Morre um papa, elege-se outro! Parecem palavras frias com certa aspereza, mas é fato. Roma já sedia o encontro extraordinário dos cardeais, eleitores de um novo Sumo Pontífice. Esse termo é usado desde o século III e poderia significar o “mais alto sacerdote”, o mediador entre Deus e os homens, inspirado nas funções do próprio Cristo, segundo a carta aos Hebreus. Contudo, prefere-se a palavra “papa”, etimologicamente um termo que se originou diretamente a partir do latim pappa, que pode ser traduzido como uma forma carinhosa de “papai” ou “pai”. O último papa, Francisco, era argentino, o primeiro das Américas a ser eleito para esse cargo.

Os cardeais são nomeados pelo papa em exercício e aptos a votarem até aos oitenta anos. Porém, elegíveis mesmo com idade superior. O cardinalato é um título, não uma ordem! Geralmente são bispos, mas podem ser também leigos, diáconos ou padres. São, em última análise, responsáveis pela assessoria direta ao papa na solução das questões organizativas e econômicas da Santa Sé, na coordenação dos diversos Dicastérios (uma espécie de ministério do Vaticano) que compõem o serviço da Santa Sé. Os critérios da sua escolha são de exclusiva responsabilidade do papa e Francisco mais uma vez inovou, ao “ir buscar cardeais no fim do mundo”! De fato, os nomeou em pequenos países periféricos e bispos de pequenas e irrisórias dioceses. Assim, hoje temos um corpo cardinalício mais eclético do que nunca. O falecido papa nomeou 108 dos 135 cardeais.

Será uma eleição extremamente tensa e delicada por vários fatores. O primeiro deles é óbvio! Substituir Francisco é uma tarefa hercúlea! Pelo seu carisma, principalmente, que se manifestou numa personalidade sui generis, amado e respeitado por crentes e ateus do mundo todo.

Francisco suava evangelho em gestos simples e repletos de significado. Como o Homem de Nazaré. Não será fácil encontrar alguém que tome esse trilho. Por outro lado, há uma tensão enorme entre conservadores e progressistas, que reflete a polarização encontrada na sociedade em geral.

Parece-me que a melhor solução seria eleger um moderado, que sem reverter nenhuma das reformas iniciadas por Bergoglio, estabelecesse pontes entre os dois grupos. Historicamente não seria uma opção inédita! A Igreja já lançou mão de mandatos "de transição” para depois eleger papas mais longevos.

E, finalmente, uma nuvem que paira sobre Roma e que pode pesar na eleição diz respeito à influência das mídias sociais, dos algoritmos, das fake news. Será o primeiro conclave ocorrendo sob esta nova cultura que vem das big techs e que tem interferido nas democracias mundo afora. Os cardeais estarão fechados, mas não alheios ao inevitável contágio com este “novo mundo”. Líderes mundiais procurarão interferir de vários modos, usando esses novos recursos. Logo saberemos o quanto sucesso tiveram!

Francisco foi papa num período de mudança de época que talvez só encontre paralelo na passagem da Idade Média para a Idade Moderna, ou quem sabe em períodos como a Revolução Francesa! Somou-se a isso, o surgimento dos fenômenos climáticos extremos que revelam as preocupantes mudanças no clima.

Como se fosse pouco, o mundo está mais inseguro do que nunca! Flertamos com conflitos “totais” devastadores para o ser humano. Com a sua postura profética, foi intrépido defensor dos direitos dos mais fracos, detonando preconceitos e discriminações. Foi homem reformador e muitas vezes incompreendido pelos de “dentro”.

A Igreja Católica sabe onde quer chegar desde o Concílio Vaticano II ocorrido nos anos sessenta. Mas o peso de uma história repleta de paradoxos, por vezes a impede de avançar. Somos um enorme trem que necessita de uma curva bem ampla para não descarrilar! Existem os “apressados” que não toleram delongas e os “retrógados” que olham com nostalgia para tradições vencidas pelo tempo e que colocariam a Igreja nas prateleiras de um museu! Saber buscar o equilíbrio, na fidelidade ao seu Fundador, terá que ser a sabedoria do futuro ocupante da cadeira de S. Pedro!

Padre Manuel Joaquim R. dos Santos, Arquidiocese de Londrina

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