Quando pensamos na escola, dificilmente alguém deixa de imaginar que, durante um dia escolar, um aluno vai se deparar com um texto escrito ou com conhecimentos que dialogam diretamente com algum livro: a gramática, os textos historiográficos, as grandes obras da literatura, os elementos matemáticos de Euclides. Em geral, espera-se que o trabalho escolar dê bases, fortaleça e desenvolva a leitura dos alunos. Mas como a escola pode promover nos alunos o hábito de leitura?

Começando dos aspectos mais práticos em direção aos mais teóricos, o primeiro movimento que uma escola deve fazer para alcançar esse objetivo é zelar por uma equipe pedagógica que seja leitora e que, portanto, promova uma cultura de leitura que é vivida pelos professores. São muitos os documentos que falam da importância que tem, na vida dos alunos, o professor que os introduz e os orienta pela cultura escrita, de forma que ter uma equipe docente que fala do livro porque tem o hábito de lê-lo é essencial.

Outro aspecto prático, derivado desse primeiro, é a escola ter livros em seus espaços, e demonstrar valorizá-los. Isso tem a ver tanto com a existência de bibliotecas para cada segmento escolar, com uma equipe de bibliotecários zelosos da organização do acervo, quanto com a promoção de eventos do livro, como feiras com editores, para citar um exemplo.

Seguindo para os aspectos mais teóricos, um livro não contém, como certa vez escreveu Carlos Drummond de Andrade (conferir o poema “A José Olympio”, no livro Viola de bolso), apenas palavras, mas a confissão de uma alma; o pensamento de uma pessoa ou o coração dela. Assim, promover uma cultura de leitura entre os alunos é, primeiramente, promover uma cultura de pensamento e conversa. Isso significa que um adolescente leitor começou a ser formado nas rodas de conversa que a equipe da Educação Infantil e a do Ensino Fundamental promovem; começou a ser formado nas aulas de “contação” de histórias e discussões sobre elas. Essa cultura, ademais, é fortalecida por um dia a dia na escola em que todo corpo diretivo promove a resolução dos problemas e conflitos por meio da narrativa dos acontecimentos e avaliação das perspectivas narradas.

Livros que tratam da formação do leitor frisam a importância, cada vez mais crescente, sobretudo entre os psicólogos cognitivos, da narrativa no seu sentido mais amplo: uma capacidade de estruturação de pensamento que compreende as ações humanas, suas interações e consequências no tempo e no espaço.

Pedir para a criança dizer o que fez no recreio, no fim de semana ou nas férias é basilar para o desenvolvimento dessa estrutura narrativa. Narrando, nós conseguimos refletir sobre nossas ações e suas consequências, isso no sentido mais estrito (o que fazemos e com quais motivações, almejando quais consequências), como no sentido mais amplo (o que como seres humanos fazemos, ou fizemos, com quais motivações e consequências).

Nesse sentido, a partir de uma perspectiva mais teórica, pesquisas que tratam sobre os jovens e a leitura ressaltam a importância de a escola desenvolver um trabalho com a narrativa tanto no âmbito da narração dos fatos que aconteceram (domínio da realidade) ou de circunstâncias que poderiam ter acontecido (domínio da ficção). Quanto mais o estudante percebe como a narrativa lhe permite transitar do acontecido para o que poderia acontecer, e quanto mais ele percebe como esse universo hipotético pode lhe ajudar a julgar suas ações no universo real, mais a leitura, de textos literários e não literários, ganha significado em sua vida e se expande.

Noemih Sá Oliveira é professora de Produção de texto no Colégio Presbiteriano Mackenzie - Tamboré

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