Desde que o primeiro console foi lançado, em 1972, jogar videogame sempre foi um hobby muito popular. Contudo, com o passar do tempo, tornou-se ainda mais, de modo especial nos últimos dez anos, graças ao avanço e desenvolvimento da indústria dos eletrônicos e a introdução dos smartphones no mercado, tornando a jogatina possível a qualquer hora e lugar. Algo impensável décadas atrás. De um lado, os gráficos simples de blocos mais ou menos coloridos com sons sintetizados de maneira artificial deram lugar aos personagens e cenários tridimensionais com uma trilha sonora orquestrada de modo real e instrumental.

Com essa evolução, vieram também novas maneiras de tornar um jogo eletrônico rentável. Antes, o lucro das empresas vinha apenas através da venda das fitas e dos jogos. Agora, a indústria encontrou diferentes formas de monetizar seus jogos. Dentre elas, a mais popular no momento é a de fornecê-lo gratuitamente, porém, vender itens variados dentro do próprio jogo, agregando ao enredo ou personagem. Um exemplo disso são os cosméticos de personalização, numa loja integrada. Dentro desse modelo, existem as “loot boxes”, que são caixas que entregam itens aleatórios ao serem abertas, podendo ser adquiridas com dinheiro real.

Entretanto, o uso desse tipo de dinâmica está em xeque e tem sido banido em alguns países, como a Bélgica. Além disso, outras nações também discutem até onde as “loot boxes” são consideradas legais, sendo elas semelhantes aos jogos de azar, como caça-níqueis. Isso porque foi justamente nessa época que explodiram os casos de crianças e jovens que, enquanto jogam, gastam grandes quantias em dinheiro nessas caixinhas. Tudo, claro, desenfreadamente e nos cartões e contas dos pais e responsáveis.

Um casal teve as economias totalmente esvaziadas pelos filhos por causa dessa dinâmica. Primeiro, o pai comprou um “pacote de jogadores especiais”, por oito libras, no jogo FIFA, no qual não se faz ideia de quais atletas virão no item até que o combo seja aberto. As crianças, que viram o responsável fazendo a transação e aprenderam o processo, continuaram comprando, sozinhos, mais caixas especiais. No final das contas, o gasto dos pequenos foi de 550 libras, algo em torno dos R$ 3 mil.

Em maio de 2023, a gigante dos games Nintendo foi processada pelo responsável de um jovem jogador de Mario Kart Tour, que gastou mais de 170 dólares em itens com o seu cartão de crédito. A ação judicial alega que as “loot boxes” do jogo “capitalizaram e encorajaram comportamentos viciantes semelhantes ao jogo” e exige o reembolso de todos os menores que as compraram nos Estados Unidos.

A grande questão do debate em torno das “loot boxes” não é a existência delas, mas, justamente, essa falta de controle e o estímulo à compra, na maioria das vezes a um público infanto-juvenil. O problema é tão profundo que vários países estão tentando lidar com a questão, de maneiras diferentes.

No Brasil, existe a previsão do direito de arrependimento de uma compra em até sete dias, nos casos em que a compra foi feita pela internet, conforme o Código de Defesa do Consumidor. No caso das “loot boxes”, por exemplo, o jogador é constantemente instigado a avançar as fases e seguir o jogo adquirindo mais caixas, de forma a tentar a sorte para ganhar melhores e mais valiosos itens. É evidente que as compras são feitas por impulso, estimuladas pelo elemento viciante de abrir uma caixa nova. Então, é imprescindível que as empresas responsáveis disponibilizem ao consumidor o direito de arrependimento destas compras, dentro do prazo legal. Ainda não é o ideal. Talvez seja necessária uma regulamentação melhor. Mesmo assim, é o primeiro passo dentro de uma relação perigosa e desleal de consumo.

Leonardo Petrucci é graduando em Direito na Universidade Estadual de Londrina e estagiário do Escritório Batistute Advogados