O ex-presidente Jair Bolsonaro esteve na avenida Paulista, no domingo, 25 de fevereiro, para um ato convocado por ele após várias operações da Polícia Federal (PF) objetivando investigações que abarcam a cúpula do bolsonarismo.

Obviamente, nas redes sociais, há várias narrativas quando se trata de ocupar – física e simbolicamente – o espaço da Paulista. Os bolsonaristas consideram a manifestação gigante, e os opositores afirmam que ela “flopou”. Existem os que gostam de contrariar a realidade dos fatos, a verdade factual; contudo, aqui, cabe uma análise desapaixonada e objetiva: a manifestação foi, sim, superlativa. E não seria diferente. As pesquisas já demonstraram, alhures, que após um ano da eleição de 2022, os eleitores repetiriam seus votos em Lula e em Bolsonaro.

No final de 2023, foi lançado o livro “Biografia do abismo: como a polarização divide famílias, desafia empresas e compromete o futuro do Brasil”, de Felipe Nunes e Thomas Traumann. Na referida obra, os autores afirmam que já não há uma polarização, mas, sim, uma “calcificação” em duas grandes posições políticas e valorativas: o lulopetismo e o bolsonarismo.

Tendo isso em vista, nada de espantoso a Paulista tomada de bolsonaristas e, em um país fraturado politicamente, se Lula fizesse chamamento idêntico, as ruas também seriam tomadas por seus apoiadores. Bolsonaro e Lula são líderes carismáticos. O bolsonarismo e lulismo têm força política e não reconhecer isso é negar a realidade.

Há aqueles que fazem uma leitura afirmando ser irônico que Bolsonaro tenha convocado um ato em defesa do Estado Democrático de Direito, especialmente, porque pesa sobre o ex-presidente e seu núcleo de poder investigações acerca de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

A Constituição brasileira garante a todos – de esquerda, de centro e de direita – o direito à manifestação pacífica, sem armas e previamente comunicada às autoridades. E, no caso em tela, as ruas ganham densidade no âmbito de uma visão de mundo que congrega os bolsonaristas, com “conservadores cristãos”, liberais, ferrenhos antipetistas, representantes do agronegócio e até os dispostos às rupturas institucionais (Nunes e Traumann esmiuçam os dados em seu livro).

O ato na Paulista é, sem dúvida, demonstração de força, de inegável capacidade de mobilização no âmbito político e social, nas redes e nas ruas. Em que pese Bolsonaro ser o primeiro presidente a não ser reeleito após a aprovação do estatuto da reeleição e de estar inelegível, o bolsonarismo – com ou sem Bolsonaro – veio para ficar. Aqui, todavia, caberia uma pergunta: e agora? Como ficam as investigações após tamanha demonstração de força? Tendo a crer que a manifestação em nada mudará o curso das investigações. Há, no caso, duas lógicas e tempos distintos: a lógica e o tempo da política e a lógica e o tempo da justiça. Dessa forma, a lógica da força política não terá força para intervir no âmbito jurídico.

Bolsonaro, em outras vezes, até mesmo na Paulista, na condição de presidente, Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, demonstrou musculatura política e fez ameaças às instituições com foco no Supremo Tribunal Federal (STF). E, mesmo assim, foi derrotado na eleição, está inelegível e acuado pelas investigações da PF e inquéritos no STF.

Os atos, até onde se sabe, transcorreram sem violência e sem cartazes atacando o STF, urnas eletrônicas, ministros ou outros atores políticos de forma mais explícita. Um jornalista mandou mensagem: “Professor, foi só o Bolsonaro pedir que não houve cartazes e ataques durante o ato. E se ele tivesse feito isso quando foi derrotado, pedindo para os apoiadores deixarem os acampamentos e reconhecido a derrota?”. Sempre temos um: “E se ...”.

Rodrigo Augusto Prando, professor e pesquisador do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em Ciências Sociais, mestre e doutor em Sociologia.

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