Gosto de decifrar mapas. São representações. Tem intenções. Apresentam silêncios e distorções. Aproximam e afastam. Expressam ideais.

A Planta Inicial de Londrina (Razgulaeff, 1932) foi desenhada com o Norte Sul invertido. A seta no canto superior esquerdo da prancha aponta para cima. Indica “Sul Verdadeiro”. Razgulaeff projetou Londrina tendo como base a Planta Geral da Companhia Ferroviária São Paulo Paraná CFSPP (Mcdonald & Gibbs, 1928-32) e o silenciado Plano da Estrada de Ferro Central do Paraná EFCP ajustada para CTNP (1925). Londrina nasce no cruzamento de duas ferrovias (Yamaki, 2017).

Na CFSPP, Macdonald projetou com o Norte para baixo, provavelmente por questões práticas de desenho. Isso permitia estender e ajustar. Controlar a dimensão final da prancha. Acompanhar o avanço da frente de colonização para oeste. Na Planta Geral estavam identificados um “Alto” atravessado por uma picada, o traçado da ferrovia e a localização de estações. O ramal 2 da EFCP ajustada para a CTNP, por sua vez, definiu o eixo norte e sul da malha xadrez.

Sul para cima e Norte para baixo. A sobreposição da Planta de Londrina (1932) com a Planta Geral CFSPP (1928-32) e Plano EFCP ajustado (1925), permite comprovar a afirmação de sincronia e aproximações.

Dentre as plantas publicadas nas primeiras décadas de Londrina, gosto do “Mapa de Londrina (1951), organizado e editado especialmente para o PARANA NO BOLSO”. Foi impresso com giro de 90°. O lado Oeste para o alto da página. Ferrovia e Estrada de Autos cruzam de baixo para cima. Assim, quando chegamos na cidade, vemos de frente o “Alto” com a Matriz no topo. A estação ferroviária na parte baixa. Uma Londrina idealizada.

Um viajante, seguindo o Mapa (1951), vem da direção de Curitiba, Piraí e Assaí pela Estrada de Autos. Acessa direto a Avenida Paraná, tendo como foco a Matriz de duas torres. De trem, vindo de Ourinhos, havia uma última grande curva antes da chegada na baixa da Estação Londrina. Do trem em movimento, tinha uma visão do Estádio de Futebol. Logo depois os grandes barracões com nove chaminés fumegantes da Cerâmica Mortari.

Hoje, quem vem da zona leste, passa pela Avenida Leste Oeste, antigo caminho de trem. É possível visualizar à direita o que restou dos barracões Mortari e parte da última chaminé. Ver em movimento da janela do auto, na velocidade do trem.

De repente, essa é a vista do conjunto Mortari que temos que analisar e preservar. A chaminé visível entre barracões e becos. Não a visão simples do monolito remanescente. Mas, a chaminé fugidia com conjunto de barracões envolventes.

Retomando o Mapa de 1951. Após a estação Londrina, a legenda indica barracões nas imediações da rua Paraíba. Atualmente, alguns estão em risco iminente de demolição. Quem viajava de trem tinha a visão desses barracões antes e depois da estação. Símbolos da cidade que crescia rapidamente.

Preservar o patrimônio histórico de uma cidade exige estratégias. Os conjuntos de edificações representativas de ciclos econômicos passados deveriam ser preservados. O caminho dos trilhos, o conjunto de barracões e chaminés, componentes de vistas e panoramas. Testemunho do status de *primeira cidade projetada pela CTNP ao longo dos trilhos da CFSPP.

Decifrar mapas. Ler a cidade. Ler o tempo.

Humberto Yamaki, coordenador do Laboratório de Paisagem da UEL(Universidade Estadual de Londrina)