças - trabalhavam quase diuturnamente na maioria das vezes ao troco da alimentação. Foi neste contexto que surgiu a ideia revolucionária do Socialismo ou Comunismo. Graças ao esforço destes e outros grupos neste período da história é que temos hoje melhores condições de trabalho.

Como se vê, contra argumentar Marx nas circunstâncias acima alinhavadas com a realidade de 2021 é fácil; contudo a prosa fica outra para refutar o sociólogo marxista Giovanni Arrighi (1937 – 2009), que por exemplo, acertou precisamente no diagnóstico da crise que a Europa passa hoje. Para este pensador, quando o capital for mais direcionado para os investimentos financeiros e menos nos meios de produção haverá colapso do sistema.

Estamos acompanhando as notícias que a Europa, continente rico e desenvolvido, passa por problemas de desabastecimento de produtos e começa a ter escassez de alguns inclusive de alimentos. Por exemplo, o desinteresse de investimento, por frotas ou caminhoneiros autônomos, no transporte de combustível fez faltar o produto nos postos e sobrar nas refinarias. A deusa do Liberalismo, a lei da oferta e demanda, começa a falhar no berço da Dama de Ferro.

Há uma frase histórica que possui significado de acordo com o momento que é utilizada: General romano Pompeu, em 70 a.C, para encorajar soldados; tempo depois, o poeta Fernando Pessoa para ilustrar a grandeza de Portugal nas navegações. Emprestando o começo do eternizado jargão de Ricardo Spinoza; Hoje, mais do que ontem, “Navegar é preciso, viver não é preciso”.